Luciana Souza de Oliveira - Universidade do Planalto
Catarinense - Uniplac
Ana Maria Pargana Bröring - orientadora
Língua e cultura são características de qualquer
ser humano, podendo ser fatores comuns de um determinado grupo. Neste
sentido, tanto a língua quanto a cultura diferenciam-se e transformam-se
de acordo com a comunidade que as compartilha e com a época em
que são vividas e utilizadas, pois todos os seres humanos precisam
comunicar-se através de uma língua e comportar-se de acordo
com alguma cultura, adaptando-as para suprir suas necessidades comunicativas
e comportamentais.
O ensino da Língua Inglesa, devido às diversas transformações
globais das últimas décadas, vem sofrendo inúmeras
alterações, tentando adequar-se às mudanças
que elevaram esta língua à posição de Língua
Internacional.
Segundo Kachru (1989, apud Mckay, 2002, p. 6) a expansão da língua
inglesa pode ser analisada através de um modelo que engloba três
círculos, de acordo com os diferentes países onde é
falada e com a função que neles exerce: i) “The Inner
Circle” o qual corresponde ao círculo central que compreende
os países falantes nativos da língua; ii) “The Outer
Circle”, que engloba os países que utilizam o inglês
como segunda língua; e iii) “The Expanding Circle”,
que compreende os países que estudam o inglês como língua
estrangeira. A autora, Deise Mesquita (1999, p, 79) referiu-se à
expansão da língua inglesa como um processo de desnaturalização,
tendo a tornado uma língua universal utilizada para a comunicação,
a realização de negócios, e para explicar os usos
e costumes de aproximadamente dois bilhões de pessoas.
O ensino da Língua Inglesa teve, conseqüentemente, que se
adaptar as necessidades atuais, preocupando-se com o tipo de inglês
que os seus aprendizes precisam ou querem adquirir. No entanto, o ensino
do Inglês ainda possui desajustes que impossibilitam a aproximação
do aprendiz com o ambiente de comunicação em que a língua
está inserida. Por esta razão, este artigo tem como objetivo
discutir a relação entre língua e cultura, enfatizando
a importância da ação paralela entre elas para o ensino
de línguas, realçando o papel da cultura no aprendizado
de diversas variedades de inglês e salientando a importância
do desenvolvimento da competência comunicativa e intercultural para
aprendizes de segunda língua ou língua estrangeira.
Ao longo do último século muitas definições
foram dadas ao termo cultura e, ainda hoje surgem novas conceituações.
Isto acontece porque, dependendo da época, do foco que é
dado à sua análise, do nível de conhecimento e estudo
de quem a observa, da dimensão do mundo deste indivíduo
e diversos outros fatores que diferenciam esta conceituação,
surge um ponto de vista diferente em relação a este mesmo
termo. Uma das primeiras definições formal e explícita
do conceito que se tem conhecimento é a do antropólogo inglês
Edward Burnett Tylor, em seu livro Primitive Culture (1871, apud Cola
da Web, p. 1), onde é referido que “a cultura é o
complexo no qual estão incluídos conhecimentos, crenças,
artes, moral, leis, costumes e quaisquer outras aptidões e hábitos
adquiridos pelo homem como membro da sociedade”.
Seguindo esta primeira definição, muitas outras foram sendo
incorporadas, entendendo cultura como parte do ambiente feita pelo homem,
herança cultural, conjunto de tradição social. Durante
muito tempo, segundo Rivers (1968), o termo cultura foi entendido como
uma capacitação do indivíduo para alcançar
conhecimentos mais elevados, como forma de garantir sua permanência
num nível de conhecimento intelectual superior e de integrar um
grupo de indivíduos elitizados. Anteriormente, estudava-se língua
para ter acesso à cultura e à literatura. No caso específico
da Língua Inglesa, o seu conhecimento era sinal de status e prestígio.
Kramsch (apud Delgado, 2004, p. 233) salientou que durante os anos trinta
e quarenta houve a separação acadêmica dos ensinos
de cultura, literatura e língua, permitindo que cada uma avançasse
em suas práticas pedagógicas, uma vez que esta separação
gerou a independência e a autonomia de cada área.
