Fabíola Parrillo Sardi - ISEU – Instituto
Superior de Educação Uirapuru
Juliana El Hadi - ISEU – Instituto Superior de Educação
Uirapuru
.
Que coisa é o livro? Que contém na sua frágil arquitetura
aparente?
São palavras, apenas, ou é a nua exposição
de uma alma confidente?
De que lenho brotou? Que nobre instinto da prensa fez surgir esta obra
de arte que vive junto a nós, sente o que sinto e vai clareando
o mundo a toda parte?
(Carlos Drummond de Andrade)
As primeiras obras publicadas visando ao público
infantil apareceram no mercado ás vésperas do século
XVIII, quando em 1697, Charles Perrault publicou os célebres Contos
da mamãe gansa. As fábulas de La Fontaine do século
XVII e de Fénelon de 1917 também foram englobadas como histórias
infantis. A expansão da Literatura Infantil européia deu-se
simultaneamente na Inglaterra, país que de potência comercial
e marítima salta para a industrialização, processo
que mais assinalou e caracterizou o século XVIII. Numa sociedade
que cresce por meio da industrialização e se moderniza em
decorrência dos novos recursos tecnológicos disponíveis,
a Literatura Infantil assume, desde o começo a condição
de mercadoria.No século XVIII, aperfeiçoa-se a tipografia
e expande-se a produção de livros.
A partir do momento em que as crianças precisam da leitura, a escola
e a literatura passam a ter relações entre si as quais colocam
a literatura como intermediária entre a criança e a sociedade
de consumo, e de outro lado como subsídio da ação
escolar, a quem cabe promover e estimular condições de viabilizar
sua própria circulação. Desse modo, adota, em alguns
momentos, posturas visivelmente pedagógicas, a fim de se tornar
patente sua utilidade.
Nessa época os livros deixavam transparecer o modo como o adulto
quer que a criança veja o mundo. Transmite um projeto para a realidade
histórica, dando vazão á representação
de um ambiente perfeito e distante.Eram também impregnados de valores
morais que a sociedade da época tentava impor.
A Literatura Infantil no Brasil inicia-se com a implantação
da Imprensa Régia em 1808, que começa a publicar livros
para a criança como a tradução de As aventuras pasmosas
do Barão de Munkausem e a coleção de José
Saturnino da Costa Pereira, Leitura para meninos, contendo uma coleção
de histórias morais relativas aos defeitos ordinários as
idades tenras, e um diálogo sobre geografia, cronologia, história
de Portugal e história natural, no entanto estas obras eram insuficientes
para caracterizar uma produção literária brasileira
regular para a infância.
Com a urbanização que se deu no fim do século XIX,
se tornara propício o aparecimento da Literatura Infantil Brasileira.
Em 1905, surgia a publicação da revista infantil O Tico-Tico.
O sucesso de seu lançamento e a permanência no cenário
editorial insere o Brasil na chamada indústria cultural. É
nessa mesma época que se abre espaço, nas letras brasileiras,
para um tipo de produção didática e literária
dirigida em particular ao público infantil.
No início do século XX, a Literatura Infantil passa a deter
no novo modelo social que começa a se impor. Assim também
as campanhas pela instituição, pela instrução,
pela alfabetização e pela escola davam retaguarda e prestígio
aos esforços de dotar o Brasil de uma Literatura Infantil nacional.
Com a valorização da instrução e da escola,
surge a preocupação generalizada com a carência de
material adequado e leitura para crianças brasileiras. Diante a
essa preocupação, intelectuais, jornalistas e professores
começaram a produzir livros infantis para as escolas.
Em 1921, Monteiro Lobato publica Narizinho Arrebitado (segundo livro de
leitura para o uso nas escolas primárias), numa linguagem que despertava
o interesse das crianças.A partir de então, Lobato passa
a investir progressivamente na literatura para as crianças. Através
de personagens como Dona Benta, Tia Anastácia, Pedrinho, Narizinho
e Emília, Monteiro Lobato retratou a sociedade brasileira da época,
manifestando preocupações com as questões nacionais.
No mesmo segmento Saudade de Tales de Andrade foi sucesso de vendas e
adotado nas escolas públicas do Estado de São Paulo.
O crescimento da produção literária para crianças
e a atração que ela começa a exercer sobre os escritores
demonstram que o mercado estava sendo favorável aos livros. Entre
1920 e 1945, o número de obras infantis duplicara, assim como o
volume das edições. Surgem novos escritores: José
Lins do Rego, Luís jardim, Lúcio Cardoso, Graciliano Ramos,
Cecília Meireles com seus livros didáticos, Murilo Araújo
e muitos outros.
