Silvana De Vitta Martins - Universidade de Taubaté
– UNITAU
Magali Ramos Ferreira - Universidade de Taubaté – UNITAU
Na rede estadual de ensino, observamos que nossa clientela,
originária, em grande parte, de bairros de periferia têm
pouco acesso a livros, tanto em casa, quanto em bibliotecas públicas.
Boa parte desses alunos tem apenas o livro didático como referência
de leitura, usado nas aulas, e que, na maioria das vezes, nem são
levados para casa, por serem insuficientes em número para todas
as séries.
Os textos desses livros, de maneira geral, não têm chamado
a atenção da maioria dos alunos; nem sempre condizem com
a realidade da clientela, e mesmo quando são interessantes, acabam
sendo, muitas vezes trabalhados de forma superficial, com perguntas para
respostas prontas, que pouco fazem o aluno refletir, identificar-se ou
abstrair o sentido do que foi lido. Além disso, sabemos que nem
sempre o professor possui o preparo suficiente para utilizar um texto
do livro didático e ir além das simples perguntas contidas
nele, trabalhando-o de forma mais motivadora, abrangente e crítica.
Vale ressaltar a ausência de bibliotecas na escola estadual; em
muitas escolas não há sequer um espaço para ela,
e quando esse espaço existe, não há um profissional
qualificado para assumir a biblioteca. O que temos observado em muitas
dessas escolas, são quantidades de livros encaixotados, ou guardados
aleatoriamente em alguma saleta, com difícil acesso.
Como professora readaptada de uma escola estadual de São José
dos Campos, assumi a organização de um espaço para
ser uma mini-biblioteca, ou melhor, uma sala de leitura, recolhendo um
rico material não tanto em quantidade, mas em qualidade, que a
escola já possuía, unido a outras caixas de livros que a
escola estava recebendo.
A rede pública vem adquirindo um considerável número
de livros fornecidos pelo Ministério da Educação,
através de vários programas de incentivo à leitura,
como o Programa Nacional Biblioteca na Escola (PNBE/2002). Nessa época,
foi implantado pelo governo o Projeto Literatura em Minha Casa, livros
fornecidos através do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
(FNDE) e da Secretaria de Educação Fundamental (SEF). Trata-se
de coletâneas compostas de cinco gêneros literários:
teatro, novela, poesia, conto e clássicos adaptados. Esses conjuntos
de livros, pelo projeto, deveriam ser destinados somente às crianças
das 4ªs séries do ensino fundamental, para que fossem levados
para casa. Porém foram selecionados vários exemplares para
ficarem na biblioteca, para que toda a escola, e não somente as
4ªs séries, tivessem acesso a eles, pois as coletâneas
são pertinentes às faixas etárias de todo o ensino
fundamental, inclusive às 8ªs séries.
Iniciei as atividades da sala de leitura levando semanalmente turmas de
1ª a 4ª séries para contar histórias, apresentar
o acervo e emprestar livros, desde os de literatura infantil que a escola
já possuía até as novas coletâneas citadas
acima. Mas havia necessidade de um trabalho semelhante com as séries
posteriores (5ª a 8ª).
Decidimos então - professoras de Português e professora da
sala de leitura – criar um projeto que envolvesse também
os alunos desta faixa etária com os livros da coletânea Literatura
em Minha Casa. Apresentamos às turmas a sala de leitura, o acervo,
a possibilidade de empréstimo de livros e as novas coletâneas
do projeto do governo.
Após esse primeiro contato, focalizamos um gênero para iniciar
essa familiarização. O conto foi o gênero escolhido,
por entendermos que, de maneira geral, ele costuma ser familiar às
crianças mesmo antes da fase escolar, não só em sua
modalidade escrita, mas também oral, além de tratar de histórias
curtas e envolventes, que trabalham o fascínio, a imaginação
e a emoção, a partir de fatos que podem fazer parte do real.
Nesse projeto, nosso objetivo foi trabalhar essas obras de maneira criativa
e motivadora, como contribuição para despertar o prazer
de ler e compreender, servindo de auxílio necessário à
aprendizagem do aluno, desde a decodificação do texto até
a ampliação gradativa de seu amadurecimento e conhecimento
de mundo, tornando-o um leitor proficiente.
Os aspectos teórico-metodológicos que utilizamos foram as
concepções atuais de leitura, que enfatizam a importância
do conhecimento prévio e da contextualização da leitura
numa determinada situação, cultura, momento histórico;
o conto focalizado como gênero literário; as idéias
do filósofo russo Mikhail Bakhtin, focalizando o conto também
como gênero discursivo e os PCN, que sugerem atividades de leitura
segundo os aspectos citados.
Para nós, professoras envolvidas neste projeto, a experiência
foi enriquecedora e bem sucedida. Pudemos identificar as teorias lidas
e praticá-las. Adaptações foram feitas, mas pudemos
perceber como um trabalho pesquisado e planejado pode ser produtivo e
significativo, tanto para professores, como para alunos. Quando se consideram
e se aproveitam as vivências de cada aluno, suas próprias
histórias, somadas a novas experiências construídas
em conjunto, ocorre um real aprendizado, formando-se uma ponte para novos
aprendizados. O interesse pela leitura aumentou para todos os envolvidos.
A sala de leitura passou a ser freqüentada com assiduidade pelos
alunos. O interesse por contos e outros gêneros de leitura passou
a surgir. Empréstimo de livros, gibis, revistas, poemas, dentre
outros, aumentaram, e o relato sobre as leituras realizadas chama outros
colegas para a sala de leitura, interessados em conhecer o que o amigo
leu. É gratificante e motivador perceber a escola começando
a despertar interesse pela leitura, fonte de prazer e novos conhecimentos,
que nos incentiva a realizar novos projetos, a partir de novas idéias.
Foi relatada aqui a primeira etapa do projeto realizada e relacionada
à sala de leitura. A parte realizada em sala de aula é apresentada
e detalhada pela professora Magali Ramos Ferreira, responsável
pela segunda etapa do projeto.
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