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OS
OBJETIVOS PARA A LEITURA DE TEXTOS NO LIVRO DIDÁTICO
Marilúcia dos Santos Domingos Striquer
(PG-UEM)
Renilson José Menegassi (UEM)
Considerações iniciais
Uma das principais atividades da instituição
escolar no processo de ensino é a formação de leitores
competentes, como define os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL,
1997), e nela o livro didático ocupa papel relevante, por se tratar
do instrumento mais utilizado dentro da sala de aula, assim, abordamos
neste artigo como o livro didático Linguagem: criação
e interação - 5ª série participa da formação
do leitor competente no sentido de motivar o leitor-aluno a ler.
Ao falarmos em motivação, consideramos que são diversas
e diferentes atitudes e procedimentos que podem levar o leitor-aluno a
sentir-se motivado a ler, dessa forma, priorizamos apenas um aspecto motivador
por considerá-lo fundamental e indispensável: ter objetivos
para a leitura. O intento deste artigo, então, é analisar
se o livro didático oferece objetivos para as leituras do leitor-aluno,
ou seja, se proporciona que o leitor-aluno tenha objetivos para ler os
textos ali apresentados e se orienta o professor a ensinar o leitor-aluno
a ter objetivos para suas leituras.
Na escolha do livro didático como objeto de análise, estamos
cientes que o assunto é abrangente e muitas são as discussões
e opiniões a respeito. Martins (1982) define o livro didático
como “manual de ignorância” que mais inibe do que estimula
o gosto de ler; Britto (1998) conceitua o livro didático como o
padronizador das falas e comportamentos do professor, considerando sempre
a sala de aula como homogênea. No entanto, mesmo com tantas críticas,
não vemos, baseados na nossa própria experiência em
sala de aula, como contextualizar o sistema de ensino hoje sem a adoção
do livro didático, pois, entre muitos outros fatores, entre eles
o contexto social, econômico e cultural brasileiro, é na
escola que uma grande parte das crianças tem a oportunidade de
estar em contato com os livros. Dessa maneira, a sua presença (adoção)
passa a ser indispensável. O livro didático já é
visto como parte integrante do sistema escolar. Segundo Molina (1987:13)
“o livro didático é um elemento tão presente
na sala de aula quanto o próprio professor”. Enfim, nessa
presença tão marcada, é importante saber como o ele
pode motivar o leitor-aluno a ler, ou seja, se determina objetivos para
a leitura.
Para tanto, inicialmente, apresentamos as teorias sobre a importância
de se ter objetivos para a leitura; após apresentamos algumas características
de um leitor competente e seus procedimentos; em seguida analisamos o
livro didático: Linguagem: criação e interação
- 5ª série, Manual do professor, coleção empregada
na região Norte do Paraná. E, por fim, apresentamos algumas
considerações conclusivas sobre se esse livro didático
participa da formação do leitor competente, no sentido de
motivar o leitor-aluno a ler, oferecendo-lhe objetivos para suas leituras
e orientando o professor a ensinar o leitor-aluno a ter objetivos.
1. Motivação para ler: ter objetivos
Oferecer ao leitor-aluno um objetivo para que ele leia um texto é
uma motivação no sentido de proporcionar que ele saiba por
que está lendo, permitindo que a leitura não ocorra apenas
pela institucionalização da obrigação de ler
na escola, mas sim, que ela tenha sentido para a vida do leitor-aluno
como um todo. Esse porque ler relaciona-se profundamente em informar o
leitor-aluno o que aquela leitura, aquele determinado gênero de
texto poderá proporcionar-lhe como participante da sociedade em
geral, contribuindo para que possa reconhecer suas preferências
ou necessidades de leitura e principalmente formar um leitor competente,
ou seja, como conceitua os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997:
54), “é alguém que, por iniciativa própria,
é capaz de selecionar, dentre os trechos que circulam socialmente,
aqueles que podem atender a uma necessidade sua”.
Podemos dizer que alcançar essa habilidade de seleção
só ocorre quando o leitor tem objetivos para suas leituras, porque,
conforme Kleiman (1989), com objetivos ele pode concentrar-se mais especificamente
no que lhe interessa ou necessita saber, facilitando a seleção
de um texto, e também a seleção no texto, ou seja,
desprezando ou se apegando a detalhes, exemplificações e
explicações que um texto pode oferecer.
Porém, não podemos falar em um único e estático
objetivo para a leitura. O objetivo é algo amplo e variado, conforme
ensina Solé (1998: 22), nele estão inseridas várias
possibilidades:
Devanear, preencher um momento de lazer e desfrutar; procurar
uma informação concreta; seguir uma pauta ou instruções
para realizar uma determinada atividade (cozinhar, conhecer as regras
de um jogo); informar-se sobre um determinado fato (ler o jornal, ler
um livro de consulta sobre a Revolução Francesa); confirmar
ou refutar um conhecimento prévio; aplicar a informação
obtida com a leitura de texto na realização de um trabalho,
etc.