Na década de sessenta, em função das transformações
mundiais que ocorreram, e devido às diversas incorporações
adquiridas, o termo cultura passou a abranger uma amplitude de definições
muito maior que aquelas que lhe cabiam anteriormente. O método
audio-lingual de ensino de línguas estrangeiras enfatizou a importância
da inclusão de elementos culturais no ensino para o desenvolvimento
da língua em situações reais (Steele, 1989, apud
Lessard-Clouston, 1997). Porém, é com o método comunicativo,
que o ensino da cultura torna-se essencial, pois foi através dele
que noções de cultura e de funções sociais
da linguagem passaram a ser vistas como parte integrante da competência
lingüística de qualquer falante.
Em 1960, o sociolinguísta, Hymes (1960, apud Cook, 2003) introduziu
o conceito de “competência comunicativa”. Segundo ele,
a competência lingüística não seria suficiente
para que um indivíduo pudesse se comunicar, uma vez que a habilidade
de adequar a comunicação, de acordo com o contexto, vai
além de conhecer as regras de uma língua.
Hymes salientou que qualquer indivíduo necessitaria possuir quatro
tipos de habilidades para se tornar comunicativamente competente em uma
determinada comunidade: “possibility, feasibility, appropriateness
e attestedness” (1960, apud Cook, 2003, p. 42). A primeira habilidade,
a possibilidade, corresponde à competência lingüística,
que elabora as frases de acordo com os padrões gramaticais. A viabilidade
identifica se determinada frase, mesmo estando gramaticalmente correta,
é viável para a assimilação de seu conteúdo.
O terceiro componente, a aceitabilidade, define se um determinado comportamento
ou frase está apropriado a um determinado contexto. A última
habilidade trata-se da adequação ou certificação,
que relaciona as outras três habilidades tornando uma combinação
de palavras corretas gramaticalmente, viáveis para a comunicação
e apropriadas ao contexto.
Savignon (1983) estabeleceu a distinção entre competência
comunicativa e competência gramatical. A comunicação
foi descrita como um conceito dinâmico que se refere a um contexto
específico e depende da negociação e cooperação
dos participantes envolvidos na interação:
dynamic rather than ...static..It depends on the negotiation
of meaning between two or more persons... It is context specific. Communication
takes place in an infinite variety of situations, and success in a particular
role depends on one’s understanding of the context and on prior
experience of a similar kind.
(Savignon, 1983, apud Bachman, 1990, p.83)
Esta comunicação acontece nas mais variadas
situações e o seu sucesso depende do entendimento do contexto
e de uma experiência anterior de um tipo similar à vivenciada.
Nesta perspectiva, a competência comunicativa passa a ser vista
como um conceito dinâmico que necessita de negociação.
Ela se refere a um contexto específico que depende da interação
dos participantes.
Canale e Swain (1980, apud Kang Shumin, 2002) introduziram um modelo de
competência comunicativa que inclui uma competência gramatical,
uma competência de discurso, uma competência sociolingüística
e uma competência estratégica, englobando, assim, a utilização
do sistema lingüístico e de aspetos funcionais da comunicação.
A competência gramatical inclui o conhecimento lexical, sintático
e semântico. Esta competência torna os falantes aptos a usar
e entender as estruturas da língua inglesa de forma correta, contribuindo,
para a sua fluência. Por exemplo, os aprendizes de inglês
precisam aprender as diferentes referências de tempo dos grupos
de palavras como: I live, I am living, I was living, I lived, I have been
living, I had lived, e estar apto a fazer uso da referência de tempo
apropriada, tanto quando está falando ou quando está escrevendo.
(adaptado, SIL International, 1999).
O segundo componente, a competência do discurso preocupa-se com
as relações entre sentenças, aplicando regras de
coesão e coerência, dando suporte à comunicação
de forma significante. Os falantes devem possuir uma grande opção
de estruturas e formas de discurso para expressar claramente suas idéias
(furthermore, not only, but also, also), contrastar idéias (but,
however, nevertheless), estabelecer relações de tempo (as,
while, then, soon, so, before, after), indicar a causa (for, because,
since, as), apontar similaridades (like, as, in the same way, as if) e
tirar conclusões (thus, therefore).