A partir dos anos 70/80 a literatura Infantil começa a ser discutida
nas propostas e reformas educacionais. Com a modernização
e os avanços tecnológicos surge uma nova preocupação:
haverá lugar para a Literatura Infantil? Entre aqueles que acreditam
que sim, Coelho diz:
“A literatura, em especial a infantil, tem uma tarefa fundamental
a cumprir nesta sociedade em transformação: servir como
agente de formação, seja no espontâneo convívio
leitor/livro, seja no diálogo leitor/texto estimulado pela escola
[...]. É no sentido dessa transformação necessária
e essencial (cujo processo começou no início do século
XX e agora chega sem dúvida, às etapas finais e decisivas)
que vemos na literatura infantil o agente ideal para a formação
da nova mentalidade que se faz urgente”.
Defendendo a Literatura Infantil como agente formador
de uma nova mentalidade, o professor precisa estar atualizado e reorganizar
seu próprio conhecimento.Segundo Abramovich (1991 p. 17): “È
uma possibilidade de descobrir o mundo imenso dos conflitos, dos impasses,
das soluções que todos vivemos e atravessamos”.Nesse
sentido, ouvir ou ler histórias inicia a criança no processo
de construção da linguagem, idéias, valores e sentimentos
aos quais ajudarão a criança na sua formação
cultural como pessoa e cidadão.
Literatura é arte e como tal, as relações de aprendizagem
e vivência que se estabelecem entre ela e o indivíduo são
fundamentais para que este alcance a sua formação integral
em harmonia dinâmica (Coelho, 2000). A Literatura como instrumento
de formação do ser está diretamente ligada a uma
das atividades básicas do indivíduo em sociedade: a leitura.Se
desejarmos que as crianças desenvolvam o gosto pela leitura, é
essencial que esse estímulo seja carregado de intencionalidade,
habituar-se a ler próximo à criança, fazendo com
que ela perceba o quanto é interessante ler. Qualquer livro que
esteja lendo, ou mesmo um jornal pode servir para compartilhar com a criança
esse momento, e leva-la a descobrir o sentido das palavras.Conversar sobre
escritores, fazer com que as crianças descubram admiração
por eles e prometa para o dia seguinte um verso, uma mensagem ou uma personagem
da literatura. Toda criança amparada por pais e professores que
amam a leitura e fazem desse amor uma declaração consistente,
acaba amando a leitura também e, assim, descobre o gosto pelas
palavras impressas, o segredo que cada frase escrita ousa revelar.
O livro é um instrumento ideal no processo educativo. Podemos observar
que não há meio de comunicação em massa que
não contenha um texto, no qual só as palavras possam expressar.
Daí, a importância da formação do pequeno leitor,
mesmo antes de ser iniciado o processo de alfabetização,
e que este prossiga gradativamente em seus estudos.
Leituras em casa são determinantes no sucesso escolar de muitas
crianças. Na família, esses momentos costumam ser de intimidade
entre o adulto e a criança, em que ela tem amplo acesso ao conteúdo
do livro ao mesmo tempo em que escuta a leitura do adulto.Sobre esse ponto,
observa Silva (1994 p. 12): “... é tão importante
o papel de quem convive com a criança, pois é, sobretudo,
através do afeto que a criança se desenvolve e aprende”.
Momentos como esse devem passar por algumas adaptações para
ser vivenciado no contexto escolar. Com o número de alunos em sala
de aula, a professora deverá encontrar a posição
mais adequada para que todas as crianças tenham acesso visual ao
livro que está sendo lido, sobretudo, as gravuras que inicialmente
exercem maior atração às crianças. “Se
a literatura infantil se destina a crianças e se acredita na qualidade
dos desenhos como elemento a mais para reforçar a história
e a atração que o livro pode exercer sobre os pequenos leitores
fica patente a importância da ilustração nas obras
a eles dirigidas”.( Zilberman e Lajolo, 2002) Só aos poucos,
o conteúdo da história vai se tornando mais saliente para
elas.A professora tem que ler de forma literal, porém clara e agradável,
e que a leitura capte o mais possível da atenção
das crianças. É muito importante que surjam perguntas e
comentários em relação ao que está sendo lido,
para que a leitura não se transforme num ritual didático
alheio aos verdadeiros interesses das crianças.
Observando-se o comportamento da criança, fica evidente a sua capacidade
de inventar histórias, por isso a necessidade do professor em assumir
o compromisso com o livro em sala de aula e ter o hábito de contar
histórias, despertando a curiosidade pelos signos da escrita, encorajando-as,
solicitando-as e provocando situações para que elas criem
suas hipótese, abrindo as portas para o universo da leitura. Rego
(1988, p. 60), diz que: “... um contato diário com atividades
de leitura e da escrita, a alfabetização será transformada
num processo ameno e descontraído, evitando-se as atuais rupturas
existentes na prática pedagógica entre a preparação
para a alfabetização e a alfabetização propriamente
dita”.
