|
CONCEPÇÕES
E PRÁTICAS DE PROFESSORES DE BIOLOGIA SOBRE O ESTÁGIO CURRICULAR
SUPERVISIONADO: UMA FERRAMENTA IMPORTANTE PARA A FORMAÇÃO
INICIAL
Suzani Cassiani de Souza,
Narjara Zimmermann,
Giselle de Souza Paula
Patrícia Montanari Giraldi
Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC - Centro de Ciências
da Educação-CED
INTRODUÇÃO
O presente estudo faz parte de um projeto de pesquisa
mais abrangente denominado “Condicionantes para tutoria no estágio
curricular supervisionado: articulando formação inicial
e continuada de professores” (COTESC), desenvolvido por meio de
uma parceria entre o Centro de Educação da Universidade
Federal de Santa Maria/RS e o Centro de Educação da Universidade
Federal de Santa Catarina/SC.
Na conjuntura atual em que se desenvolve o estágio curricular,
muitas vezes, o mesmo ocorre de maneira quase espontânea, ou seja,
não há uma maior sistematização na relação
escola-estagiários, professores-estagiários ou mesmo escola-universidade,
o que acaba por gerar uma situação inadequada para a formação
profissional dos licenciandos. De acordo com PIMENTA (2000), o estágio
curricular nos cursos de formação de professores não
prepara os estudantes para o exercício da profissão. Tal
fato, segundo a autora, está relacionado à ausência
de relações entre “o que ensinar”, o “como
ensinar” e o “a quem ensinar”, o que acaba por provocar
uma dicotomia entre teoria e prática. Tendo em vista essas afirmações,
consideramos importante atentarmos para questões que envolvem o
modo como os professores construíram e vêm construindo seus
olhares sobre o estágio curricular supervisionado (ECS), bem como
o modo como tais olhares influenciam nas suas relações com
os estagiários (licenciandos) no contexto da instituição
escolar. Assim, neste trabalho tomamos como foco as concepções
de professores de Biologia, vinculados a escolas públicas de Florianópolis,
sobre (ECS). A relevância de tal abordagem centra-se no fato de
acreditamos que ao darmos voz aos professores estaremos contribuindo para
promover uma melhor compreensão sobre o modo segundo o qual os
professores vêem o ECS tanto em seu próprio processo de formação,
quanto na formação de um futuro profissional.
Desse modo, como aponta TERRAZZAN (2003), tendo em vista as atuais normativas
legais sobre Formação de Professores que preconizam em seus
vários documentos diversos aspectos que precisam ser observados
pelas instituições que se propõem a atuar nesse campo.
Dentre tais aspectos há a antecipação do contato
dos futuros professores com os seus possíveis ambientes de trabalho,
em particular, com ambientes escolares. Há também uma clara
sinalização da necessária articulação
do estudo de conceitos e modelos, suas fundamentações históricas,
sociológicas e filosóficas, com a análise de situações
reais vivenciadas ou situações-problema propostas (hipotéticas
ou não). Em outros termos, reafirma-se a propalada articulação
entre as dimensões teóricas e práticas de uma formação
profissional. Por fim, uma nova compreensão do Estágio Curricular
Supervisionado também permeia as normativas legais sobre Formação
Inicial de Professores.
Nesse sentido, as Escolas de Educação Básica (EEB)
são chamadas a colaborar com as Agências Formadoras, ou seja,
as Instituições de Ensino Superior (IES). Na verdade, a
Resolução CNE/CP nº 01, de 18.02.2002, indica mesmo
a co-responsabilidade das EEBs na formação inicial dos profissionais
que nela trabalharão.
