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O
ENSINO DA COMPREENSÃO ORAL: ESPECIFICIDADES DESAFIOS E SOLUÇÕES
Nathalie Dessartre - UFPR
INTRODUÇÃO
É inquestionável a importância da
compreensão oral (C.O.) na comunicação. Partindo
desta premissa, defendemos a importância do desenvolvimento da competência
em C.O. no ensino e portanto do espaço dedicado a ela nos cursos
de língua estrangeira em geral e de FLE em particular. O ensino
da C.O. requer um espaço, não só maior do que o atualmente
dedicado nos livros didáticos e nos cursos de língua estrangeira,
mas sobretudo um espaço próprio, específico no ensino
da língua estrangeira, pois a competência em C.O. é
uma competência singular, diferente das demais competências
em C.E., E.E. e E.O., cujo desenvolvimento apresenta dificuldades e desafios
específicos.
Esta comunicação tem como objetivo final demonstrar a singularidade
do ensino da C.O.. Para tanto, na primeira parte, trataremos dos objetivos,
das estratégias de escuta, do material a ser usado e das estratégias
de C.O. a serem empregadas no ensino/aprendizagem; na segunda parte, trataremos
dos problemas apresentados por esta atividade e das possíveis soluções.
Apresentaremos, portanto, uma série de argumentos com o objetivo
de demonstrar os benefícios de uma abordagem didática singular
para o desenvolvimento desta competência que, além do tratamento
em conjunto com as demais competências (E.O., C.E. e E.E), normalmente,
associadas a ela em didática de língua estrangeira, merece
ser tratada de maneira isolada.
Mas antes de entrar nos tópicos anunciados acima,
já que este trabalho corresponde ao resultado de uma experiência
de ensino, vamos apresenta-la rapidamente. Trata-se de um estudo de caso,
realizado este semestre no contexto de uma disciplina dedicada exclusivamente
à compreensão oral, cujo objetivo final era desenvolver
esta competência entre os estudantes. O público desta disciplina
era composto de universitários, estudantes do curso de Letras –
Francês, oriundos de dois níveis diferentes (3o.e 4o. semestre)
e na sua maioria, com problemas de compreensão oral graves. A diferença
de nível entre os ouvintes e as limitações que encontravam
para compreender documentos sonoros me levaram, primeiro, a analisar de
perto as razões dos seus problemas de compreensão e aos
poucos, mudando várias vezes de tipos de documentos e de metodologias
de ensino, a descobrir algumas das explicações dos seus
problemas de compreensão assim como possíveis soluções,
como veremos mas adiante nesta apresentação.
I. DA SINGULARIDADE DO ENSINO DA C.O.: OBJETIVOS, ESTRATÉGIAS
DE ESCUTA, MATERIAL, E ESTRATÉGIAS DE C.O.
- dos objetivos de escuta:
Como na abordagem comunicativa, no ensino da C.O., o aluno é obrigatoriamente
o centro do processo de ensino e aprendizagem. O professor tem obrigação
de concentrar o seu ensino nos alunos e, em particular, nos seus objetivos
de escuta. Assim, a primeira pergunta a ser formulada a eles é:
quais são os seus objetivos em relação à compreensão
oral?
Pois, se paramos para pensar um pouco, veremos que, no
cotidiano, os objetivos de escuta podem ser variados. Assim, para E. Carette
(2001), podemos escutar para:
1. se distrair
2. aprender alguma coisa,
3. se informar,
4. agir/reagir.
- das estratégias de escuta:
Atreladas à variação destes objetivos, as estratégias
de escuta também mudam: não escutamos tudo da mesma maneira.
Assim, em função dos objetivos de escuta predefinidos com
os seus aprendizes, o professor deve escolher entre as estratégias
de escuta as que melhor atendam aos objetivos e à demanda do público.