Para que a Literatura Infantil seja um instrumento importante de auxílio
no processo de alfabetização, devemos nos preocupar com
a qualidade da história que estamos lendo. A escolha do livro deve
nortear-se por alguns princípios que garantam a eficácia
do trabalho pedagógico, tais como:
- A qualidade de criação, a estruturação da
narrativa e a sua adequação as convenções
do Português escrito;
- O interesse que o livro desperta na criança, observando o nível
de complexidade do texto (textos curtos e acessíveis).
Podemos diferenciar um texto literário de um texto comum pelas
diversas reações que ele provoca no leitor, que vão
do prazer emocional ao intelectual. Além de simplesmente fornecer
informações sobre diferentes temas – históricos,
sociais, existenciais e éticos, por exemplo -, eles também
fazem com que o leitor adquira conhecimentos variados, viva situações
existenciais, entre em contato com novas idéias, etc. Os textos
literários são polissêmicos e se diferenciam por conterem
personagens, narrador, espaço-tempo, gênero e a relação
que estes elementos desenvolvem entre si no desenrolar da história.
Em sala de aula, é necessário que o professor conheça
razoavelmente bem tais instâncias do discurso literário,
podendo perceber as sutilezas e as muitas maneiras de ler um livro, atendendo
sempre às expectativas e competências dos pequenos leitores.Dessa
forma tornará a leitura mais rica e prazerosa.
É muito importante que a leitura se transforme numa atividade diária
na sala de aula. As crianças de pré-escola costumam ter
livros preferidos que podem ser lidos freqüentemente. Elas desenvolvem
o prazer em reconhecer a história lida, aprendê-la em detalhes,
cobrar a mesma seqüência e antecipar as emoções
que teve da primeira vez que leu.Isso evidencia que a criança que
escuta muitas histórias pode construir um saber sobre a linguagem
escrita, levando em conta algumas pistas contidas no texto, podem localizar
uma palavra ou um trecho que até o momento não sabem como
escreve convencionalmente.
Para que a criança se torne alguém efetivamente que leia
e escreva, faz-se necessário um conhecimento específico
do código alfabético. Muitos estudos demonstram que para
entender as escritas alfabéticas é necessário a criança
atingir uma descoberta essencial em relação ao sistema de
escrita, isto é, que as letras estão relacionadas às
palavras enquanto uma seqüência de sons. Nesse momento, as
crianças também passam por evoluções conceituais
importantes para as quais a leitura e a escrita são fundamentais.
É importante que, nas classes pré-escolares se inicie um
trabalho de incentivo à escrita de palavras que poderá começar
com letras móveis ou abecedários, privilegiando os caracteres
de imprensa, por serem estes mais fáceis para as crianças.
Para um estímulo mais direto, um trabalho com as semelhanças
de sons entra as palavras poderá ser iniciado desde cedo. Jogos
e leituras que envolvam rimas como poesias e histórias rimadas
poderão servir de base à escrita de palavras contendo semelhanças
de sons, como, por exemplo, rato-pato-gato. Para realizar esse trabalho
podemos escolher palavras usadas nos textos lidos em sala de aula e as
crianças poderão participar dessa escolha.
Ao criarem seus textos, as crianças estarão acostumadas
às formas de linguagem lida nos livros, tornando corretas as concordâncias,
o uso dos pronomes oblíquos e expressões. As idéias
são bem elaboradas e influenciadas pelos personagens e pelos fatos
que caracterizam a literatura infantil. A criança torna-se escritora
na medida em que as características literárias e lingüísticas
do texto são de sua autoria. Quando são motivadas para a
produção de textos, muitas crianças aprendem novos
padrões silábicos e expandem suas possibilidades de escrita.
Compreendendo que, na escrita as letras combinadas representam sons da
fala, e que estas escritas obedecem a regras convencionais, a criança
atingiu a hipótese alfabética, isto é, alfabetizou-se.
Compreendeu para que serve, qual o modo de construção e
como funciona a nossa escrita.
Ao dominarem os mecanismos de leitura, elas próprias buscarão
a leitura de novos livros.Porém, a leitura de livros na escola
não pode ser proposta como tarefa e imposta ao aluno. O aluno tem
que desenvolver o prazer e o interesse pela leitura e o professor ser
o facilitador desse processo.