A competência sociolingüística corresponde à
habilidade de interpretar o significado social da escolha de determinada
variedade lingüística para saber utilizar a forma mais apropriada
dependendo da situação comunicativa. Entender o lado sociolingüístico
da língua ajuda os aprendizes a conhecer as regras para realizar
atos de comunicação apropriados, fazer os comentários
adequados, saber fazer perguntas durante a interação e até
saber como responder de forma não-verbal. Um exemplo que pode ser
citado neste caso é a forma de saudar alguém. Um americano,
por exemplo, quando necessita cumprimentar alguém em uma situação
formal, deve dizer “Hello, how are you?” ou “Nice to
meet you again”. No entanto, se este americano estivesse encontrando
com um amigo em uma situação informal, seria mais apropriado
dizer “Hi, whatcha been doing?” ou “What’s up?”
(site SIL International, 1999).
A ultima competência, a estratégica, trata-se da manipulação
da língua visando atingir os objetivos comunicativos, tentando
dar continuidade a um diálogo e esclarecer algumas falhas na comunicação.
Esta competência compreende uma série de estratégias
que devem ser colocadas em prática quando as demais comunicações
falharem, sejam elas, estratégias gramaticais falhas ou estratégias
sociolingüísticas inadequadas. Savignon (1983, apud site activelogic,
2000) exemplifica esta competência através de uma falha na
comunicação devido à diferença na pronúncia.
Um francês percebe a falha e tenta resolve-la utilizando a repetição,
a ênfase e a mímica, destacando assim, a negociação
do significado envolvido através do uso da competência estratégica.
O ensino de cultura tornou-se imprescindível para o entendimento
e para a adaptação do contexto em que o falante irá
utilizar a língua. Houve uma inversão de funções:
ao invés do aprendiz estudar a língua para ter acesso à
cultura, faz-se, agora, necessário estudar a cultura para ter o
domínio de uma língua. Higgs (1990, apud Lessard-Clouston,
1997, p. 3) salienta que língua e cultura possuem um vínculo
inquebrável que impossibilita o ensino de línguas sem que
também seja ensinado implicitamente a cultura.
Para compreender o conceito de cultura atual é necessário
que esta seja observada em todos os sentidos, situações
e etapas de um determinado grupo que vivencie o mesmo estilo de vida,
compartilhando a língua falada, as crenças e a religião,
os costumes e tradições, a estrutura familiar, a relação
em sociedade, suas atividades de lazer, maneiras de vestir, valores éticos,
padrões de trabalho, formas de agir e pensar, etc, envolvendo todos
os ciclos naturais da vida de um indivíduo pertencente a esta comunidade.
De acordo com Giddens (apud Sarmento, 2004, p. 5), “cultura consiste
em valores que os membros de um determinado grupo têm, as normas
que seguem, e os bens materiais que criam”. A observação
de uma cultura, feita por um indivíduo pertencente a um grupo diferente
daquele em que está em contato, provavelmente será errônea,
considerando algumas atitudes e comportamentos que causarão o estranhamento
deste indivíduo, julgando-os, desta forma, inadequados à
tal situação. No entanto, para os indivíduos pertencentes
àquela comunidade, tais atitudes e comportamentos são hábitos
tão comuns que possibilitam a eles reagir ou responder de forma
natural.
Cada grupo segue um determinado padrão cultural. Porém,
devido às diferenças existentes nesta generalização
cultural, este padrão possui algumas subdivisões. Alguns
comportamentos culturais são tão comuns aos membros daquele
grupo que, muitas vezes, não são notórios aos seus
olhos, sendo conhecidos, pela definição de Erickson (apud
Sarmento, 2004, p. 6) como cultura invisível. Tais padrões
são assimilados naturalmente através da exposição
diária e inconsciente do aprendiz à língua em questão.