A literatura especializada (Gremmo & Holec) , diferencia as estratégias
de escuta da seguinte forma:
1. escuta global;
2. escuta seletiva;
3. escuta detalhada
4. escuta de “Veille”;
- da seleção do material:
Também em função dos objetivos de escuta, o professor
vai selecionar o material a ser ouvido e elaborar as atividades a serem
realizadas a respeito. Quanto à escolha do material, é altamente
aconselhado dar preferência aos documentos autênticos ou pelos
menos aos chamados “realistas”, pelo fato destes serem contextualizados,
inseridos em uma situação real de comunicação.
E dentro destes, aos documentos audiovisuais: vídeos ou de internet.
Na impossibilidade de trabalhar com documentos audiovisuais, recorrer,
então, aos documentos áudio : CD, radio (via internet),
cassetes.
- das estratégias de compreensão oral:
Por estratégias de compreensão oral nos referimos às
estratégias cognitivas mais citadas na literatura especializada
como a utilização do conhecimento anterior, a inferência,
a interpretação do contexto e a antecipação
(C. Cornaire. (1998).
II. DA ESPECIFICIDADE DOS PROBLEMAS E DAS SOLUÇÕES DO ENSINO
DA COMPREENSÃO ORAL.
Além dos objetivos, das estratégias de escuta,
do tipo de material usados e das estratégias de C.O. , outro argumento,
talvez o maior, em defesa de um ensino específico da C.O. é
o da singularidade dos seus problemas e da suas soluções.
II.1) TIPOLOGIA DE PROBLEMAS ENCONTRADOS EM C.O.
Com relação à pesquisa sobre os problemas
de compreensão oral, uma das grandes dificuldades e frustrações
do pesquisador reside no fato deste ficar limitado às anotações
livres ou respostas dirigidas do seu público alvo e dos comentários
a respeito das dificuldades encontradas na realização das
atividades de C.O.. O pesquisador só pode analisar o material e/ou
apoiar a sua análise no que vê ou que ouve, na ponta do iceberg,
deixando no escuro uma imensidão de não dito, de não
escrito, um mundo invisível e inaudível da não compreensão
oral dos seus ouvintes .
Partindo do visível e do audível, ou seja das tentativas
de aproximação do sentido pelos ouvintes, apresentaremos
alguns dos problemas de C.O. encontrados em situação de
ensino (tabela 1).
Como podemos observá-lo na tabela (1), os ouvintes
encontram problemas fonético por vários motivos;

À
ENTENDER |
ENTENDIDO |
PROBLEMAS
FONETICOS |
|
100
Fr. |
5
Fr. |
[ã]/
[ ] |
Número-preço quantidade |
90
millions d’Euros |
82-92-80-04- millions d’Euros |
[d][i][s]/[ø]
[d][i][s]/[d][u][z]
[d][i][s]/
Æ
[v][
] [d][i][s]/
Æ |
De
4 à 6 |
2
4 6 |
[
]/ [ø] |
Número-horário |
12h45 |
2h45 |
[u]
/ [ø] |
XII ème siècle |
II
ème siècle |
[u]
/ [ø] |
Número – data |
1978 |
1918
1968 |
[s][w][s][ã][t] / Æ
[d][i][s] / Æ |
Salle 245 |
Salle 145 |
[ø]
/ Æ |
Número –sala |
Salle 275 |
Salle 265 |
[k] + [ ]+[z] / [s] + [
] + [k] |
|
|
|
|
À Rungis |
À Rangisse |
[
]/ [ã] |
Nome –lugar |
Vaucluse |
Vocruse |
[l]/[r] |
Limoges |
Limorge |
Æ / [r ] |
G.
Guillaumet |
G.