Por outro lado, existem tradições no campo da Formação
de Professores, constituído, no âmbito da Educação,
sobre uma contradição básica: a exaltação
desta “profissão” tanto nos discursos cotidianos, como
nos políticos e nos especializados, e, ao mesmo tempo, a sua extremada
desvalorização em termos sociais concretos (por exemplo,
em termos salariais). Ainda, tradicionalmente a Formação
de Professores, sobretudo para o Ensino Médio, é vista como
de exclusiva responsabilidade das IESs, fator que desobriga formalmente
o envolvimento das EEBs na formação daqueles que poderão
se tornar seus futuros profissionais. Além disso, o aumento da
demanda pelos cursos de licenciatura e o aumento das horas de estágio,
torna a supervisão de todos os estagiários pelos professores
das IESs comprometida, exigindo outras possibilidades de configuração
do estágio.
Ainda pensando nas situações atuais que se referem à
formação de professores, raros também são
os incentivos e apoios a ações de Formação
Continuada de Professores e ao desenvolvimento de projetos de inovação
pedagógica, curricular ou didática.
Também não temos forte tradição de ações
conjuntas Universidade-Escola na Formação de Professores.
Quando ocorrem, são relativas ao que se pode chamar de Formação
Continuada, mas que, pela dispersão das intenções
e pela descontinuidade no tempo, se tornam absolutamente ineficazes, Não
se estabilizam, muito menos se institucionalizam.
É neste cenário que atuaremos. De modo geral, queremos compreender
os condicionantes para uma forte interação entre Universidade
e Escola, a partir do estudo das práticas concretas existentes
nas EEBs, bem como dos discursos dos diversos atores nela envolvidos.
Com isso, pretendemos estabelecer parâmetros para a implementação
e o fortalecimento de uma articulação institucionalizada
entre as IESs e as EEBs no que concerne às ações
de Formação Inicial e às ações de Formação
Continuada de Professores.
Portanto, o nosso cenário de atuação profissional,
como docentes-pesquisadores em Educação, em Ensino e em
Formação de Professores, é o de uma legislação
avançada, em vários aspectos, no que se refere à
Formação de Professores para a Educação Básica
e, ao mesmo tempo, o de um sistema escolar ainda organizado para uma realidade
econômica, política e social de décadas atrás;
ou seja, para uma época em que as Agências Formadoras tinham
uma quantidade muito menor de alunos-professores em fase de estágio,
os quais se preparavam para atuar num ambiente de ensino altamente elitizado.
A relevância do trabalho proposto se justifica pela necessidade
de se criarem mecanismos de implementação e avaliação
da política educacional vigente, sobre Formação de
Professores, tendo em vista a quantidade de horas (400) previstas legalmente
para a realização do Estágio Curricular Supervisionado,
e o aumento crescente do número de licenciandos em situação
de estágio nas diversas IESs do país e a precária
infra-estrutura atual da maioria absoluta das EEBs para a recepção,
o acompanhamento e a avaliação destes estagiários.
Poucos são os registros na literatura nacional especializada da
área de Educação, dando conta da viabilidade destas
ações funcionando em escala. Nesse sentido, a importância
específica do trabalho fica garantida pelas contribuições
que pretendemos trazer para os Sistemas de Ensino (estaduais e municipais)
e para as Agências Formadoras (universidades, centros universitários
e faculdades isoladas) poderem repensar e planejar sua atuação
conjunta na Formação Inicial e Continuada de Professores.
Contudo, a formação inicial de professores vem cada vez
mais ocupando um papel de destaque em pesquisas e discussões educacionais,
como apontam os trabalhos de ALARCÃO (1996); PIMENTA (2000); SCHÖN
(2000), e este só vem a acrescentar ainda mais o entendimento no
que diz respeito a formação inicial de professores.
O projeto foi estruturado de modo a suportar uma pesquisa sobre a realidade
das Escolas Estaduais de Santa Maria/RS e de Florianópolis/SC,
mediante a qual, fosse possível compreender os condicionantes para
uma forte interação entre Universidade e Escola, a partir
do estudo das práticas concretas existentes nas EEB e dos discursos
dos diversos atores nelas envolvidos. Ao final, pretende-se estabelecer
parâmetros para a implementação e o fortalecimento
de uma articulação institucionalizada entre as IES e as
EEB no que concerne tanto às ações de Formação
Inicial, quanto às ações de Formação
Continuada de Professores.