Por outro lado, há uma parte da cultura que, por se tornar saliente
em qualquer grupo cultural, é reconhecida por Erickson como cultura
visível. Esta cultura abrange comportamentos que estão explícitos
no dia a dia das pessoas, como o vestuário, os alimentos, a forma
de moradia, a geografia, o clima, etc (Sarmento, 2004). Tais culturas,
visíveis ou não, tendem a se tornarem diferentes em cada
grupo. Muitas vezes, as pessoas têm dificuldades em aceitar as diferenças
relacionadas acima como diversidade cultural, principalmente quando estas
têm contato com um único um tipo de cultura ao longo de toda
a sua vida.
A aceitação da relação língua x cultura
levou à criação por Byram (1997, apud site LOTE,
p. 1) do conceito de competência intercultural, entendido como a
capacidade de interagir com pessoas de um outro país e cultura
através de uma língua estrangeira, a capacidade de negociar
através de uma comunicação que seja útil tanto
para o próprio falante como para o seu interlocutor. Um artigo
da revista Newsweek (1990, apud Fantini, 2004, p. 25) refere-se a esta
competência como essencial numa sociedade globalizada. Um exemplo
disto é o sucesso nos empreendimentos de corporações
multinacionais que dependem da comunicação efetiva de seus
integrantes na sociedade internacional.
Byram (2000), destacou cinco elementos que envolveriam a competência
intercultural:
? Atitudes: curiosidade e abertura pra suspender descrenças
sobre outras culturas e crenças sobre a própria.
? Conhecimento: de grupos sociais e seus produtos e práticas no
seu país e no país de seu interlocutor e, dos processos
gerais de interação social e individual.
? Habilidades de interpretar um documento ou evento de uma outra cultura,
para explicar e relatá-lo sua própria cultura.
? Habilidades de descoberta e interação para descobrir novos
conhecimentos e atitudes de uma cultura e práticas culturais e
habilidades para operá-los sob os constrangimentos da comunicação
e interação em tempo real.
? Apropriação crítica e cultural: uma habilidade
para avaliar criticamente e sobre a base de critérios as perspectivas
explícitas, práticas e produtos em seu próprio país
e cultura e na cultura e no país de outros.
(adaptado para o português minha tradução)
A importância da competência intercultural foi salientada
por Fantini (2004, p. 31) através de uma metáfora, que faz
alusão ao modo como o contato com outras culturas ajuda a reconhecer
a sua própria cultura: “If you want to know about water,
don’t ask a goldfish”. Se quiser saber/aprender sobre a água,
não pergunte ao peixinho, porque este sempre habitou nesse meio,
não o conseguindo explicar, pois aqueles que nunca tiveram contato
com outra cultura não percebem e nem conseguem definir a sua. Fantini
ainda enfatiza essa idéia através do poema:
How shall I talk of the sea to the frog,
If it has never left his pond?
How shall I tlak of the frost to the bird of the summerland,
If it has never left the land of its birth?
How shall I talk of life with the sage,
If he is prisoner of his doctine?
(Chung Tsu, 4th Century B.C., apud Fantini, 2000)
Neste poema, o autor afirma que ninguém pode avaliar,
descrever ou julgar uma cultura sem que tenha conhecimento das demais
para que possa compará-las e diferenciá-las.
Como eu deveria falar do mar para o sapo,
se ele nunca deixou sua lagoa?
Como eu deveria falar da geada para o pássaro da terra do sol,
se ele nunca deixou a terra de seu nascimento?
Como eu deveria falar de vida com o sábio,
se ele é prisioneiro de sua doutrina?
(adaptado para o português, minha tradução)
Dado que uma das funções primordiais do
Inglês Internacional é permitir que falantes de todo o mundo
troquem idéias e possam compreender-se, a interação,
através da língua inglesa, necessita do conhecimento, por
parte de qualquer indivíduo, do meio sociocultural da comunidade
em que estará inserido. O ensino de uma língua estrangeira
deverá ir além do desenvolvimento da habilidade lingüística.