Essa amplitude e variação de objetivos ficam
mais evidentes quando lembramos que a leitura de um texto pode ter múltiplas
interpretações, e que isso pode ocorrer, entre outros tantos
fatores, pelos diferentes objetivos dos seus leitores. Há evidências
experimentais (KLEIMAN, 1989) que mostram com clareza que leitores com
objetivos diferentes extraem informações distintas do mesmo
texto. Sobre isto, Geraldi (1984,1991) propõe quatro objetivos,
ou conforme ele mesmo define, quatro “para quês” lemos
um texto: a) “Leitura-busca-de-informações”:
lemos um texto porque queremos aprender algo mais sobre determinado assunto,
e/ou para rever nossos conceitos sobre o assunto, e/ou para conhecer novos
e diferentes conceitos sobre o assunto que já temos opinião
formada; b) “Leitura-estudo-do-texto”: lemos um texto para
saber mais a respeito de algo, para juntar novos conhecimentos ao que
já possuímos; c) “leitura-pretexto”: o que pretendemos
é utilizar o conteúdo ou modelo de estrutura do texto para
produzirmos um novo texto; d) “leitura-fruição”:
vamos ao texto para nos distrairmos, para viajarmos em nossas fantasias,
sem compromisso de assimilações. É evidente que Geraldi
não determina os quatro tipos apresentados como únicos e
nem como modelos a serem seguidos e apresentados na forma de conteúdo
de ensino, como ele mesmo define, contudo, salientamos que o objetivo
deve estar presente em todos as leituras realizadas por um leitor.
Solé (1998) também aborda alguns objetivos para a leitura,
os quais parecem-nos mais abrangente: a) “Ler para obter uma informação
precisa”: lemos um texto para localizar uma informação
que nos interessa, é lermos seletivamente podendo desprezar algumas
informações que não se referem ao que realmente interessa.
Exemplo: buscar um número de telefone na lista telefônica;
b) “Ler para seguir instruções”: lemos para
saber como fazer ou agir, assim nessa leitura a compreensão do
texto todo é indispensável, não é possível
desprezar nenhuma informação, pois essa leitura é
funcional. Exemplo: buscar orientações para participação
em um congresso; c) “Ler para obter uma informação
de caráter geral”: lemos um texto para saber do que se trata,
e caso nos interesse o assunto, continuaremos a ler o texto ou não.
Exemplo: a leitura das manchetes de um jornal ou a leitura de um sumário
de livro, o que permite então irmos ou não a leitura da
matéria ou artigo completo; d) “Ler para aprender”:
lemos com a finalidade de ampliar ou adquirir conhecimentos sobre um assunto.
É estudar o texto para aprender sobre um assunto. Nessa leitura
é importante que o leitor saiba o que ele deve aprender; e) “Ler
para revisar um escrito próprio”: é o autor ler o
que escreveu para revisão de conceitos. É uma leitura de
controle e aferição; f) “Ler por prazer”: a
leitura é uma questão pessoal, lemos um texto porque gostamos
de ler, porque gostamos daquele determinado tipo de texto, porque a leitura
nos traz prazer. Exemplo: leitura de um romance, poema, entre outros;
g) “Ler para comunicar um texto a um auditório”: lemos
com o objetivo de transmitir a informação do texto a outras
pessoas. Exemplo: ler um discurso; h) “Ler para praticar a leitura
em voz alta”: lemos para aprender normas e entonação
de voz em sinais de pontuação, ser rápido, claro,
fluente. i) “Ler para verificar o que se compreendeu”: lemos
para ser aferido sobre a compreensão da leitura. Este tipo de objetivo
é bem comum e constante na instituição escolar, onde
o aluno lê para que o professor possa averiguar se ele compreendeu
o texto lido.
Cabe notar que, muitas vezes, os objetivos se relacionam a gêneros
textuais. Segundo Kleiman (1989), o gênero de um texto acaba por
determinar certos objetivos para o leitor. Mas não que esses objetivos
possam ser definitivamente determinados.
Posto aqui alguns objetivos, é importante colocar que é
papel da instituição escolar ensiná-los ao leitor-aluno
em seu processo de aprendizagem da leitura, como afirma Solé (1998:
18): “nas sociedades ocidentais, a aprendizagem da leitura é
encomendada à instrução formal e institucionalizada,
oferecida pela escola”. Assim, compreendendo que a leitura é
algo a ser ensinado na escola, os objetivos conseqüentemente também
devem ser ensinados, pois independente de qual seja o objetivo para uma
leitura, ele sempre deve existir conscientemente para o leitor-aluno,
para que a interpretação do texto aconteça, pois
sem um objetivo o leitor pode não chegar à interpretação
de um texto (MENEGASSI, 1995).
Ensinar o aluno-leitor a ter objetivos em suas leituras é trabalhar
para que ele seja um leitor na vida como um todo, leitor dentro e fora
da instituição escolar e, em ambos os lugares, saiba “para
quê” está lendo. Nas palavras de Geraldi (1991), é
fazer com que ele leia na escola e não para a escola.
Ter objetivo relaciona-se também em saber quais procedimentos,
ou como denomina Solé (1998), quais estratégias devem ser
utilizadas na leitura a fim de alcançar o objetivo proposto. Segundo
Kato (1990), um leitor deve utilizar procedimento metacognitivo, ou seja,
um leitor deve ter controle sobre o seu próprio conhecimento. Isso
quer dizer que, conforme os objetivos que um leitor determinou para a
leitura de um texto, não só determinam a escolha dos procedimentos
a serem utilizados, mas também estabelecem o controle que ele vai
exercendo sobre sua leitura. Ao final o leitor pode, ou até mesmo
durante a leitura, perceber que o objetivo determinado não será
alcançado, escolhendo novos procedimentos. É essa percepção
que chamamos de controle.