OBJETIVOS:
Os principais objetivos para o desenvolvimento do projeto de pesquisa
COTESC são:
I. Diagnóstico da situação das escolas de Ensino
Médio de Santa Maria/RS e Florianópolis/SC, relativo a:
a) Concepções e práticas dos profissionais que nelas
trabalham sobre formas de colaboração entre Universidade
e Escola no processo de Formação de Professores;
b) Necessidades formativas de seus profissionais;
c) Concepções e práticas dos profissionais que nelas
trabalham sobre o Estágio Curricular na Formação
Inicial de professores;
d) Concepções e práticas dos profissionais que nelas
trabalham sobre processos de Formação Continuada de professores.
II. Estudo dos limites e das possibilidades para formação
e funcionamento de Grupos de Trabalho envolvendo:
a) Alunos-professores, estagiários em Formação Inicial;
b) Professores da Rede de Educação Básica, em serviço,
tutores destes estagiários;
c) Docentes da Universidade, supervisores destes estagiários; e
dedicados à produção de planejamentos escolares e
à reflexão sistemática sobre o desenvolvimento das
práticas docentes.
III. Estudo sobre a viabilidade da institucionalização
de formas permanentes de interação/parceria entre Agências
Formadoras (Universidades, Centros Universitários e Faculdades
Isoladas) e Escolas de Educação Básica, no que concerne
à Formação Inicial e à Formação
Continuada de professores, em particular para a atuação
dos professores em serviço como tutores locais dos Estágios
Curriculares em suas escolas.
Dessa forma, no presente trabalho pretendemos apontar
para alguns resultados referentes ao diagnóstico de concepções
e práticas dos profissionais que atuam em algumas escolas de Florianópolis/SC
sobre o estágio curricular na formação inicial de
professores.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
No intuito de abordarmos tal diagnóstico de uma
forma reflexiva, esta investigação será de natureza
preferencialmente qualitativa na qual estão previstas também
algumas análises quantitativas. Como instrumento para procedermos
ao diagnóstico utilizamos questionários semi-abertos, previamente
elaborado pela equipe COTESC. Estes questionários se apresentam
divididos em 5 partes distintas, onde a parte I refere-se à identificação
do professor, a II é referente à experiência profissional
do professor em escolas, a parte III consiste em questões sobre
o estágio curricular supervisionado realizado pelo professor durante
a graduação, a parte IV se refere às suas atividades
docentes e a última parte (V), consiste em questões direcionadas
aos professores que já tiveram estagiários em sua classe.
Em um primeiro momento do projeto, selecionamos algumas escolas de Florianópolis,
cujo critério de escolha foi o fato de tais instituições
já estarem compondo anteriormente o campo de estágios dos
alunos do curso de licenciatura em Ciências Biológicas da
UFSC. Após a seleção das escolas, alguns questionários
foram distribuídos aos professores de Biologia, sendo que de um
total de 29 (vinte e nove) questionários entregues em 8 (oito)
escolas de Florianópolis, obtivemos retorno de 16 (dezesseis) respondestes,
como mostra a tabela a seguir:
Escola |
N.
de questionários entregues |
N.