Deverá, conseqüentemente, desenvolver a habilidade de comunicar-se
e de compreender diferenças culturais. Só assim, os falantes
da Língua Inglesa têm a oportunidade de transcender as limitações
do próprio mundo através do desenvolvimento da competência
intercultural (Fantini, 2004, p. 31). Compreender o comportamento cultural
de outros, diferente do seu e adequando-se a tal, fará com que
os indivíduos daquela comunidade entendam as atitudes do novo falante.
O contato positivo com outras visões de mundo possibilita aos indivíduos
vivenciar novas experiências e estimular suas perspectivas através
da percepção das diferenças e semelhanças
entre diversas culturas e comunidades. Para isso, segundo Fantini (2000),
“nós necessitamos ser educados para nos tornarmos melhores
participantes globais, aptos a enfatizar e entender outras pessoas em
seus próprios termos e também aprofundar uma apreciação
de nossas próprias heranças”. Desta forma, destaca-se
a importância da competência intercultural no ensino-aprendizagem
de línguas estrangeiras, a fim de que o aprendiz estude outras
culturas sem criar estereótipos ou interpreta-las erroneamente.
Segundo Damen (1987), uma pessoa que observa os valores de comportamento
de “estranhos” faz suas atribuições e avaliações
baseada nos seus sistemas de crenças e valores. É por este
motivo que a autora apresenta uma série de declarações
sobre o comportamento de estrangeiros:
? Americanos são frios.
? Os chineses são curiosos. Eles estão sempre fazendo perguntas
sobre questões pessoais.
? Os espanhóis devem detestar animais. Olhe o que eles fazem com
os touros!
? Os casamentos não acabam nos Estados Unidos.
? Os americanos fazem perguntas bobas. Eles pensam que todos nós
vivemos em tendas e só tomamos leite de camelo! Eles deveriam ver
nosso aeroporto!
(Damen, 1987, p. 192) (Adaptado para o português minha tradução)
Tais declarações revelam o ponto de vista
ou a preocupação de quem a coloca, o sentimento deste indivíduo
em relação a um povo, ou a assuntos um tanto delicados.
Ainda é importante salientar que estas afirmações
são apenas percepções do falante, que, em alguns
casos, não podem ser aplicadas ao grupo em sua totalidade. No entanto,
estas percepções, juntamente com os valores e crenças
nativos, desempenham um importante papel comunicativo, tornando-se, para
muitos daquele grupo, uma verdade que, muitas vezes, julgamos infundamentada.
Diante da diversidade de valores e crenças culturais de cada comunidade,
a única forma de o estudante de língua inglesa como língua
internacional não cometer estes equívocos será analisar
tais comportamentos em relação aos membros da comunidade
como um todo.
Cada grupo cultural possui diferentes crenças, valores e comportamentos.
Um exemplo disto é a grande diferença existente nas características
culturais do Japão e dos Estados Unidos. O abismo é tão
grande entre uma cultura e outra que estas chegam a parecer opostas uma
a outra. Para se conseguir lidar com estas diferenças, e conseguir
desmistificar os estereótipos, seria fundamental o infindável
agrupamento de todos os valores culturais, crenças, atitudes e
suposições. Como esta tarefa seria impossível, muitos
autores do campo da comunicação intercultural têm
adotado um conceito sugerido por Kluckhohn e Strodtbeck (1961, apud Damen,
1987), dividido em três pontos principais. Para os autores, i) existe
um limitado número de problemas para os quais todas as culturas
devem encontrar soluções e, ii) estas soluções
devem ser mapeadas junto a uma extensão de variações
contínuas e, por último, iii) determinadas soluções
têm por foco determinados integrantes de um grupo cultural, porém
todas as soluções potenciais estão presentes em todas
as culturas.