São inúmeras as atividades que podem ser desenvolvidas para
despertar no aluno o interesse pela leitura; alguns exemplos; levar os
alunos à biblioteca escolar ou à biblioteca pública
e livrarias promovendo uma aproximação entre alunos e livros;
reservar um momento diário ou semanal de leitura livre na sala
de aula; promover a leitura coletiva de uma obra seguida de comentários
e previsões sobre a continuidade da história; solicitar
ao aluno que apresente o livro lido aos seus colegas, expondo sua opinião,
sua avaliação, a recomendação, ou não,
de sua leitura, sugerir a dramatização da história.
São infinitas as possibilidades de incentivo à leitura,
o fundamental é que seja um procedimento adequado de leitura de
livros e que levem o aluno a descobrir a leitura como prazer.
“O menino Pedro Henrique tinha medo de dragão e muitos outros.
Um dia, visita a caverna onde está seu dragão imaginário
e conversa com ele”.
A partir daí Pedro Henrique vai cada vez melhor conhecendo os medos.
E aprendendo a distinguir entre o medo "bom", que faz a pessoa
se proteger, e o medo "mau" que não serve para nada e
provoca pesadelos.”
(Trecho do livro Dragão de Menino – Pedro Pessoa)
Os professores possuem um acervo muito grande e rico de
livros infantis que podem ser trabalhados em sala de aula.As sugestões
dos livros a seguir foram baseadas nas características dos livros
infantis e a sua adequação às fases do leitor.
Pré-leitor (1ª fase): Esta é a fase da descoberta do
mundo. As crianças têm entre 2 e 3 anos. Começam a
estabelecer relações de identidade entre a situação
representada no livro pelas imagens e o mundo concreto.
São indicados livros de imagens que despertem o interesse pelo
visual e livros-objetos, como os de plástico e pano que estimulam
os sentidos de percepção da criança. “É
o prazer abrindo caminho para o conhecer”.(Coelho, 2000).
Livros sugeridos: Amendoim (Eva Furnari), Todo dia (Eva Furnari), Nem
aqui, Nem ali.
( Mary França e Eliardo França);
Pré-leitor (2ª Fase): Livros de imagem, sem textos ou com
textos breves, centrados em uma situação sugestiva e atraente
para o olhar e a mente infantis.
Livros sugeridos: A Bota do Bode (Mary França e Eliardo França),
De vez em quando (Eva Furnari), Sapato novo (Mary França e Eliardo
França);
Leitor iniciante: Início da aprendizagem da leitura.Textos breves
que interagem com os desenhos e de fácil compreensão.
Livros sugeridos: Lúcia-já-vou-indo (Maria Heloísa
Penteado), Assim Assado (Eva Furnari), De ponta cabeça (Lúcia
Pimentel Góes), O tubo de cola (Flávia Muniz);
Leitor em processo: Os textos tornam-se mais complexos, misturando temas
do dia-a-dia com problemas subjetivos. Há humor e emotividade.
As ilustrações são mais raras tornando-se cada vez
mais simbólicas.
Livros sugeridos: Nossa rua tem um problema (Ricardo Azevedo), Sem pé
nem cabeça (Pedro Bandeira), A onça e o Saci (Pedro bandeira).
Bibliofrafia:
LAJOLO, Marisa & ZILBERMAN, Regina. Literatura infantil
brasileira. História & História. São Paulo: Ática,
2002.
REGO, Lúcia Lins Brown.Literatura Infantil. Uma nova perspectiva
da alfabetização na Pré-escola. São Paulo:
FTD, 1998.
ZILBERMAN, Regina. A Literatura Infantil na Escola. 7 ed. São Paulo:
Global, 1987.
Bibliografia de Literatura Infantil
Obras citadas
AZEVEDO, Ricardo Nossa rua tem um problema. São Paulo: Ática,
1999.
BANDEIRA, Pedro. Sem pé nem cabeça.São Paulo: Moderna,
1999.
__________. A onça e o Saci. – 2. Ed. – São
Paulo: Moderna, 2003.
FRANÇA, Mary & ELIARDO. Nem aqui nem ali.São Paulo:
Ática, 1994.
__________. Sapato novo.São Paulo: Ática, 2000.
__________. A bota do bode.São Paulo: Ática, 2000.
FURNARI, Eva. Assim assado. São Paulo: Moderna, 1991.
__________. De vez em quando.
__________. Amendoim.São Paulo: Paulinas, 1987.
¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬__________. Todo dia.
GÓES, Lúcia Pimentel. De ponta cabeça.
MUNIZ, Flávia.O tubo de cola.São Paulo: Mode rna, 2000.
PENTEADO, Maria Heloísa.Lúcia-já-vou-indo. São
Paulo: Ática, 1987.