Diomet |
[g]/[d] |
Nome-pessoa
|
Leo |
Déon |
[l] + [o] / [d] + [ ] |
Félix |
Felipe |
[x]/[p] |
|
|
|
|
Banlieue |
Bon lieu |
[ã]/[ ] |
|
Cheveux |
Chevaux |
[ø]/[o] |
|
Blonds |
Bleus |
[ ]/[ø] |
|
Débutant |
De
plutant |
[p]/[b] |
|
Promener |
Proner |
[p][r][o][m][ ] [n][e]
/ [p][r][o] /Æ/ [n][e] |
|
Se promener |
Se
Æmener
|
[p][r][o] / Æ |
(como
as crianças em L.M.) |
La
beauté du site
La beauté du site |
La
Boutet du city
La
boute du site
Æà côté de sit |
[o]/[u]
[l]/
Æ
+ [y]/[e] |
|
Volcan |
Valcan |
[o]
/ [a] |
|
Chaleureux |
chalerrot |
[ø] / [o] |
|
églises
romanes |
églises
romaines |
[a]/ [e ] |
|
Estas observações
nos levaram a duas conclusões iniciais: primeiro, os problemas
fonéticos dos ouvintes se caracterizam como problemas de percepção
e/ou de discriminação de fonemas (para mais ou para menos),
de indícios portadores de sentidos. Segundo, entre os problemas
de compreensão mas comuns, os de mais difícil superação
são:
a) números
(datas, salas, horários, idades, preços, quantidades etc...
), e
b) nomes (de pessoa, de lugar etc..).
Estas primeiras
conclusões nos levam a insistir no beneficio do ensino da fonética
desde o inicio da aprendizagem da língua, não só
para levar os ouvintes a discernir e/ou discriminar melhor os fonemas
(especialmente com número e nome), mas sobretudo no sentido de
identificar os indícios sonoros portadores de sentido como por
exemplo, os do feminino, do plural, da negação etc... cuja
má compreensão ou não pode levar a um contra sentido
ou até a um não sentido.
Além
das dificuldades fonéticas, nos deparamos com problemas ainda mais
graves: os de segmentação da corrente sonora (tabela 2).
B). OS PROBLEMAS DE SEGMENTAÇÃO (Tabela 2).
À ENTENDER |
ENTENDIDO |
Marie Petit |
marne et petit |
Pierre Mougenot |
Pierre Rougenau
Pierre Jeuneu |
J’ai planté le décor |
Des corps |
Les rapporteurs se réunissent |
Le rapporteur sera Eunice |
Banlieue |
Bon lieu |
Y’ a plus d’essence |
Plus
de sens |
À
Rungis |
*Arangisse
(2x) |
Fou
de rage |
*Foulerage |
L’amant |
La main
La *man |
... qui aurait trompé son
mari |
Qui a *racontré son mari
Qui a rencontré son mari
Qui a retrompé son mari |
L’histoire des cultures humaines |
l’histoire de la culture
romaine |
Il ne faut pas tout miser sur
... |
... “*patumisée” |
Collection d’émaux |
Collection de “mots” |
Des
maisons à colombages |
Dês
maisons a “*o lo bage” |
Analisando
problemas que, a priori, achávamos ser de fonética, percebemos
que na realidade alguns deles eram problemas de segmentação
que, ao nosso ver, são bem mais graves do que os primeiros. Constatamos
que os ouvintes enfrentam dificuldades para segmentar o discurso oral
que lhes aparece, mesmo que pontualmente, como uma corrente sonora indiscriminada.
Os ouvintes inexperientes encontram dificuldades para delimitar as palavras
e/ou os grupos de palavras. Portanto, além da necessidade do ensino
da fonética mencionado acima, chegamos também à conclusão
que, para auxiliar no desenvolvimento da competência em compreensão
oral dos ouvintes, era imprescindível conceder um espaço
maior ao ensino da prosódia ou para retomar as palavras de E. Guimbretière
(2001): “La prosodie (est) un passage obligé pour la compréhension
orale”. Defendemos portanto o ensino dos parâmetros prosódicos,
com enfoque maior na segmentação do discurso em unidade
de sentido, abordando entre outros o fenômeno da ligação,
a localização do acento tonico, a localização
das pausas e a valorização (“mise en relief”).
Outro tipo de problema que nos surpreendeu nesta análise das dificuldades
de compreensão oral é o da interferência cultural
(tabela 3).
Na primeira
parte deste artigo, apresentamos entre as estratégias de compreensão
oral, a utilização do conhecimento prévio e a inferência.