Os autores acreditam que os valores de qualquer sociedade envolvem a relação
do homem com o meio ambiente, a natureza humana, o tempo, a atividade
e a interação humana. Em cada grupo social existem sempre
posições dominantes que favorecem a construção
de um “profile” específico de cada cultura. Tais profiles
não se tratam de estereótipos, mas, sim, de tendências
comportamentais, normativas e valorativas de indivíduos pertencentes
à determinada comunidade. Tais tendências são importantes
por fornecerem ao aprendiz “good guesses”, ou seja, “bons
palpites” sobre os motivos que levam determinadas pessoas a agir
desse modo. No entanto, elas podem ser, como qualquer outra característica
cultural, ignoradas, quebradas, alteradas ou aceitas. Uma orientação
sobre os valores de uma sociedade é importante para quem quer participar
de comunicação intercultural, pois os valores e as crenças
de um povo são de importância vital para quem quer comunicar-se.
Neste sentido, Fantini (2000) realça a importância de estabelecer
um entendimento entre interculturalistas e professores de língua
visando trabalhar língua e cultura indissociadamente, uma vez que
estas são reconhecidas uma como dimensão da outra. Os interculturalistas
negligenciam (ou deixam para os professores de língua) a tarefa
de desenvolver a competência da língua, assim como os professores
de língua negligenciam (ou deixam para os interculturalistas) a
tarefa de desenvolver habilidades interculturais.
Alguns manuais de ensino de língua inglesa como o “Gobal
Links” e o “Cultural Awareness” de Barry Tomalin &
Susan Stempleski, ou New Interchange de Jack Richards e o Inside Out de
Helena Gomm estão preocupados em incluir atividades e sugestões
sobre o ensino da cultura em contextos de uma segunda língua e/ou
de língua estrangeira. Kramsch (apud Delgado, 2004, p. 235), sintetiza
estas preocupações ao salientar a necessidade de se adquirir
uma consciência cultural “vista como uma capacitadora da proficiência
da língua e como o resultado da reflexão na proficiência
dessa língua”.
Estas perspectivas nem sempre são partilhadas pelo Ministério
de Educação dos países em geral. Adaskou et all (1990,
p. 5) realizaram um estudo numa escola secundária de Marrocos em
relação ao conteúdo cultural a ministrar num novo
curso de Inglês. Os autores procuraram investigar as razões
principais pelas quais se procura introduzir informação
cultural num curso de línguas, tendo concluído que, nesse
estudo, foi decido, por instâncias governamentais, a introdução
do mínimo de conteúdo cultural no ensino da língua
inglesa, sendo os professores somente consultados sobre o valor positivo
ou negativo da informação como motivação dos
alunos para o aprendizado lingüístico.
Ao realizar um estudo sobre o inglês como língua estrangeira
na Grécia, Prodromou (1988) constatou que o ensino que vinha sendo
aplicado não estava atendendo às expectativas e necessidades
dos aprendizes. Isto porque, segundo ele, “os atos de fala e as
funções na maioria dos livros texto eram baseados em situações
com as quais a maioria dos estudantes nunca tinham tido o mínimo
de contato”. E como o material utilizado mantinha um padrão,
pouco espaço restava, em cada aula, para acrescentar algum conteúdo
cultural, que quando era transmitido tornava-se um produto alienado. Portanto,
estudava-se uma outra língua, entremeada a padrões comportamentais
totalmente diferentes dos conhecidos pelos aprendizes, sem que esta tivesse
o mínimo de relação com a própria, trazendo
para o seu aprendizado um mundo alheio a sua realidade. Tendo em vista
suas constatações, Prodromou sugere que o material de Língua
Inglesa utilizado naquele país passe por uma reciclagem, adapatando-o
ao contexto cultural grego, possibilitando, assim, uma menor exposição
direta a uma única cultura (que nem sequer é a sua). Contudo,
este autor salienta a necessidade de destacar aos alunos os diversos usos
da língua estrangeira, tanto numa escala global, quanto local.