total de questionários recolhidos |
E01 EEB Getúlio Vargas |
03 |
03 |
E02 EEB Pe. Anchieta |
03 |
01 |
E03 EEB Simão José Hess |
03 |
03 |
E04 EEM Henrique Veras |
02 |
00 |
E05 EEM João Gonçalves Pinheiro |
02 |
01 |
E06 Instituto Estadual de Educação |
06 |
03 |
E07 CEFET- Centro Federal de Educação Tecnológica |
02 |
00 |
E08 Colégio de Aplicação-UFSC |
08 |
05 |
Total |
29 |
16 |
Tabela 1
– Número de questionários entregues e recolhidos até
junho de 2005
De posse dos questionários respondidos passamos a buscar elementos,
presentes nas respostas dos professores, que nos dessem os indícios
de suas concepções sobre o estágio curricular supervisionado
(ECS). Na intenção de realizarmos uma reflexão sobre
esse tema, procuramos proceder a análise fazendo uma relação
entre o modo como se deu o estágio curricular desses professores,
enquanto alunos de cursos de licenciatura, e o modo como concebem o estágio
atualmente tendo em vista agora seus papéis enquanto profissionais
que recebem estagiários em suas salas de aula. Para tanto, centramos
nosso olhar sobre as questões referentes aos blocos III e V do
referido questionário, transcritas abaixo:
III. QUESTÕES
SOBRE O SEU ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO
1. Tendo
em vista os conhecimentos adquiridos e as orientações recebidas
em seu Curso de Graduação, como você avaliou, na época,
sua preparação para realizar o Estágio Curricular
Supervisionado? Destaque aspectos positivos e negativos.
2. Como você
avalia a parceria entre a Universidade em que se graduou e a Escola em
que realizou o seu Estágio Curricular Supervisionado ?
3. Em que
medida o Estágio Curricular Supervisionado contribuiu e tem contribuído
para a sua atuação profissional como
V - QUESTÕES
A SEREM RESPONDIDAS SOMENTE PELOS PROFESSORES QUE JÁ TIVERAM ESTAGIÁRIO/A
EM SUA CLASSE
1. Que papel
você atribui ao ECS na formação de seu futuro colega
de trabalho/profissão?
2. Em sua opinião, para que a realização do ECS alcance
seus objetivos, o que o/a estagiário (a), ao iniciá-lo,
deveria: a) saber? b) saber fazer?
3. Que coisas você percebe que usualmente os/as estagiários
(as) não sabem e não sabem fazer ao iniciarem o ECS?
4. Durante a realização dos Estágios, quais as solicitações
mais freqüentes os estagiários (as) têm feito a você?
Como você tem encaminhado e resolvido tais solicitações?
5. Descreva brevemente como você costuma fazer o acompanhamento
dos (as) estagiários (as) durante a realização do
Estágio, quanto a: a)formas de acompanhamento, b)horários
c) freqüência de atendimento. Como a Escola apoia este trabalho?
6. Sua Escola costuma elaborar um planejamento para receber os(as) estagiários(as)
no início do ano letivo? Em caso afirmativo, quem participa desta
elaboração?
7. Que sugestões você daria para melhorar a realização
do Estágio na Escola em que leciona, em relação a(o):
a) recepção aos estagiários; b) acompanhamento das
atividades; c) infra-estrutura
ANÁLISE DOS RESULTADOS
Para melhor
entendimento dos resultados, analisaremos as respostas consideradas por
nós como aquelas mais relevantes para compreendermos o papel atribuído
por estes professores ao estágio curricular supervisionado.
Em relação às questões do bloco III, no que
se refere à realização de seu estágio curricular
alguns professores apontam que tiveram uma preparação adequada
por parte da instituição de ensino superior em que realizaram
seus cursos de formação inicial. No entanto, na maior parte
das respostas se faz presente relatos de falta de orientação
e de um maior acompanhamento por parte dos professores responsáveis
pelo estágio. Um dos principais problemas enfrentados na escola,
segundo a maior parte dos professores respondentes, foi a ausência
de articulação entre as disciplinas teóricas e a
prática de sala de aula. Também é relevante ressaltar
que alguns professores colocam que o estágio por eles vivenciado
teve uma curta duração, não permitindo um maior convívio
com a realidade escolar.
