Alice
S. Esteves
O grupo de
professores, pais, coordenadores, alunos e representantes da comunidade
escolar, na cidade de Resende ?RJ vem discutindo qual o papel do Projeto
Político Pedagógico ? PPP, que pressupõe a superação
da fragmentação curricular diante os questionamentos sobre
os fins e os valores da educação, proporcionando um “pluralismo
de saberes”. Por ser plural, apresenta uma complexidade de fatores
intervenientes a sua implementação e consecução,
abrangendo, desde a autoria do PPP, até as amarras do tempo, como
exigência e finalidade principal da atual política pública.
Expondo o PPP do Colégio de Aplicação de Resende,
pretendemos discutir sobre as partes constitutivas de um PPP, o documento
escrito, projetos e as ações espontâneas.
Foi motivada a discussão por parte de alunos, funcionários
e professores, bem como se buscou a contribuição da comunidade
para a elaboração do texto que representasse a participação
e os anseios de todos através de manifestações, sugestões
e críticas. Sistematizadas as informações, realizou-se
um novo estudo, procurando o atendimento de prioridades coletivas. Esse
processo vem representando, para o Colégio, um trabalho de articulação
dos diversos segmentos e uma auto-avaliação fundamental
para a continuidade do processo educativo, não só com relação
à flexibilidade como também às adequações
realizadas para atender às expectativas da comunidade educacional.
Sobre a necessidade de a comunidade escolar participar do planejamento
educacional, Freire afirma que:
Todo o planejamento
educacional, para qualquer sociedade, tem que responder ás marcas
e aos valores dessa sociedade. Só assim é que pode funcionar
o processo educativo, ora como força estabilizadora, ora como fator
de mudança. Às vezes, preservando determinadas formas de
cultura. Outras, interferindo no processo histórico, instrumentalmente.
De qualquer modo, para ser autêntico, é necessário
ao processo educativo que se ponha em relação de organicidade
com a contextura da sociedade a que se aplica (2002, p.10)
Por não
possuir uma padronização, as produções na
escola procuram, por meio de seu PPP, equacionar as relações
de poder e conhecimento para um contexto de cidadania, atribuindo ainda
uma finalidade inclusiva à escola bem como aos seus participantes.
A união entre o político e o pedagógico une o saber
docente, na qual está inserida a sua história de vida, suas
próprias experiências, observações e reflexões
sobre a sua própria ação, incorporados aos objetivos
do ensino e a clientela atendida, representado na sua totalidade pelo
currículo.
Uma pseudo-autonomia que está diretamente relacionado à
liberdade de escolha, cuja prerrogativa de escolher o que deve ou não
deve fazer, das regras a serem seguidas, que para Saviani estão
atreladas à “assimilação do saber historicamente
construído e sistematizado pelos homens” (1997, p. 56). Como
atores desse processo, reproduzimos fielmente o que nos foi instituído
conhecer e saber.
A Constituição de 1988 estabelece como princípios
básicos o “pluralismo de idéias e de concepções
pedagógicas” e a “gestão democrática
do ensino público” (Art. 206) e concordamos que esses princípios
constitucionais são fundamentais para a autonomia de uma escola.
As escolas, porém, possuem uma autonomia relativa, pois ainda estão
atreladas a um aparato estatal de controle cada vez mais rígido,
com suas ações administrativas e pedagógicas regulamentadas
e controladas pelos órgãos oficiais de gestão educacional,
inviabilizando projetos para mudanças e/ou adequações
curriculares que não sejam direcionadas apenas aos portadores de
deficiências.
Para Silva, “o que está em jogo não é apenas
uma reestruturação das esferas econômicas, sociais
e políticas, mas uma reelaboração e redefinição
das próprias formas de representação e significação
social” (1990, p. 56).
Neste sentido, a reflexão que se coloca em termos de educação
escolar é a seguinte: Como a escola tem se posicionado, reagido
frente às mudanças ocorridas na sociedade? Quais as iniciativas
pensadas e executadas em busca da construção de um novo
cidadão? Qual está sendo a intervenção educativa
no sentido de repensar este novo homem, com novos saberes, novas habilidades,
novas aptidões cognitivas?
A educação neste meio passa a ser questionada: Qual é
a verdadeira ou específica função da escola hoje?