Segundo Ferreiro & Palácio (1987) é a utilização
de procedimentos, ou é saber quais procedimentos utilizar em uma
leitura, conforme seu objetivo específico e individual, que diferencia
um leitor competente de um não capaz de legitimar a compreensão
do texto. Assim, sendo o objetivo da instituição escolar,
conforme orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais
(BRASIL, 1997), “a formação de leitores competentes”,
é importante esclarecermos quais as características de um
leitor competente e quais procedimentos ele pode utilizar, para incorporar
o objetivo de leitura aos seus procedimentos.
2. O leitor competente e a utilização de
procedimentos de leitura
Definimos que ter objetivos é saber o que devemos fazer diante
de um texto, é saber o que vamos aprender, é saber “para
quê” lemos, é ter procedimentos, estratégias
para alcançar os objetivos estabelecidos. No entanto, ao abordarmos
os procedimentos que pode ter um leitor, apresentamos simultaneamente
as características de um leitor competente, pois parece-nos evidente
que, ao tratarmos da utilização de procedimentos, abordamos
conseqüentemente o leitor competente. Porém, é importante
ressaltar que não apresentamos uma ordem que classifique uma característica
como sendo mais relevante do que as outras, visto que ocorrem interativamente
e muitas vezes simultaneamente conforme define Solé (1998), sendo
utilizadas conforme a situação de leitura, o texto e o próprio
leitor. Assim, as características aqui apresentadas não
são as únicas existentes, propostas na literatura da Lingüística
Aplicada, e nem tão pouco podem construir um modelo para averiguação
de um leitor competente.
É preciso, neste momento, esclarecermos que, por tomarmos como
objeto de análise um livro didático-manual do professor
de 5ª série do ensino fundamental, não estamos considerando
que o leitor-aluno, com idade entre 09 a 12 anos, seja um leitor competente
em definitivo, ele é leitor competente condizente à sua
maturidade tanto mental como cronológica Kato (1986). O leitor-aluno
de 5ª série, pela característica de utilizar procedimentos
conscientes em suas leituras, é um leitor competente em processo.
A utilização de procedimentos pelo leitor competente também
é abordada pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL,
1997: 53), ao referir-se que “é o uso desses procedimentos
que permite controlar o que vai sendo lido, tomar decisões diante
de dificuldades de compreensão, arriscar-se diante do desconhecido,
buscar no texto a comprovação das suposições
feitas, etc.”.
Ter procedimentos é, então, o leitor-aluno utilizar procedimentos,
estratégias conscientes na leitura de um texto para compreensão
desse texto, e por esse motivo, pela utilização de procedimentos,
pode o leitor-aluno ser caracterizado como um sujeito ativo (SOLÉ,
1998). Ser ativo é participar da leitura ativamente, como aquele
que vai ao texto sabendo que não pode esperar passivamente que
o texto possa lhe oferecer tudo que ele precisa para compreendê-lo,
ele também precisa levar o que é dele ao texto. Esse levar
é realizar um trabalho de atribuição (SOLÉ,
1998), onde o leitor-aluno traz ao texto seus conhecimentos prévios
(KLEIMAN, 1989), ou seja, diante de um texto o leitor-aluno utiliza o
procedimento de aplicação do conhecimento que já
possui internalizado sobre aspectos lingüísticos, textuais
e enciclopédicos. Essa atribuição é definida
por Silva (1990) como sendo idiossincrática, ou seja, a atribuição
é feita a partir das histórias e das experiências
individuais de cada leitor.
Uma outra característica do leitor competente é fazer inferências
em suas leituras. Fazer inferências está muito relacionado
a fazer atribuições, pois o leitor pode inferir, acrescentar
ao texto uma série de conhecimentos que ele mesmo já possui,
contribuindo na construção do sentido do texto. Segundo
Fulgêncio & Liberato (1992), fazer inferências é
“ler nas entrelinhas”, é poder, a partir do que está
implícito no texto, inferir sentidos.
Esse implícito é deixado ou construído conscientemente
pelo autor do texto no processo de produção, pois, ao contar
com o leitor para a construção de sentido, não há
necessidade de tudo ser explicitado (GERALDI, 1991).
As inferências também podem ser feitas pelas pistas construídas
propositalmente, ou seja, na produção de um texto, o autor
deixa pistas, que podem ser explícitas ou implícitas, para
que o leitor não se afaste ou não construa um sentido do
texto totalmente diferente daquele pretendido pelo autor (GERALDI, 1991).
É evidente que não se pode tomar o reconhecimento dessas
pistas como algo que fecha o texto em um único sentido, pois um
texto não pode ser algo fechado, um texto é sempre incompleto,
por isso que, segundo Meurer (1988), o autor conta com o leitor e esse
constrói sentidos e não só os reconstrói ou
reconhece.
Simultaneamente à atribuição, o leitor-aluno realiza
um trabalho de extração, pelo qual retira do texto informações,
podendo compreendê-lo. A extração refere-se, conforme
Menegassi (1995: 87), “à leitura superficial das idéias
ali contidas”, podemos defini-la como sendo a leitura do explícito.