Outro ponto de destaque, presente nas respostas dos professores, diz respeito
à dificuldade em encarar a realidade escolar brasileira, onde a
preparação tida nas disciplinas de Licenciatura não
foi suficiente para enfrentar alguns tipos de situações
em sala de aula. Deste modo, muitos professores apontam que nesse primeiro
contato efetivo com a escola houve um desencanto inicial com a educação
e consequentemente com a profissão docente. Nesse ponto acreditamos
que os prejuízos causados pela não articulação
entre teoria e prática ficam evidentes, como pode ser destacado
na resposta de dois professores respondentes:
“Nosso
estágio não foi supervisionado, a profª mal nos acompanhou,
praticamente ‘andamos com as próprias pernas’. Esta
ausência, esta falta de apoio, na verdade, nos fortaleceu, nos fez
perceber que teríamos que fazer por nós e por aquela turma
enorme de mais ou menos 40 alunos, que nos olhavam curiosos, incrédulos,
e ao mesmo tempo, com afetividade...quando encarei pela 1ª vez uma
sala de aula...não consegui chegar ao final...pois não consegui
encarar a realidade das escolas públicas de E.M.” (professora
Ju)
“ Eu fui bem preparado por meio de razoável fundamentação
teórica e orientado a respeito de certos aspectos da realidade
do ensino no país. Porém, algumas situações,
como a falta quase total de preparo dos alunos em cada série e
a falta de interesse da direção escolar e do corpo docente
de várias escolas me surpreenderam negativamente.” (professor
Er)
No que se
refere à relação entre universidade e escola os professores
apontam, de modo geral, para a ausência de interação,
sendo que na maior parte das vezes o contato com a escola em que realizaram
seus estágios se deu diretamente entre o próprio aluno (estagiário)
com a direção ou mesmo com o professor que o recebeu para
estágio, ou seja, na maioria dos casos essa parceria foi mínima
e pontual, sem qualquer interação a mais entre as duas instituições.
Isso é mostrado em várias respostas dos professores, como
por exemplo:
“ Eu
penso que faltou empenho por parte tanto da escola quanto da universidade
para que fosse reforçada essa relação, isso gerou
certas dificuldades na condução do estágio.”
(professor Er)
Alguns professores
em reposta a esta articulação entre Universidade e Escola
destacaram que já exerciam a atividade docente durante a sua graduação,
fato que facilitou a realização do estágio curricular
supervisionado. Podemos perceber que mesmos nos casos em que os professores
relatam uma maior interação entre ele, enquanto estagiário,
e a Escola, não denota necessariamente uma parceria entre as duas
instituições de ensino, como pode ser observado na transcrição
abaixo:
“ A
parceria aconteceu porque eu conhecia a supervisão da escola, que
me possibilitou fazer o estágio, já que eu era professor
no mesmo estabelecimento. A UFSC pouco influenciou como parceria neste
caso.” (professor Lo)
Nas respostas
referentes à contribuição do estágio curricular
supervisionado para a sua atuação profissional, os professores
consideram este como um primeiro passo fundamental no processo de formação
profissional, bem como no próprio reconhecimento enquanto docente,
como mostra o trecho abaixo retirado de um dos questionários respondidos
por uma professora:
“Eu
acredito que o estágio supervisionado influenciou muito minha atuação,
no sentido de ter desenvolvido meu senso crítico em relação
a esta condição concreta (ou seja, longe da academia) e
no que tange à constante auto-avaliação, ao respeito
à condição discente e aos anseios e limitações
da condição docente.” (professora Ta)
Podemos perceber
na fala da professora um forte indício da necessidade da formação
docente abranger outros pontos que somente aqueles teóricos. Com
base nisso, podemos supor que a formação de um profissional
atuante na área de educação requer uma interação
muito maior com o dia-a-dia da comunidade escolar, muitos outros saberes,
que não apenas os teóricos, são necessários
para uma atuação docente adequada. No entanto, em algumas
respostas é indicado que o papel do estágio em sua formação
inicial foi meramente burocrático, servindo apenas para o cumprimento
de requisitos acadêmicos.