Formar a quem? Para quem? E para quê?
Dentro desta perspectiva, em meio a conflitos pedagógicos, resgatando
uma filosofia de trabalho na escola, resignificando-a mediante a leitura
crítica do atual contexto, surge a necessidade de sistematizar
o PPP por meio de um trabalho coletivo, tornando-se assim, o desafio de
toda comunidade escolar.
O Projeto Político-Pedagógico é, portanto, um produto
em constante construção, inacabado e em constante fazer;
um exercício crítico e analítico para quem o faz
e quem o executa, sem imposição para a sua adesão.
A manutenção e continuidade do PPP se fazem através
da conquista de todos os atores escolares envolvidos em sua proposta.
Apresenta-se através da organização do trabalho pedagógico
e sua reflexão sobre o cotidiano da escola como processo de construção
coletiva, possibilitando o encontro entre todos os envolvidos com a escola
e as mudanças necessárias.
Considerações
finais: seus autores, co-autores, organizadores e detratores.
Construir
o Projeto Político-Pedagógico tornou-se um compromisso de
todos que se dizem educadores; fazer com que o PPP tenha coerência
com a filosofia institucional e coerência com a história
local demanda outras necessidades:
• Transformar o professor em leitor e autor da sua própria
prática educativa, proporcionando a ele condições
estruturais e motivacionais para isso, reduzindo aos poucos o “apego”
ao livro didático e à dominação do seu autor,
que se instituiu como detrator do trabalho docente.
• Proporcionar à comunidade escolar e social o ambiente propício
para a sua participação como co-autores ou colaboradores
do processo educativo e não mais como detratores do mesmo.
• Ouvir e reconhecer o conhecimento produzido pela comunidade relacionada
à moral, à sua história, aos seus costumes e às
necessidades instituídas pelas mudanças sociais. Conquistando
a sua confiança, permitimos que sejamos criticados em nossos pontos
mais fracos sem perder a oportunidade de contar com essa comunidade como
colaboradores e não mais detratores da escola.
• Observar as mudanças políticas que podem provocar
mudanças no fazer pedagógico, tanto pelo controle (avaliações,
censo escolar, determinações legais, entre outros) quanto
pelo descontrole (avaliações, censo escolar, determinações
legais, entre outros), culminando num dos maiores detratores do sistema
educativo, entre eles o PPP.
• Utilizar os meios informais como avaliação do PPP
e da própria ação escolar, seja através dos
relatos orais, através das comunicações via Internet,
dos encontros promovidos pela escola dentro e fora dela.
A articulação da escola com a sociedade se manifesta através
da ótica de Freire quando diz:
"Não
posso ser professor se não percebo cada vez melhor que, por não
ser neutra, minha prática exige de mim uma definição.
Uma tomada de posição. Decisão. Ruptura. Exige de
mim que escolha entre isto e aquilo. Não posso ser professor a
favor de quem quer que seja e a favor de não importa o quê.
Não posso ser professor a favor simplesmente do Homem ou da Humanidade,
frase de uma vaguidade demasiado contrastante com a concretude da prática
educativa. Sou professor a favor da decência contra o despudor,
a favor da liberdade contra o autoritarismo, da autoridade contra a licenciosidade,
da democracia contra a ditadura de direita ou de esquerda. Sou professor
a favor da lista constante contra qualquer forma de discriminação,
contra a dominação econômica dos indivíduos
ou das classes sociais. Sou professor contra a ordem capitalista vigente
que inventou esta aberração: a miséria na fartura.
Sou professor a favor da esperança que me anima apesar de tudo."
(1996, p.115)
Referências
Bibliográficas.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários
à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia: teorias da educação,
curvatura da vara, onze teses sobre educação e política.
31. ed. Campinas: Autores Associados, 1997.
SILVA, T.M.N. A construção do currículo na sala de
aula: O professor como pesquisador. São Paulo: EPU, 1990.
VEIGA, I.P.A . Projeto Político – Pedagógico da Escola:
uma construção possível. 2. ed. São Paulo:
Papirus, 1996.
VEIGA, Ilma Passos Alencastro; RESENDE, Lúcia Maria Gonçalves
(Orgs.). Escola: espaço do projeto político-pedagógico.
Campinas: Papirus, 1998.