Na grande maioria das vezes estas duas estratégias auxiliam os
ouvintes no processo de C.O.. Porém, ao colocarem as suas dificuldades
de C.O. no papel, constatamos que o recurso a estas estratégias
também pode se tornar negativo; se observarmos os exemplos da terceira
tabela, vemos que além de revelar problemas de origem fonética,
devidos à interferência da língua materna, muitos
evidenciam sobretudo uma interferência de ordem cultural, a do conhecimento
prévio que leva os ouvintes a “cometerem” o que chamamos
de “inferência negativa”.
Tais resultados
evidenciaram conseqüentemente um quarto tipo de obstáculo,
o conhecimento não partilhado (tabela 4).
C) OS PROBLEMAS
DE INTERFERÊNCIA CULTURAL (Tabela 3).
À ENTENDER |
ENTENDIDO |
Interferência cultural |
outro problema associado |
Le
même groupe |
Le
même couple |
em português casal=2 filhos |
fonêtico
[k]/[g] |
Francis Carré |
Francisce Carré
Francisc alée
Francisque Carré |
Francisco/ca |
fonêtico |
Un
trimestre |
Un
semestre
Trois semestres |
A duração de curso no Brasil é semestral |
|
Possibilité d’achat d’une ou deux cassettes |
Vídeo
cassete |
No
Brasil “cassete” = vídeo, pois as demais
são
fitas. De onde a confusão. |
|
Les rapporteurs se réunissent |
Le rapporteur sera Eunice |
Eunice |
+ segmentação |
Félix |
Felipe |
Felipe |
+
fonético |
Crève
(les pneus) |
Crave |
Associação com cravar |
+ fonético |
Contesse |
Condesse |
Associação com condessa |
+ fonético |
Lambert |
Lambrète |
Interferência
da imagem de uma lambreta |
+ fonético |
Fou
de rage |
Foulerage |
Associação
de idéia moto/fumaça/fuligem |
Interferência das imagens da atividade de C.O. |
Présence de terres rouges dans la région |
Terre
rouge bonne pour planter |
A
associação de idéia terra vermelha = boa para plantar -> informação
não mencionada no doc. |
Inferência cultural / do conhecimento anterior. |
La verdure
(le
vert, la nature) |
Verdura
|
Interf.
da L.M. Associação com Verdura
(legumes etc...) |
|
Aventure |
Associação
com do verde com aventura |
|
40
habitants |
400
habitants |
A
inexistência no Brasil de um vilarejo com tão pouco habitantes |
+ desconhecimento da cultura de chegada |
D) O CONHECIMENTO
NÃO PARTILHADO OU O DESCONHECIMENTO DA CULTURA DE CHEGADA (tabela
4)
Tipos
de documentos |
Tipos
de desconhecimentos |
1.programa
de televisão |
Os
tipos de programas mais conhecidos
o
léxico típico deste tipo de documento |
|
Referências
geográficas
As
informações típicas deste tipo de documento
(por
ex: 2 à 3 mn de soleil en plus aujourd’hui). |
3.
descrição de uma viagem por um profissional do turismo |
-Referências
geográficas
-
a noção dos preços praticados em tal pais. |
4.
noções de escala |
Distancias,
tamanho das cidades e dos vilarejos... |
Os tipos
de dificuldades presentes nas tabelas 3 e 4 mostram que o conhecimento
do mundo nem sempre é partilhado, e portanto que se deve prever
atividades facilitadoras visando superar esta lacuna.
Ao realizar
o levantamento dos problemas de C.O. apresentados acima, observamos paralelamente
que, além de serem variados, cada um deles raramente é fruto
de uma razão única e sim de origens múltiplas; para
cada um deles existem várias explicações possíveis,
simultaneamente, sejam elas fonéticas, prosódicas, culturais,
etc... a tal ponto que às vezes fica difícil determinar
qual foi o peso, a responsabilidade de cada uma delas na ma compreensão
de uma informação localizada.