Partindo para a análise das questões do bloco V do questionário,
correspondentes a recepção de estagiários em suas
turmas, evidenciamos que metade do total de professores respondentes nunca
teve estagiários em sua classe. Dos professores que responderam
a esta parte do questionário, quando perguntados sobre as dificuldades
enfrentadas pelos estagiários recebidos nas escolas, a maior parte
dos professores aponta que um dos maiores problemas é a falta de
articulação entre teoria e prática e, aliado à
isso, a dificuldade em estabelecer um nível de aprofundamento adequado
para trabalhar os conteúdos de Biologia com os alunos. É
interessante notar que esse mesmo ponto: a falta de articulação
teoria e prática foi apontado como uma das principais dificuldades
enfrentadas pelos professores respondentes quando da realização
de seus próprios estágios curriculares. Podemos perceber,
que a esta dicotomia está presente em diversos contextos de formação
de professores (atuais ou não). Além disso, alguns professores
indicaram a dificuldade dos estagiários com relação
ao modo de interagir com a turma e como se portar à frente de uma
sala de aula numerosa.
No que diz respeito à coisas que os estagiários deveriam
saber e saber fazer é indicado em várias respostas que além
do domínio conceitual, é importante saber estruturar aulas,
traçar objetivos tendo em vista a questão do tempo, ou seja,
saber elaborar um planejamento de ensino adequado à turma com que
está trabalhando e além disso, ter condições
de implementar tal planejamento de forma coerente, o que pode ser verificado
nos trechos abaixo:
“...Em
geral, eles têm grande dificuldades em separar seu papel enquanto
aluno daquele que ele assume quando da regência de classe. Por conta
disso, outras situações tornam o estágio um momento
de “tensão”, entre o que o estagiário julga
saber (conteúdos e conceitos, o próprio relacionamento com
a turma e as técnicas de ensino) e aquilo que ele realmente acaba
executando em sua intervenção e nas interações
que ocorrem em aula.” (professor Lu)
“ Além
do domínio dos conceitos/conteúdos e organização
da aula, possuir uma didática adequada à comunidade escola
que vai estagiar e uma postura motivante.” (professor Da)
Quando questionados
sobre a forma de acompanhamento dada aos estagiários, os professores
indicaram que freqüentemente há discussões sobre planejamentos
de ensino, além disso, procuram promover uma maior interação
do estagiário com a escola e também com os discentes. No
entanto, poucos professores relatam a realização de acompanhamentos
de todas as aulas ministradas pelos estagiários. Pudemos verificar
também que o acompanhamento de estagiários fica prejudicado
pelo pouco tempo disponível por parte dos professores para a realização
de atividades extra-classe. Assim, podemos perceber a relação
professor/estagiário como algo que, muitas vezes, ocorre de forma
pouco efetiva, sem que haja realmente uma parceria entre ambos. Relacionado
a isso está a quase ausência nas escolas de uma organização
prévia para receber estagiários, tornando essa fase tão
importante do processo de formação profissional docente
algo desligado da realidade. Tendo em vista os problemas apontados, alguns
professores indicam como uma sugestão para melhoria do estágio
que a Escola assuma o estagiário como um professor de fato, vendo
o estágio como um processo importante na formação
dos futuros professores, como mostra o trecho a seguir:
” ...Os
estagiários precisam se sentir parte integrante da escola, co-responsáveis
pelo sucesso da classe; para isto, precisam conhecer a escola, seus membros,
seus objetivos e propostas. Participar da organização escolar,
como dimensão integrante do seu estágio pode ajudar a desenvolver
este aspecto...” (professor Lu)
No entanto,
na maior parte das respostas, não há referência a
sugestões para melhoria do estágio, e quando presente, poucos
professores especificaram o modo como poderia se promover essa melhoria.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Por meio
das respostas dos professores aos questionários, pudemos perceber
que alguns problemas apontados por eles como um fator que dificultou o
andamento de seus estágios quando alunos, também são
indicados como estando presentes nas práticas de estágios
dos alunos que recebem atualmente em suas salas de aula. Nesse sentido,
um dos principais pontos diz respeito à dicotomia teoria e prática.
