Cristiane Cardinalli - Colégio de Aplicação
PIOXII da PUC – Campinas
Este projeto originou-se no início do ano de 2003.
Por ser católico, o colégio inclui em seu plano escolar
o tema da Campanha da Fraternidade, que naquele ano foi: Pessoas Idosas.
Neste mesmo ano comemorava-se também o ano internacional da água
doce. Dessa maneira, no nosso planejamento discutíamos os projetos
que seriam desenvolvidos, bem como as diretrizes de nosso trabalho. Um
dos pontos levantados nas nossas reflexões foi a necessidade de
abordar aspectos emocionais, afetivos no desenvolvimento de nossos alunos,
tendo em vista os problemas interpessoais que observávamos entre
eles.
Analisando a sociedade, como fruto de uma história de evolução,
percebemos como ela transformou a vida humana em mercadoria (as pessoas
valem cada vez menos e o material cada vez mais) . Essa relação
projetada na indústria foi inconscientemente introjetada pelas
pessoas nas relações sociais. Somos herdeiros da modernidade,
no entanto, estes aspectos materialistas não contribuíram
para nos tornarmos seres humanos mais felizes. “Neste mundo virtual,
criado por meio da manipulação de tecnologias eletrônicas,
informáticas e cibernéticas, forma-se a mais vasta multidão
solitária.” (Ianni, 2000)
Esse modo de viver, onde há hierarquias e tensões, diversidades
e desigualdades, continuidades, rupturas, e grande parte do que nos ocorre,
pode ser lido no espelho das criações culturais do neoliberalismo.
Esse modelo, cujas regras nem sempre levam em conta o outro e onde nem
sequer se respeitam as leis, instituiu a competição para
“vencer na vida”.
Conforme Maturana (1998), “o fenômeno da competição,
que se dá no âmbito cultural humano e que implica a contradição
e a negação do outro” é semente e fruto de
uma sociedade doente, que não consegue ser feliz dentro deste modo
de vida que o isola, que o faz viver em uma virtualidade real.
A escola não é uma realidade isolada, é parte da
macrosociedade. Reproduz os comportamentos que condena e não cumpre
integralmente seu papel na formação de cidadãos conscientes
de sua capacidade de transformar a realidade.
Com uma preocupação educacional conteudista e de preparação
dos educandos para essa competição, observa se uma lacuna
no campo da sensibilidade humana, mostrando que alguns valores estão
sendo descartados.
Quando a professora de música da Escola levou o livro “Menino
de Olho d’Água” de José Paulo Paes para uma
das primeiras reuniões do Ensino Fundamental I, a reação
de todos os professores foi positiva, ou seja, todos abraçaram
a idéia de que por meio daquela história poderíamos
trabalhar os temas inicialmente propostos (Idoso e água doce),
além de despertar a sensibilidade dos alunos de primeira à
quarta série, envolvendo todas as áreas de conhecimento:
Humanas, Biológicas e Exatas, e especificamente as seguintes disciplinas:
: Língua Portuguesa, História e Geografia, Ciências,
Matemática, Música, Artes Plásticas e Teatro.
Então, ao observarmos que nossos alunos estão
chegando informados, mas pouco estimulados a vivenciar situações
que os sensibilizem, apresentam dificuldades em lidar com suas próprias
emoções, e conseqüentemente, com as relações
pessoais, nós consideramos este ponto preocupante, pois faz parte
da formação de cidadãos abordar não somente
os aspectos cognitivos, mas também os aspectos afetivos. E, se
isso não ocorre, vemos a sensibilidade sendo prejudicada.
Diante destas reflexões, surgiu o seguinte questionamento:
Como nós educadores podemos contribuir para o exercício
da educação da sensibilidade ?
Com o olhar no contexto acima descrito, o qual nos levou a problematizar
a questão da sensibilização dos nossos alunos, consideramos
este projeto relevante, no sentido de atender tais necessidades, uma vez
que vai ao encontro da Filosofia do Colégio Pio XII, sendo um dos
princípios que a norteiam: a Educação da Sensibilidade.
“ A educação da sensibilidade estimula a criatividade,
o espírito incentivo, a curiosidade pelo inusitado, a afetividade.
Ela realiza um esforço permanente para devolver ao âmbito
do trabalho e da produção, a criação e a beleza.
Procura não limitar o lúdico a espaços e tempos exclusivos,
mas integrar diversão, alegria e senso de humor a dimensões
de vida, como a escola, o trabalho, a rotina cotidiana.
A educação da sensibilidade não é um princípio
inspirador apenas do ensino de conteúdos ou atividades expressivas,
mas uma atitude diante de todas as formas de expressão que deve
estar presente no desenvolvimento do currículo e na gestão
escolar.”
Sendo assim o objetivo deste projeto foi:
Despertar a sensibilidade dos alunos numa produção artística,
na qual a palavra do texto literário infantil é a estrutura
básica para desenvolver a expressão corporal, linguagem
musical, teatral e artes plásticas.