Fora a revelação desta multiplicidade das origens dos problemas
de C.O., a análise longitudinal dos resultados mostra também
que estes evoluem, se transformam sem parar e muito rapidamente ao longo
do treinamento:
1. com o
passar do tempo graças ao próprio treinamento
2. em função os documentos usados
3. em função da língua usada para fazer anotações
e para responder as perguntas
Tamanha transformação
dos problemas, além de exigir continua reflexão e adaptação
dos documentos usados e das atividades previstas pelo professor, provocou
a procura de soluções igualmente variadas e múltiplas
em vista de facilitar o árduo caminho da C.O. Entre estas, encontram-se:
o conhecimento da teoria e a preparação de atividades facilitadoras.
Sejam elas, atividades de hetero ou de auto-ajuda, preventivas ou concomitantes
ao exercício de C.O.
II. 2) PROPOSTAS
DE SOLUÇÕES PARA A C.O.
- A) O CONHECIMENTO
DA TEORIA.
Se fazemos a síntese das quatro categorias de problemas de C.O
(fonético, prosódico, interferência cultural e/ou
de desconhecimento da cultura de chegada) encontrados pelos ouvintes,
percebemos sobretudo que, independentemente de sua origem, todos eles
têm uma característica em comum; na sua tentativa de aproximação
do sentido, os aprendizes mais inseguros tendem a “se agarrar”
ao que entendem, à “forma” captada, mesmo que esta
não faça sentido no contexto ou que ela não exista
em contexto algum. O reflexo destes ouvintes parece se identificar a alguma
palavra e “agarrar-se” a ela como se fosse uma bóia
que pudesse salvá-los do perigo, pensando: “pelo menos entendi
essa palavra” e eles vão atrever-se a soltá-la somente
se identificarem outra palavra e assim por diante pulando de palavra em
palavra até o final da travessia.
Tal atitude revela o medo do não compreendido, do não saber,
do vazio, uma preocupação dos ouvintes em compreender custe
o que custar, mesmo ao preço de um “contre sens” ou
pior de um “non sens”.
Resumindo, os ouvintes “inseguros” tendem a adotar somente
o procedimento semasiológico (Gremmo et Holec, 1990) de compreensão
oral (indo da forma ao sentido, passando pelas fases de discriminação,
de segmentação, de interpretação e de síntese).
Entretanto, como sabemos, compreender um texto oral (ou escrito) nunca
foi identificar palavras soltas, mesmo que muitas.
Assim, além de ensinar a fonética, a prosódia e a
cultura de chegada, surge mais uma necessidade didática: a de conscientizar
os ouvintes da existência dos procedimentos de compreensão
oral – semasiológico e onomasiológico e, sobretudo,
a de priorizar o processo onomasiológico que, indo do sentido à
forma, os permitirá superar os limites do primeiro. O processo
onomasiológico de C.O. implica (assim como para a compreensão
escrita) em elaborar hipóteses sobre o conteúdo, levando
em consideração o tipo e a estrutura organizacional do documento
trabalhado (monólogo, dilógo, plurilogo), a situação
de comunicação de modo a antecipar o sentido global do mesmo
e a emitir hipóteses a respeito do seu conteúdo. Hipóteses
que na continuação, graças às informações
captadas nas escutas do documento em questão, serão confirmadas
ou descartadas.
Para facilitar
a formulação de hipóteses, aconselhamos recorrer
a atividades preventivas como a seguir:
Exemplos
de atividades facilitadoras preventivas
1. Na fase
preliminar, entre as atividades (de hetero-ajuda) que o professor pode
prever, procurando preparar ou facilitar o processo de C.O., encontram-se:
- A Leitura preliminar
-B) PROPOSTA
DE ATIVIDADES FACILITADORAS
Exemplos
de Atividades facilitadores |
soluções
preventivas
(antes
do processo de C.O.) |
soluções
simultâneas ao processo de C.O |
Hetero-ajuda |
Leitura
preliminar de documentos preparatórios:
de
textos sobre a mesma temática;
de
mapas;
das
perguntas;
de
desenhos/fotos a relacionar com documento sonoro;
do
vídeo sem som |
Análise do contexto enunciativo e da organização
estrutural do documento sonoro |
Escolher tipos de escutas adequadas à estratégias
escolhidas (continua, fragmentada, limitada ou não etc..). |
Definir
o número de escutas com os ouvintes |
Formular
perguntas abertas |
Preparar
exercícios (QCM/V.F.) |
Solicitar
associação do documento sonoro com desenhos/fotos |
Completar
quadro/esquema/tabela... |
Desenhar
(um trajeto...) |
Identificar
os intrusos em uma lista. |
Associar
documento e resumo |
Provocação
de um “remue-méninges” cf. campo semântico trabalhado. (la musique, la préhistoire...) |
Recorrer
à língua materna para formular e/ou para responder às perguntas.