O leitor competente é também aquele não só
capaz de realizar apenas leituras parafrásicas (DELL’ISOLA,
1996), podendo reproduzir o sentido do texto de diversas outras formas,
mas também, pode realizar leituras polissêmicas (ORLANDI,
1988), que compreendem em poder produzir, criar novos e diferentes sentidos
ao texto, no entanto, o sentido nunca é tão livre.
Embora, de direito, haja possibilidade de múltiplos
sentidos, de fato não podemos desconhecer que, enquanto parte do
funcionamento social geral, a linguagem é regulada, ou melhor,
as situações de linguagem são reguladas: não
se diz o que se quer, em qualquer situação, de qualquer
maneira. Também não se pode entender o que se quer, de qualquer
maneira, em qualquer situação. (ORLANDI, 1988: 86).
A habilidade de realizar intertextualidade é uma
outra característica do leitor competente. A intertextualidade
diz respeito ao leitor relacionar o texto lido a um outro para que assim
possa compreendê-lo. Segundo Costa Val (1991: 15) “inúmeros
textos só fazem sentido quando entendidos em relação
a outros textos, que funcionam como seu contexto”.
Existem inúmeros procedimentos que podem ser utilizados pelo leitor
em sua leitura e tantos outros que o leito, avaliando o significado e
sentido por ele construído, e percebendo dificuldades, poderá
tomar atitudes de aplicação de outros ou novos procedimentos
(FERREIRO & PALACIO, 1987). Pois, como comenta (1986: 60) “o
tipo de processo utilizado depende, a meu ver, de várias condições:
a) do grau de maturidade do sujeito como leitor; b) do nível de
complexidade do texto; c) do objetivo da leitura; d) do grau de conhecimento
prévio do assunto tratado; e) do estilo individual do leitor, entre
outros.”.
Enfim, dentro desses procedimentos enfatizamos a importância do
leitor-aluno ter objetivos em suas leituras, e passamos então a
analisar se o livro didático oferece objetivos para as leituras
do leitor-aluno, ou seja, proporciona que esse tenha objetivos para ler
os textos ali apresentados e se orienta o professor a ensinar o aluno-leitor
a ter objetivos para suas leituras.
3. O objetivo de leitura no livro didático
Tomamos como objeto de análise o livro didático: Linguagem:
criação e interação - 5ª série.
3ª. Ed. São Paulo: Saraiva, 2002, de Cássia Leslie
Garcia Souza e Márcia Paganini Cavéquia., Manual do professor,
focalizando se esse livro oferece ao leitor-aluno objetivo para a leitura
dos textos ali apresentados. Essas leituras conseqüentemente são
as leituras que esse leitor-aluno faz em textos proporcionados fora do
livro didático e fora da instituição escolar, pois,
se o objetivo da instituição escolar é formar “leitores
competentes” (BRASIL, 1997), vemos como evidente que o livro didático,
parte integrante da instituição escolar, deva considerar
fundamentalmente importante e indispensável oferecer objetivos
para as leituras dos textos ali apresentados e orientar o professor a
ensinar o leitor-aluno a ter objetivos.
O motivo pelo qual optamos por utilizar como objeto da análise
o livro didático-manual do professor foi porque apesar de discussões
e polêmicas em torno do livro didático, em que alguns o apontam
como inibidor do gosto pela leitura, negativo, padronizador das falas
e comportamentos do professor, e outros como elemento indispensável,
elemento tão presente na sala de aula como o professor, há
um censo comum sobre a atuação do professor frente ao livro
didático, ou seja, sabe-se, e muito se critica, que a postura da
uma grande parte dos professores é a de seguir fielmente o livro
didático. Assim, vimos como importante analisar o Manual do professor
por ser ele um conjunto que envolve o livro do professor e o livro do
aluno, dessa forma, pode nos oferecer uma visão completa para o
que nos objetivamos a analisar.
Ao iniciar a análise pelas “Orientações ao
professor”, constatamos a apresentação de um capítulo
denominado “Fundamentação teórica”, página
17, onde as autoras se preocuparam em proporcionar ao professor fundamentações
teóricas a respeito do processo de leitura:
“A formação do professor é
fundamental, pois é ele quem lida com os alunos no seu dia-a-dia
(...). É essencial que o mestre tenha consciência que ler
é necessário e importante. Antes de mais nada, o professor
PRECISA ser um bom leitor. Só assim conseguirá criar em
seus alunos o tão necessário gosto pela leitura.”
Para tanto, elas sugerem uma lista de dez livros referentes ao processo
de ensino e a importância do ensino/aprendizagem da leitura, para
que os professores, segundo as autoras, possam melhorar suas práticas
de ensino. Não tomamos essas sugestões como algo novo ou
diferente, pois, conforme Rojo & Batista (2003), uma boa parte dos
manuais do professor, mais de 70%, tomando por base os livros analisados
pelo PNLD/2002 (Plano Nacional do Livro Didático), indicam leituras
complementares para o professor. Todavia, se não são informações
novas, as tomamos como importantes para o trabalho do professor, pois,
conforme Travaglia (1995: 10), “não há bom ensino
sem o conhecimento profundo do objeto de ensino”. Não há
como o professor trabalhar apenas com o que o livro didático lhe
traz nas unidades de ensino e nas orientações, é
necessário que ele conheça profundamente sobre o que está
ensinando e se a leitura é um desses ensinamentos, é essencial
que ele conheça as teorias referentes ao seu objeto de ensino para
poder analisar e decidir como colocar essas teorias em prática.