Ficchiaro e Donomo (1973: p.140) destacam que os tópicos de cultura
selecionados deveriam possuir dois objetivos principais: “(1) deveriam
contribuir para o desenvolvimento intelectual, social, moral, cívico
e emocional de cada estudante; (2) deveriam prover aos estudantes idéias
para uma nova maneira de vida, não só como um meio de neutralizar
possíveis prejuízos através do entendimento e apreciação,
mas, também, como um meio de desenvolver um conhecimento mais completo
de sua própria cultura”. Tais objetivos não deixam
de estar presentes na Proposta Curricular Nacional Brasileira, pois esta
enfatiza que a Língua Estrangeira é instrumento fundamental
para que qualquer indivíduo possa ter acesso a outras culturas
e integrar-se no mundo globalizado. Os PCN’s salientam ainda a importância
de o aprendiz utilizar, em contextos particulares, o conhecimento lingüístico
adquirido, compondo corretamente suas frases no desenvolvimento da prática
social da linguagem, visando, assim, a interação social.
Porém, estes objetivos propostos tornam-se obscuros aos olhos dos
professores que, na maioria das vezes, não direcionam seu trabalho
para o cumprimento de tais objetivos por depararem-se com a carência
de esclarecimentos sobre o tipo de cultura a ser repassada, com a falta
de informação sobre a função desta nas aulas,
de que forma ela será repassada e que situações sociais
ela deverá atender. Muitas são as vezes que estas falhas
vêm sendo justificadas pela escassez de profissionais qualificados
e às dificuldades de acesso, por parte dos professores, a materiais
didáticos apropriados.
A realidade de ensino de muitos profissionais habilitados para o ensino
de Língua Inglesa vem sendo, muitas vezes, um tanto quanto ineficaz
para suprir as necessidades de comunicação atuais. Muitos
professores, por omissão ou comodidade, julgam não ser de
sua responsabilidade o repasse de outros conhecimentos que vão
além do ensino de recursos lingüísticos. Estes profissionais
“não reconhecem que têm a obrigação de
ensinar habilidades de socialização ou consciência
sociocultural como alternativas da própria cultura do aluno”.
Este fato leva Savignon (1987) a deduzir que os professores de língua
inglesa, mais do que um método de ensino pronto para aplicar nas
suas aulas, necessitam ver o ensino da língua como a expressão
do indivíduo e de significados criados e trocados. Precisam ver
o aprendiz de língua como um ser individual dotado de necessidades
e interesses intelectuais, psicológicos e físicos que vão
além da sala de aula.
A aprendizagem de recursos socioculturais pertencentes às comunidades
que utilizam o Inglês como língua materna é fundamental
para que o aluno possa expressar-se naturalmente, utilizando os meios
de comunicação adequados para tais grupos. Neste sentido,
Bagno (1999 apud Sarmento 2004, p. 12), explica que uma das principais
tarefas do professor de língua estrangeira é a de mostrar
ao aluno que a língua é um grande “guarda-roupa”.
Segundo esta metáfora, vestimos roupa de acordo com determinada
situação e, dependendo de cada situação, deveremos
adequar a língua.
Porém, a multiplicidade de informações culturais
que podem ser repassadas aos alunos aprendizes de uma língua estrangeira
considerada internacional é a principal dificuldade enfrentada
pelos professores ao definir o conteúdo cultural de suas aulas.
Isto porque informações de todas as partes do mundo são
válidas para este tipo de ensino e nem os próprios professores
serão detentores de todo este conhecimento. Como Sarmento (2004,
p. 11) refere, o selecionar de informação “implica
um conhecimento bastante abrangente de aspectos culturais de várias
culturas que talvez devessem ser abordados em sala de aula”. De
acordo com Tomalin e Stempleski (1996) existe uma variedade enorme de
materiais, programas de rádio e TV, vídeos, artigos de jornais
e revistas, objetos variados, que o professor pode utilizar para o estudo
do que eles denominaram por “comportamento culturalmente determinado”
(culturally influenced behaviour). Este comportamento culturalmente determinado
pode ser entendido como a influência cultural sobre um determinado
grupo. Esta influência faz com que sua conduta siga os padrões
culturais pré-estabelecidos que variam de grupo para grupo. Assim,
quando um indivíduo tem contato com outra comunidade cultural,
suas crenças, percepções e comportamentos não
são bem aceitos pelos integrantes da comunidade anfitriã.