|
O
trabalho encima das transcrições |
Autorizar
o uso do dicionário unilíngüe |
auto-ajuda |
Treinar
sozinho
a)
as atividades descritas acima
b)
a compreensão global de vários tipos de documentos orais (filmes, radio,
Cd, internet etc...) |
a
estratégia de compensação |
a) de documentos
introdutores à temática do documento sonoro. Por exemplo:
programas de televisão, previsões meteorológicas
tipicamente francesas, horários de trem, prospectos turísticos,
textos históricos, bibliografias, etc.
Visando levar
a descobrir ou, pelo menos, a relembrar, através da compreensão
escrita, os tipos de discursos, os contextos de enunciação,
a organização estrutural e os campos semânticos próprios
deste tipo de documentos, estas atividades auxiliam os ouvintes a antecipar
o conteúdo do documento que na fase seguinte vão ter que
entender. A experiência mostrou que este tipo de atividade preventiva
permite evitar algum “contre sens” ou até “non
sens” ocorridos em outra ocasião quando a escuta do documento
sonoro tinha sido realizada diretamente. Por exemplo, a compreensão
das palavras “flasch” e “amulette” quando o documento
tratava da pré-história, de “flèches”
(flechas) e da ausência “allumette” (fósforo)
para acender o fogo na época.
b) de mapas
(por ex: localizar informações turísticas e /ou previsões
meteorológicas)
Da mesma maneira, a leitura prévia de um mapa e/ou de horário
de trem permite evitar situar cidades fora do lugar em um mapa de previsões
meteorológicas ou de imaginar um trajeto de trem totalmente ilógico
por mero desconhecimento do mapa do país ou da região e
não por incompreensão do documento sonoro.
c) das perguntas
e verificação da compreensão das mesmas (sobretudo
se estão formuladas em língua estrangeira).
Esta leitura pode ser realizada em vários momentos: antes da primeira
escuta, depois dela ou ainda depois de duas escutas. Após varias
experiências e conversas com os ouvintes, eles chegaram à
conclusão que preferiam tomar conhecimento das perguntas após
duas escutas, durante as quais, em função das suas preferências,
os ouvintes se concentravam somente na escuta ou apontavam simultaneamente
informações que lhes pareciam importantes.
d) Leitura
preliminar (exploração) dos desenhos, das fotografias ou
até mesmo do vídeo (sem som) a ser relacionado de um modo
ou outro com a parte sonora do documento.
- Outra atividade
facilitadora preventiva é a provocação de um “remue-méninges”
(brain storming) que permite para alguns descobrir, para outros relembrar
o campo semântico a ser trabalhado na compreensão. Como o
seu objetivo é similar ao da leitura de documentos escritos, esta
atividade pode ser realizada em associação à atividade
de leitura (antes dela) ou não.
- Um último
exemplo de atividade facilitadora preventiva consiste em realizar um trabalho
aprofundado sobre a transcrição do documento a ser compreendido.
Este trabalho prevê várias fases, descritas a seguir, que
podem ser efetuadas sucessivamente ou separadamente, segundo a necessidade.
? A fase
de identificação dos indícios sonoros das “liaisons”
e comparação comentada entre as esperadas pelos ouvintes
e as realizadas de fato. Esta fase permite, especialmente para ouvintes
pouco experientes, familiariza-se, por exemplo, com o fenômeno dos
fonemas “comidos”, que representa uma grande dificuldade para
a compreensão do francês falado, assim como com a identificação
dos indícios sonoros do feminino e do plural. Este trabalho de
identificação das liaisons e dos indícios portadores
de sentido é muito importante, pois ajuda conseqüentemente
os ouvintes a identificar e a delimitar as unidades de sentido, e portanto
a melhorar as suas chances de compreensão oral.