Ainda sobre o capítulo “Fundamentação teórica”,
na página 16, as autoras conceituam leitura, estratégias
de leitura, oferecem sugestões de práticas para o professor
e para a escola na tarefa de criar o gosto pela leitura nos alunos e principalmente
tratam da importância do leitor ter objetivos em suas leituras:
“Os objetivos que levam alguém a ler podem
ser os mais variados. Algumas pessoas lêem porque estão buscando
uma informação, outras porque precisam aprender algo, outras
porque querem conhecer o pensamento alheio, outras ainda lêem a
fim de ‘sonhar’ ou de se divertir.”
Essa menção a ter objetivos nos levou a
prever que as autoras, por terem a preocupação de orientar
os professores sobre a importância do objetivos quando lemos, conseqüentemente
oferecem ao leitor-aluno objetivos para leitura dos textos ali apresentados,
assim iniciamos a análise das unidades do livro didático
para verificarmos nossa previsão. Para tanto, abordaremos o que
é apresentado no livro didático, sempre em relação
ao que é apresentado no manual, com orientações ao
professor.
O livro é separado em 10 unidades, com estrutura clássica,
sendo quetodas elas acompanham um mesmo esquema de divisão: Abertura,
Momento do texto, Painel do texto, Estudo do texto, Ampliação
de vocabulário, Diversidade de expressão, Questões
de linguagem, Produção de texto e Estudo da língua.
Na unidade 1 abordamos a “Abertura”. O texto apresentado é
a reprodução de um cartaz publicitário lançado
pelo governo brasileiro em parceria com o MEC, em 1997, referente à
campanha de promoção do hábito da leitura, em que
o slogan é: “Ler é viver”. A orientação
ao professor nos “Comentários e sugestões unidade
a unidade”, página 33, é para que leve os alunos a
discutir sobre o anúncio e sobre o que ele transmite.
Apesar das orientações não fazerem menção
explícita à utilização desse texto como ativação
do conhecimento prévio do aluno, vimos que as discussões
propostas encaminham para esse trabalho. É fundamental que o leitor-aluno,
antes de iniciar sua leitura, ative seus conhecimentos prévios
sobre o assunto em questão, pois isso o ajuda em sua compreensão,
como aborda Solé (1998) e Kleiman (1989). Essa ativação
de conhecimento prévio é utilização de procedimentos,
ou seja, é trabalhar para a formação do leitor competente.Logo
após a “Abertura”, o livro apresenta o “Momento
do texto”, onde traz o texto principal da unidade: uma história
em quadrinhos:
(Eva Furnari. A bruxinha encantadora e seu secreto admirador, Gregório.
São Paulo, Paulinas, 1990. In SOUZA & CAVÉQUIA, 2002,
p. 14).
Ao aluno é dado saber que o texto é uma história
em quadrinhos, ao professor é dada a orientação,
na página 33, no capítulo “Comentários e sugestões
unidade a unidade”, que a leitura de histórias em quadrinhos
é uma leitura, geralmente, prazerosa, e a escolha desse tipo de
texto: “Vai ao encontro do tema em questão (leitura/prazer)”.
O livro não ofereceu diretamente ao leitor um objetivo para a leitura
da história em quadrinhos, ler por prazer, no entanto ofereceu
ao professor a orientação de levar o leitor-aluno a compreender
que esse tipo de leitura tem como objetivo o prazer, a fruição,
com isso, o leitor-aluno tem logo na primeira unidade do livro didático
a oportunidade de, com seu conhecimento prévio ativado, tendo como
objetivo, instruído pelo professor, ler por prazer, ir para a história
em quadrinhos com o objetivo de ler pelo prazer de ler. Visando uma amplitude
ainda maior, o leitor-aluno poderá começar a estabelecer
para esse gênero de texto, o qual encontrará também
fora do livro didático e fora da escola, uma leitura de descontração,
uma vez que abordamos que o gênero muitas vezes determina o objetivo.
Porém, isso tudo é destruído em seguida, pois, se
está estabelecido como objetivo para esse texto ler por prazer,
concluímos como contraditórias as perguntas que o livro
propõe no “Estudo do Texto”, ou seja, se era por prazer,
por que o leitor-aluno é avaliado com perguntas como (página
16): “5. Que mensagem podemos tirar dessa história em quadrinhos?”
Se é para aprender algo, se é para tirar alguma informação
(mensagem) do texto, vimos que o objetivo proposto está inapropriadamente
marcado. A princípio, relacionamos essa leitura à classificação
de Solé (1998), como sendo “Ler por prazer”, em que
a leitura é uma questão pessoal, a qual lemos porque gostamos
de ler, porque gostamos daquele determinado tipo de texto, porque a leitura
nos traz prazer. No entanto, o “Estudo do Texto” faz com que
esse objetivo seja substituído conseqüentemente por outros,
como: “Ler para aprender”, “Ler para verificar o que
se compreendeu”.
Segundo Solé (1998: 97), quando se lê com o objetivo de prazer,
o que importa é a “experiência emocional desencadeada
pela leitura”, todavia, o que ocorre é exatamente o que aborda
Fregonezi (1999: 93) sobre atividades de leituras nos livros didáticos,
“as atividades de leitura resumem-se em apresentar um texto ao aluno
e propor um ‘estudo do texto’, composto por um grupo de exercícios”.