Em países de forte imigração, deve existir uma sensibilização
para diferenças multiculturais, tanto por parte da comunidade anfitriã,
como das comunidades que decidiram nela viver. É o caso do Canadá
que se apelida de “melting pot” por tentar preservar os valores
e crenças das suas diversas comunidades.
O comportamento culturalmente influenciado deverá surgir do material
da língua que está sendo estudada, sendo claramente identificado
e sistematicamente tratado como um fator regular das aulas de língua
estrangeira (EFL – English as a Foreign Language) e de segunda língua
(ESL – English as a Second Language), ao contrário do que
afirmam alguns autores, que acreditam não ser necessário
planejar o conteúdo cultural que será ensinado. Para eles,
o ensino de cultura deveria ocorrer de forma espontânea, devendo
o professor estar atento às diversas situações que
ocorrem em sala de aula para explorar algum assunto cultural que esteja
vinculado àquela situação. Já Lafayette (1993,
apud Sarmento, 2004), aponta o planejamento das aulas de língua
e cultura como fundamental para garantir a presença do ensino de
cultura integrado ao da língua. Sarmento ainda enfatiza que “incluir
aspectos culturais nos planos de aula, preparando-os com antecedência,
é fundamental para garantir que os aspectos de sensibilização
cultural tenham lugar na sala de aula”.
Concluindo, a língua inglesa não pode mais estar conectada
à cultura dos países do “Inner Circle”, pois
o contato exclusivo com as culturas britânica ou americana não
é suficiente. Primeiro, porque, até mesmo para os falantes
nativos do inglês, não existe um único padrão
cultural. Segundo, porque a língua inglesa, hoje, é utilizada
pelas mais diferentes comunidades mundiais, falantes nativos ou não,
e para os mais diversos fins. Uma das funções primordiais
do Inglês Internacional é permitir que falantes de todo o
mundo troquem idéias e possam compreender-se. Conseqüentemente,
o simples repasse de conhecimentos lingüísticos torna-se insuficiente
para o seu ensino. O desenvolvimento da competência comunicativa
nos aprendizes de Língua Inglesa dependerá de uma metodologia
de ensino que contemple a inclusão de práticas para desenvolver
nos alunos, além da competência interlingüística,
a competência intercultural. A competência intercultural é
indispensável para a sociedade atual que necessita comunicar-se
no mundo globalizado em que vive. Desta forma, a compreensão de
todos os aspectos socioculturais de uma comunidade lingüística
são fundamentais para o desenvolvimento comunicativo de qualquer
indivíduo. A criação de uma esfera de interculturalidade
implica o uso progressivo da língua inglesa para a comunicação
entre falantes não nativos e a integração de informações
da cultura fonte (que tem seu trabalho voltado para a própria cultura
do aprendiz) e da cultura alvo internacional (que abrange uma grande variedade
de culturas de países de todo o mundo, falantes ou não de
inglês) Cada nação possui os seus próprios
traços culturais e, dentro de cada país, são infinitas
as diferenças culturais existentes que variam entre cada pequeno
grupo de uma comunidade. A diversidade cultural deve ser repassada aos
estudantes para que estes possam comunicar-se nos mais variados grupos
a que possam relacionar-se, desenvolvendo uma competência intercultural
que servirá como útil ferramenta para o seu desenvolvimento
comunicativo numa língua estrangeira. O professor tem que estar
ciente de que não existem metodologias prontas, e que o seu estudo,
preparação, criatividade e intuição são
necessários para uma prática de ensino de sucesso. Cabe
ao professor desenvolver a competência intercultural no ensino do
Inglês, através da integração de atividades
de leitura, discussão, interação, que sensibilizem
os alunos para diferenças culturais, levando-os a interagir, a
refletir e a desenvolver um conhecimento necessário para enfrentar
situações reais de comunicação. Barry Tomalin
e Susan Stempleski (1996) aliam o desenvolvimento da fluência na
língua estrangeira, com o conhecimento de como utilizar a língua
adequadamente nas mais diversas situações. Caso contrário,
a língua vai soar artificial, e o indivíduo terá
dificuldades em ser entendido, de entender e adaptar-se aos contextos
sem constrangimentos.
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