? A fase
da identificação da segmentação, comparando,
aqui também, a esperada com a realizada na oralidade. Este trabalho
de identificação e de comparação entre o esperado
e o realizado, como a fase anterior, permite identificar as unidades de
sentido, além de evidenciar, assim como na música, o quanto
é importante saber ouvir os silêncios (as pausas pequenas,
medias, longas, oralizadas), também portadores de sentido, às
vezes até mais do que as partes faladas.
? A última
fase é a da localização do acento tônico comparando
mais uma vez a localização esperada com a realizada. Ao
localizar o acento tônico (normalmente situado na última
sílaba sonora das palavras e/ou de grupos de palavras) o ouvinte
identifica o fim das unidades de sentido e portanto têm mais parâmetros
para entender o sentido do documento.
2. Exemplos
de atividades facilitadoras preventivas de auto-ajuda:
- O treinamento sozinho fora das aulas realizando atividades como as descritas
acima ou outras de compreensão global variando os tipos de documentos
orais , vendo filmes, ouvindo radio, Cd, internet etc... Nem precisa dizer
o quanto esta “prise en mains” da auto-aprendizagem pelos
ouvintes faz diferença.
3. Atividades
facilitadoras simultâneas ao processo de C.O.
- Na primeira
escuta, se possível, levar em consideração o contexto
de enunciação, identificando quantas pessoas falam, se é
mulher ou homem, quem fala a/com quem, a sua relação é
simétrica ou não, quando, porque, como etc...
- Simultaneamente, importa identificar a organização estrutural
do documento sonoro, definindo se se trata de um monólogo, de um
diálogo, ou de um plurilogo, assim como o encadeamento das seqüências
discursivas de tal documento, pois tais definições fornecem
muitas informações capazes de amenizar a tarefa da C.O.
- Escolher tipos de escutas adequadas às estratégias escolhidas.
Definir com os ouvintes os tipos de escuta que lhes convêm melhor
dando preferência à escuta continua para a compreensão
global, à escuta continua ou fragmentada para a compreensão
seletiva etc.... , da mesma maneira, o número de escutas que eles
consideram necessárias, limitada ou não deve ser decidido
em conjunto. No inicio, na experiência que estou relatando, os ouvintes
optaram para 4 escutas (2 globais e 2 seletivas), mas com o tempo consideraram
a quarta vez desnecessária.
- formular perguntas abertas, preparar exercícios do tipo QCM ou
V.F., solicitar associação do documento com desenhos/fotos
em ordem cronológica, ou com o melhor resumo, completar quadros,
tabelas, esquemas etc..., desenhar a informação entendida
(por ex: um trajeto em um mapa), encontrar intrusos em uma lista (por
exemplo explorando campos semânticos ) etc...
-Pelo que diz respeito às atividades, é muito importante
diferenciar a fase de treinamento e a fase de avaliação.
Na fase de treinamento, deve-se procurar facilitar a compreensão
dos documentos, prevendo recorrer à língua materna para
formular as perguntas (pelo professor) e inclusive as respostas (pelos
ouvintes) porque, às vezes, estes deixam de responder, não
porque não entenderam o documento sonoro, e sim porque não
entenderam a pergunta ou não souberam formular a resposta em língua
alvo. Tendo em vista que a atividade é somente de compreensão
oral e não escrita (cf, compreensão das perguntas), nem
de expressão oral ou escrita (cf. fornecer as respostas) é
fundamental conferir mesmo em língua materna a C.O. do documento,
sobretudo com aprendizes pouco experientes.