Ainda referenciando Solé (1998: 100), ela analisa esse constante
estudo do texto apresentado pelo livro didático como sendo negativa
a proposta de se ter objetivos, pois, “quando a seqüência
leitura/perguntas/respostas se generaliza, também se generalizam
para os alunos certos objetivos de leitura”. Se sempre que apresentado
um texto, seja ele de que gênero for, após a leitura o leitor-aluno
é levado a responder perguntas para que o professor verifique se
ele entendeu ou não o texto, assim, o objetivo será sempre
o aprendizado de um conteúdo ou a aferição da compreensão.
Essa constatação pode ser ainda confirmada frente ao resultado
do levantamento sobre todas as histórias em quadrinhos, cartuns
e tiras que o livro apresenta, compreendendo que os objetivos podem se
relacionar a gêneros textuais (KLEIMAN, 1989). Vejamos:
Gênero textual Página Unidade Proposta do livro sobre esse
texto
Tira 70 3 Trabalho com gramática: diminutivo e aumentativo
Tira 87 4 Trabalho com gramática: adjetivo e substantivo
Cartum 107 5 Base para produção de texto
Tira 110 5 Trabalho com gramática: artigo e numeral.
Tira 127 6 Trabalho com gramática: pronome possessivo.
Tira 130 6 Trabalho com gramática: pronome interrogativo.
Tira 132 6 Base para produção de texto.
Quadrinhos 143 7 Trabalho com localização de elementos da
narrativa.
Quadrinhos 194 9 Trabalho com gramática: interjeição.
Tira 212 10 Trabalho com gramática: sujeito da oração.
Desse modo
se estabelece um processo de “generalização”
de objetivo, como define Solé (1998), pois a cada história
em quadrinhos, tira e Cartum, as quais poderiam, pelo gênero, serem
apresentadas ao leitor-aluno com o objetivo de ler por prazer, elas são
evidenciadas como textos onde o leitor-aluno deve aprender um conteúdo,
o que claramente vai de encontro ao que apresentamos como não sendo
possível determinar um único e estático objetivo
para a leitura (SOLÉ, 1998). Apresentar exercícios de verificação
de aprendizagem ou apresentando o texto para aprendizagem de conteúdos
gramaticais, sem que se trabalhe a leitura, é fazer com que o leitor-aluno
determine um único e estático objetivo para suas leituras:
a obrigação de ler na escola para fazer exercícios
e/ou para aprendizagem de conteúdo. O “para quê”
ler um texto, estabelecido por Geraldi (1991), se define para o aluno
como ler para fazer exercícios, para ser avaliado.
Na orientação ao professor, na página 32 do capítulo
“Comentários e sugestões unidade a unidade”,
cita-se que: “As questões do ESTUDO DO TEXTO podem ser respondidas
oralmente para evitar que o aluno associe a leitura do texto com a tarefa,
às vezes, para ele, enfadonha, de logo em seguido ter que escrever
várias linhas”. Não vemos como essa associação
não possa ocorrer, mesmo sendo proposta oralmente.
Convém ressaltarmos que, mesmo considerando que o “Estudo
do texto” vem “destruir” o objetivo proposto para a
leitura da história em quadrinhos, porque oferece perguntas que
objetivam averiguar se o aluno compreendeu o texto e perguntas que instituem
o aprendizado de elementos sobre estrutura textual, com essas perguntas,
o professor pode, junto com o leitor-aluno, trabalhar procedimentos de
leituras, podendo ir muito além das orientações propostas
para o “Estudo do Texto”, feitas na página 33 dos “Comentários
e sugestões unidade a unidade”, “(...) nas questões
propostas, o aprendiz refletirá sobre os elementos estruturais
do texto, o recurso humorístico utilizado pela autora, dará
opiniões pessoais, fará inferências”. Vejamos
como pode o professor trabalhar procedimentos, ou seja, como aqui o livro
didático pode colaborar para a formação do leitor
competente:
Na questão de número 1, “Você sabe o que é
um personagem? Observando as atitudes da personagem dessa história,
cite características que possam ser dadas a ela e justifique sua
resposta”. O leitor-aluno pode utilizar o procedimento de extração
de informações (MENEGASSI, 1995), pois é o que orienta
a questão quando solicita que as atitudes da personagem sejam observadas,
e dessa forma levantar que a personagem é uma senhora de idade
avançada, pelo tipo físico e roupas; é uma bruxa,
pela verificação do título do livro; gosta de ler,
pois termina a história lendo um livro; é distraída,
pois tropeça na pedra, entre outras características. E também
pode utilizar o procedimento de atribuição (SOLÉ,
1998), aplicando seus conhecimentos e experiências para caracterizar
a personagem, onde pode caracterizá-la como cuidadosa, pois não
coloca o livro no saco de compras para não sujar; gosta de se vestir
bem, sua bolsa combina com o sapato; é muito boa, pelo título
do livro: Bruxinha encantadora; e esquecida de suas obrigações,
pois ao ver o livro se esquece das compras.