Como mostramos em nossos resultados, muitas vezes, essa relação
fica comprometida no contexto escolar. Talvez um dos fatores que mais
contribua para esse distanciamento seja a falta de uma relação
mais estreita entre a universidade, local onde os saberes são construídos
teoricamente e escola, local de atuação do profissional
docente, o que impede um maior conhecimento do ambiente escolar e consequentemente
uma atuação mais adequada, mais ligada à realidade
por parte do estagiário. Dessa forma, acreditamos que possibilitar
uma maior integração entre essas duas instituições
de ensino, possa contribuir para que o estágio curricular não
seja apenas o cumprimento de uma disciplina obrigatória, parte
dos requisitos para obtenção do título de licenciado,
mas que venha efetivamente a se constituir como um primeiro passo para
a prática docente.
Tendo em vista essas considerações, por meio do questionário,
pudemos perceber que os professores apresentam posturas diferenciadas
frente ao estágio curricular supervisionado. Enquanto alguns demonstram
uma preocupação mais evidente, outros o consideram de pouca
relevância, considerando o processo de formação docente
como algo que se constrói ao longo da própria prática
profissional e, portanto, o estagiário não é visto
como um profissional em formação. A necessidade de mudança
de concepções com relação ao papel do estágio
na formação docente, bem como do próprio estagiário
e sua relação com a escola, apontado anteriormente nos resultados
de nosso estudo, está presente em diversas respostas dadas pelos
professores.
Assim, como uma perspectiva de continuidade do presente estudo, tendo
em vista os questionários respondidos e os objetivos propostos
do projeto de pesquisa no qual se insere o este trabalho (COTESC), consideramos
ser possível a seleção de alguns professores na intenção
de uma perspectiva de atuação que considere uma relação
de parceria estagiário/professor, em um modelo de tutoria. Como
é apontado por CERRI et al. (2003):
“Será
necessário o envolvimento coletivo entre as partes- as instituições
formadoras e a escola básica- a fim de que ambas, reflitam e executem
uma estrutura organizacional adequada, conforme as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Formação de Professores e as resoluções
que a normatizaram em que apontam que sob a supervisão de um profissional
experiente (...) Esse profissional experiente pode se caracterizar na
figura de um tutor...” (p.03)
Nesse sentido,
esperamos com esse levantamento inicial diagnosticar professores que poderiam
estar atuando de forma integrada no âmbito do projeto em que esse
trabalho se insere, na figura de um professor tutor, na busca por um trabalho
que vise uma parceria entre os profissionais que já atuam nas escolas
e os profissionais envolvidos no processo de formação de
professores.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
ALARCÃO,
I. Formação reflexiva de professores: estratégias
de supervisão. Portugal: Porto Editora. 1996.
CERRI, Y. et al. Contribuição à formação
inicial de professores de ciências: o modelo de tutoria. In: Atas
Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências,
Bauru/BRA. 2003.
PIMENTA, Selma Garrido: O estágio na formação de
professores: unidade teoria e prática?. São Paulo/BRA: Cortez.
2000.
SCHÖN , Donald. A. Educando o profissional reflexivo: um novo design
para o ensino e a aprendizagem. Porto Alegre/BRA: Artemed. 2000.
TERRAZZAN, E. A. et al. Concepções práticas presentes
em escolas de ensino médio sobre aspectos envolvidos na formação
de profesores. In: Atas do VI Escola de Verão Para Professores
de Prática de Ensino de Biologia, Física e Química,
Rio de Janeiro/BRA. 2003. |
|