- Para concluir esta apresentação de atividades facilitadoras,
consideramos que chegando a um nível satisfatório de compreensão
global em que se opte por passar a anotar as informações,
a responder as perguntas e/ou a redigir um relatório do que foi
entendido, em francês, podemos permitir o auxilio de um dicionário
unilíngüe. Neste caso, o dicionário unilíngüe
pose ser usado para confirmar tentativas de acerto, esclarecer as dúvidas
(por exemplo em relação a nomes próprios).
De acordo com a nossa experiência, autorizamos este uso após
a segunda escuta de modo a facilitar a 3a fase em que eles têm que
responder às perguntas (escuta seletiva) ou ainda após as
quatro escutas na hora de redigir um relatório final do que entenderam.
Antes de
passar às considerações finais desta comunicação,
gostaríamos de destacar que as dificuldades de compreensão
não se limitam a criar obstáculos. Às vezes, entre
os ouvintes mais experientes também surgem soluções
espontâneas como a estratégia de compensação
nas quais o próprio ouvinte deixa de ir da forma ao sentido para
seguir o caminho inverso: do sentido à forma e, mesmo desconhecendo
a “forma”, a palavra que ele entendeu se apóia no sentido
para reformulá-lo com outras palavras, compensando assim uma lacuna
lexical. Substituindo, por exemplo, “cours de 4 à 6”
por “2 heures de cours /semaine” (Cf. tabela 1) ou “un
village de 40 habitants” por “um nombre restreint d’habitants”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Na primeira
parte desta comunicação, vinculada ao caráter imprescindível
da C.O. na comunicação, defendemos a importância do
desenvolvimento desta competência no ensino, assim como a singularidade
do seu ensino em relação ao desenvolvimento das demais competências
em língua estrangeira. Para justificar o nosso ponto de vista,
nos apoiamos na especificidade dos objetivos e das estratégias
de escuta, do material a ser usado (de preferência autêntico),
assim como das estratégias de C.O..
Na segunda parte, para aprofundamos a questão, apoiamos a nossa
argumentação na especificidade dos problemas e das soluções
para a C.O.. Neste sentido, analisamos um elenco de problemas surgidos
ao longo do treinamento dos ouvintes, entre os quais, os de fonética,
de prosódia (segmentação), de interferência
do conhecimento prévio e, de desconhecimento da cultura alvo. Ao
analisar os problemas de C.O., observamos, inclusive, que cada problema
específico raramente é fruto de uma explicação
única; a multiplicidade de origens dos problemas de C.O., assim
como a sua rápida transformação nos levou a recorrer
à soluções igualmente múltiplas e variadas,
visando facilitar o processo de compreensão.
Entre as soluções nos parece importante dar acesso ao conhecimento
da teoria especializada, primeiro para que os ouvintes tenham consciência
dos processos de C.O., sejam eles (semasiológico-onomasiológico)
usados por eles e, segundo, para que eles possam participar da reflexão
teórica que diz respeito a sua própria aprendizagem .
Associada a esta reflexão teórica coletiva, nos parece também
indispensável por parte do professor elaborar atividades facilitadoras
a serem realizadas antes (leitura/ trabalho sobre a transcrição)
ou no próprio exercício de compreensão.
Esperamos
ter atingido o propósito desta comunicação, ou seja
ter convencido os interessados de que, em didática de língua
estrangeira, a complexidade do desenvolvimento da competência dos
aprendizes em C.O. requer uma abordagem didática específica
e consciente.
BIBLIOGRAFIA:
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Mieux apprendre à comprendre l’oral en langue étrangère,
Le Français dans le Monde. Recherches et Applications “Oral:
variabilité et apprentissages. p. 126-141 Clé international,
Janvier 2001.
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Didactiques des Langues Étrangères dirigée par R.
Galisson. Clé international 1998.
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et un comportement. Collection Le Français dans le Monde/ Recherches
et Applications “Acquisition et utilisation d’une langue étrangère:
l’approche cognitive”. Crapel Université de Nancy 2.
Guimbretière, E. La prosodie: un passage obligé pour la
compréhension orale, Le Français dans le Monde. Recherches
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2001 p. 126-141 Clé international, Janvier 2001.
Écoute...écoute Objectif Comprendre CRAPEL Ed. Didier, 1986. |
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