Fazer atribuições está muito relacionado a fazer
inferências (FULGÊNCIO & LIBERATO, 1992), assim, faz o
leitor inferências na leitura do implícito, quando infere
a característica de gostar de se vestir bem, por notar que a bolsa
combina com o sapato, e que é muito cuidadosa por não colocar
o livro junto com as compras, contribuindo na construção
do sentido do texto (MEUER, 1988).
O trabalho com a questão de número 8. “O que faz esse
texto ser engraçado, bem-humorado?”. Ao conceituarmos que,
ter procedimentos ou estratégias é ter ou criar controle
metacognitivo que propicie o desenvolvimento de habilidades cognitivas
(KLEIMAN, 1989), observamos que essa questão propicia que o leitor-aluno
efetive esse controle podendo avaliar sua compreensão conscientemente.
Assim, o leitor-aluno, não tendo encontrado humor no texto após
sua leitura, deparando-se com essa questão, poderá refletir
sobre sua compreensão e avaliá-la diante do objetivo proposto.
Considerando também o objetivo ‘ler por prazer’, o
leitor-aluno, não identificando essa leitura como uma leitura que
lhe proporcionou prazer, tem a oportunidade de refletir sobre o por que
isso ocorreu, e pode até chegar a concluir que esse gênero
de texto não lhe agrada, não lhe proporciona prazer, aplicando
assim mais uma das características do leitor competente, a habilidade
de seleção, estabelecida nos Parâmetros Curriculares
Nacionais (BRASIL, 1997).
A interação entre leituras parafrásicas e polissêmicas
são procedimentos que também podem ser trabalhados com o
leitor-aluno. Apesar de o livro proporcionar apenas o trabalho com a leitura
parafrásica, que se institui no momento em que o leitor-aluno apenas
reproduz uma leitura padronizada (DELL’ISOLA, 1996), em que indicam-se
ao professor as respostas que devem ser aceitas como “corretas”,
o que ele apresenta em algumas questões são “sugestões”
de resposta. Essas sugestões, na verdade, acabam por inibir o professor
a trabalhar o leitor-aluno a instituir leituras polissêmicas (ORLANDI,
1988), leituras em que poderão ser construídos sentidos
diferentes e múltiplos. O que não significa que não
possam ser trabalhadas, pois elas são evidentemente proporcionadas
pelo texto em questão.
Na questão de número 5, “Que mensagem podemos tirar
dessa história em quadrinhos?”, as respostas sugeridas no
livro didático são: “5 – Sugestões: Um
livro pode ser apreciado pelas pessoas nas mais variadas situações;
um desastre nem sempre é trágico; é necessário
levar a vida com bom humor”, consideramos muito válida, porém
limitada, pois o leitor-aluno, realizando uma leitura idiossincrática
(SILVA, 1990), ou seja, atribuindo sentidos a partir de suas histórias
e experiências individuais, sendo conseqüentemente ativo (SOLÉ,
1998), pode construir várias e diferentes mensagens para esse texto,
e aqui apresentamos algumas as quais, por nossa previsão, pela
experiência em sala de aula, poderiam surgir: uma pessoa quando
gosta de ler pode esquecer de todas as suas obrigações;
uma pessoa quando já com idade avançada, o que a figura
da personagem sugere, é esquecida, ou seja, ela esqueceu das compras
quando viu o livro e começou a ler; sendo a personagem uma bruxa,
ficou com raiva da situação ali vivida e resolveu consultar
seu livro de bruxarias para resolver o caso; essa mulher é muito
desastrada e desiste fácil de resolver as situações
complicadas que vive.
Dentro da diversidade de respostas que podem surgir, as quais estão
encaminhadas para uma mensagem negativa, pejorativa da personagem, cabe
ao professor saber não considerar todas essas respostas como incorretas
ou maldosas, mas saber integrar o texto ao contexto em questão,
encaminhar o aluno-leitor ao tema da unidade, o prazer pela leitura, podendo
fazer com que ele compreenda que, mesmo quando é só distração,
não é totalmente livre na construção do sentido
(ORLANDI, 1988).
Logo após o “Estudo do texto”, o livro apresenta o
tópico “Do autor ao leitor”, onde questiona o aluno-leitor
se ele conhece outros autores de histórias em quadrinhos, quem
são os destinatários dessas histórias, em que materiais
são encontrados histórias como essa. Vimos esse ponto como
positivo no sentido de proporcionar ao leitor-aluno a lembrança
de outros autores conhecidos e até mesmo de aguçar a curiosidade
de procurar outros autores, que podem, nesse momento, ser sugeridos pelo
professor ou pelos outros alunos, ou seja, trabalhar a intertextualidade
(COSTA VAL, 1991), trabalhar a diversidade de materiais que podem ser
oferecidos para leitura no sentido de proporcionar prazer ao leitor, podendo
assim também trabalhar o relacionamento entre gêneros textuais
com objetivos de leitura (KLEIMAN, 1989). Dessa forma, consideramos a
orientação dada ao professor sobre esse tópico, nos
“Comentários e sugestões unidade a unidade”,
página 33, muito limitada, por orientar apenas que:
“Na subseção Do autor ao leitor, os conhecimentos
do aluno acerca de outros autores de histórias em quadrinhos são
resgatados. Indagações a respeito do destinatário
e do portador do texto em estudo também são levantadas.
Esses questionamentos são importantes para chamar a atenção
do aluno ao fato de que os textos podem (e devem) ser procurados fora
do livro didático.”