Então, de maneira interdisciplinar, livro “Menino de Olho
d’Água” foi usado para as diversas abordagens. A professora
de Música musicou alguns trechos da história, enquanto que
a professora de teatro montava a peça com alguns alunos que voluntariamente
se propuseram a interpretar, e paralelo a isso, na sala de aula os seguintes
conteúdos eram trabalhados:
1ª e 2ª séries: - A vida do idoso
- Passado e presente
- Meio ambiente : - tipos de paisagens
- zona rural e urbana
- ação do homem
3ª e 4ª séries: - Clima
- Relevo
- Meio ambiente
- Transformação da Natureza
- Tipos de Texto
- Técnicas de pintura em aquarela
- Medidas de comprimento, escala e proporção
Educação Musical:
- o silêncio para a realização musical
- interpretação musical coletiva
- percepção auditiva, a técnica vocal e/ou instrumental
- expressão da criatividade
METODOLOGIA E ATIVIDADES
Foi desenvolvida a partir dos conteúdos de acordo com as séries
e disciplinas envolvidas. Sendo assim:
1ª e 2ª séries:
OBJETIVOS:
• Sensibilizar o aluno sobre a situação
atual do idoso.
• Reconhecer o valor do idoso na sociedade ressaltando sua importância
na constituição da cultura e memória coletiva.
• Distinguir e verbalizar a diferença entre “velho”
e “idoso”.
• Permitir a troca de experiências.
• Resgatar o respeito ao idoso.
• Desenvolver atitudes críticas, responsáveis e construtivas
para a preservação do meio ambiente.
• Identificar diferentes paisagens (ambiente natural e ambiente
modificado)
METODOLOGIA:
• Leitura compartilhada
• Roda de leitura e atividades orais
• Sondagem (sobre a família)
• Árvore genealógica
• Visita, entrevista e biografia dos avós
• Exposição de fatos e objetos antigos
• Observação de cenas
3ª e 4ª séries:
OBJETIVOS:
• Sensibilizar o aluno através da poesia,
da música, da dramatização e de obras de arte.
• Reconhecer as estruturas de diferentes tipos de texto.
• Compreender que o Homem é um agente de transformações
do meio em que vive.
• Desenvolver a consciência ecológica e de cidadania
para promover e preservar a natureza.
• Aplicar os conhecimentos de medidas, escala e proporção.
• Desenvolver a curiosidade, a investigação, a capacidade
de argumentação e levantamento de hipóteses.
METODOLOGIA:
• Leitura dramatizada e interpretação
oral da obra literária.
• Reconhecimento dos diferentes tipos de texto que compõem
a obra.
• Transcrição da história modificando a estrutura
de verso para prosa..
• Produção de poesia com o tema “Meio ambiente”.
• Elaboração de roteiro e registro da entrevista realizada
com o artista plástico Rubens Matuck, argumentador e ilustrador
do livro.
• Levantamento dos problemas ambientais tratados no texto e possíveis
soluções.
• Levantamento de informações sobre Cubatão,
exemplo mundial de recuperação ambiental, para construção
de painel comparativo.
• Construção de maquetes que representem as principais
mudanças ocorridas na paisagem, durante o desenrolar dos fatos
da história.
• Oficina de pintura com o ilustrador Rubens Matuck.
Educação Musical
• leitura do texto literário;
• comparação das poesias e sua apropriação
para a composição musical;
• laboratório para criação de expressão
e/ou percussão corporal ligada à interpretação
musical;
• estudo e ensaios das interpretações instrumentais;
• audição de diversos rítmos e estilos musicais
e a sua comparação com os estilos das composições
do “OLHO-d'ÁGUA”;
• ensaios parciais e gerais.
A finalização deste projeto foi a integração
do segmento (Ensino Fundamental I) num espetáculo teatral e musical,
apresentado no dia treze de novembro de 2003, no auditório Dom
Gilberto, no Campus I da PUC Campinas.
A avaliação deste projeto foi feita por meio de observações,
do envolvimento dos alunos com as propostas, da participação
na realização dos trabalhos e registros.
Esperávamos também que o envolvimento com o trabalho, a
reflexão e integração por parte de alunos e professores,
contribuíssem para o despertar da sensibilidade. E consideramos
que o objetivo foi atingido, pois a partir desse trabalho, no ano seguinte
(2004) outro espetáculo foi realizado (Cantarim de Cantará),
contando desta vez, não apenas com alguns alunos, mas com todo
o segmento e também com o envolvimento de professores, coordenadora
e orientadora, como atuantes na produção e na interpretação
da peça teatral.
Percebemos assim, que a semente da sensibilidade foi plantada nos alunos
e corpo docente, provando mais uma vez que a escola enquanto espaço
de realizações, pode ser mais humana, e que as relações
nela envolvidas podem ser transformadas em momentos de aprendizagem para
todos os envolvidos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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DE CLÁUDIA BENSIMON
CASTELLS, Manuel, A SOCIEDADE EM REDE_1999; tradução: Roneide
Venâncio Majer; atualização para 6a. Edição:Jussara
Simões( A ERA DA INFORMAÇÃO: ECONOMIA, SOCIEDADE
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IANNI, Octavio, ENIGMAS DA MODERNIDADE-MUNDO_Rio de Janeiro:Civilização
Brasileira
LYON, Jeff e GORNER, Peter_1995, ALTERED FATES: GENE THERAPY AND THE RETOOLING
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MORIN, Edgard_2002; AMOR, POESIA, SABEDORIA; tradução Edgar
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MORIN, Edgard_2001; A CABEÇA BEM FEITA: REPENSAR A REFORMA, REFORMAR
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PAES, José Paulo e MATUCK, Rubens_1991:O MENINO DE OLHO-D'ÁGUA,São
Paulo:Ática