Prosseguindo
a análise, abordamos o tópico “Questões de
linguagem”. Neste tópico, o livro didático traz alguns
exemplos de diferentes gêneros textuais: a) um rótulo de
embalagem; b) uma piada/anedota; c )um poema; d) um passe de ônibus;
e) um classificado de jornal; f) uma receita culinária; g) um manual
de instrução. Questionando o aluno-leitor: “Quem é
o autor?”; “Qual a finalidade?”; e “Quem é
o destinatário?”; desses textos. A nosso ver, a atividade
proposta não deixa claro ao aluno-leitor que ele pode relacionar
os gêneros textuais a objetivos de leitura, ou que lemos diferentes
textos com objetivos de leitura diferente, no entanto, tendo o professor
conhecimento dessa questão, da importância de ensinar ao
aluno-leitor a ter objetivos para suas leituras, poderá fazer um
bom trabalho. Isto se levar em consideração à orientação
dada ao aluno-leitor pelo livro didático, página 21: “Conhecer
tais diferenças pode ser importante para que possamos utilizar
os textos da melhor maneira possível, de acordo com nossas necessidades
(obter alguma informação, divertir-se, conhecer um fato
etc)”, desconsiderando para esse trabalho as orientações
dados ao professor, na página 34:
“É
preciso colocar os alunos em contato com os diversos tipos de texto de
uso freqüente na comunidade. Essa é uma maneira de capacitá-los
a interpretar tal diversidade textual, bem como de torná-los produtores
eficazes de textos, nas mais variadas situações.”
Com essa
orientação, entendemos que o objetivo maior do exercício
não seja o trabalho com a leitura e sim o trabalho com a produção
de textos, o que poderá também ser trabalho, porque nessa
instância optamos por considerar Geraldi (1991), para quem o trabalho
de leitura é “integrado” ao trabalho de produção
de texto.
Os demais tópicos da Unidade l: Ampliação de vocabulário,
Diversidade de expressão, Produção de texto e Estudo
da língua, envolvem questões de produção de
texto e de ensino de gramática, assim, não estão
relacionados ao objetivo de nossa análise, por esse motivo não
serão abordados.
Considerações
finais
Até aqui enfocamos que a menção feita pelas autoras
do livro didático, sobre ter objetivos, nos levou a prever que
ele ofereceria ao leitor-aluno objetivos para leitura dos textos ali apresentados
e forneceriam orientações ao professor sobre como ensinar
o leitor-aluno a ter objetivos para suas leituras, porém, após
análise, concluímos que o livro didático analisado
não oferece em suas unidades objetivos de leituras ao leitor-aluno
para transforma-lo num cidadão, num leitor competente, não
oferece também orientações ao professor para tanto,
ou melhor definindo, ele oferece sempre um único e estático
objetivo (SOLÉ, 1998). É a confirmação da
teoria que apresenta Kleiman (1989: 30):
O contexto
escolar não favorece a delineação de objetivos específicos
em relação a essa atividade. Nele a atividade de leitura
é difusa e confusa, muitas vezes se constituindo apenas em um pretexto
para cópias, resumos, análise sintática, e outras
tarefas do ensino de língua.
Considerando
o livro didático parte integrante desse contexto escolar, observamos
que, como colaborador na formação do leitor competente,
o livro não pode oferecer sempre textos em que a leitura é
seguida de exercícios e abordagens de verificação
da compreensão e aprendizagem, fazendo com que o objetivo se torne
inegavelmente o mesmo.
Por fim, se ter objetivos relaciona-se a ter uma motivação
para ler, concluímos que o livro didático Linguagem: criação
e interação, 5ª série, não contribui
na motivação do leitor-aluno a ler, no sentido de não
oferecer objetivos específicos para suas leituras. Quanto a orientar
o professor, o livro orienta-o a levar o leitor-aluno a ter o objetivo
de ler o texto principal para o prazer de ler, no entanto, a apresentação
de um “Estudo do texto” desfaz o objetivo proposto. É
importante então ressaltar que em todas as demais unidades isso
não mais acontece, ou seja, em nenhuma outra unidade foram oferecidas
orientações para o leitor-aluno ter objetivos para suas
leituras e também não foram encontradas orientações
ao professor nesse sentido, o que não seria trabalho difícil,
visto que o livro traz uma diversidade de gêneros textuais, os quais
contribuem significativamente para esse trabalho.
Enfim, considerando todas as discussões, estudos e pesquisas a
respeito do livro didático e principalmente em decorrência
de nossa experiência em sala de aula como professores, temos certeza
que a utilização do livro didático só produz
bons resultados quando o professor sabe como utilizá-lo, pois é
a ele que cabe utilizar esse recurso e tantos outros, valorizando o que
vê como importante e interessante e desprezando o que não
cabe ou não interessa a determinada sala de aula ou a determinada
ocasião de ensino. Cabe ao professor ser criativo diante dos materiais
que selecionou ou até mesmo diante dos materiais que lhe foram
impostos, pelo sistema, mudando o censo comum de que o professor segue
fielmente o livro didático. Dessa forma, esperamos ter contribuindo
para melhorias no trabalho do professor, no sentido de que possa ter mais
uma forma de avaliar seu material de trabalho e com ele possa efetivamente
cumprir uma das principais atividades da instituição escolar
no processo de ensino, a formação de leitores competentes.
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