Voltar | ||||||||
REPRESENTAÇÃO DO FEMININO NA MÍDIA IMPRESSA: PROCESSOS DE REFERENCIAÇÃO Fernanda Beatriz C Morais (PUC-CAMPINAS, Faculdade de Letras, Bolsista de Iniciação Científica PIBIC/CNPQ). Este trabalho tem como objetivo analisar, na mídia impressa, alguns processos de referenciação e metáforas que permitiram agrupar, em cinco categorias, mulheres que se destacam na área política. Os resultados permitem dizer que o discurso da mídia reproduz valores do passado da cultura brasileira, contribuindo assim para a continuidade do preconceito face à mulher brasileira. Neste artigo, apresento, primeiramente, um quadro teórico da Análise Crítica do Discurso, e o papel do discurso na mídia, em especial, a mídia impressa, para em seguida tratar a referenciação e as metáforas no processo de referenciação e representação do feminino na mídia em revistas de circulação nacional, dando ênfase na representação da mulher na política. O discurso como prática social Primeiramente
devemos entender o discurso como uma prática de significação
do mundo, constituindo e construindo o mundo em significado. Segundo Fairclough
(2001) o discurso possui três aspectos de efeitos construtivos:
contribui para a construção do que é referido como
“identidades sociais” e “posição de sujeito”
para os “sujeitos sociais” e os tipos de “eu”.
O discurso contribui, também, para construir as relações
sociais entre as pessoas e para a construção de sistemas
de conhecimentos e crenças. O discurso e a mídia A mídia,
de um modo geral, exerce grande influência em nossa sociedade, e
esse poder desempenhado por ela não restringe à influência
dessa sobre o público, mas envolve também o seu papel no
domínio mais amplo das estruturas de poder social, cultural, político
ou econômico da sociedade. Processos de referenciação e metáforas A referenciação
é entendida, segundo Koch (2004) como uma atividade discursiva.
E os processo de referenciação são escolhas do sujeito
em função de um querer-dizer. Por isso, o discurso constrói
aquilo a que faz remissão, ou seja, todo discurso constrói
uma representação que opera como uma memória compartilhada
(memória discursiva, modelo textual) publicamente alimentada pelo
próprio discurso, sendo que os estágios dessa representação
são responsáveis, ao menos em parte, pelas relações
feitas pelos autores, especialmente se tratando de metáforas e
processos de referenciação.
E pela repetição
constante dessas estratégias estabiliza-se o modelo textual que
é continuamente reelaborado e modificado por meio de novas referenciações. Metáforas no processo de referenciação A palavra
metáfora vem do grego metaphorá que significa transporte,
e uma comparação. E o estudo da metáfora vem sendo
feito há mais de dois mil anos, Aristóteles em sua arte
poética dizia: “a metáfora é a transposição
do nome de uma coisa para outra, transposição do gênero
ou de uma espécie para outra, por via de analogias...” (in
Abreu, 2000). 1) Quando a mulher é retratada como “perua”: a) “Perua na lama – Elegantíssima como sempre, a prefeita Marta Suplicy é hostilizada por vítimas das enchentes – A prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, do PT, é reconhecida pela exuberância de seu guarda-roupa.... Elegantíssima, pisou com desenvoltura no lamaçal que tomou conta da região de Aricanduva, Zona Leste... Dois dias antes, dessa vez com uma roupinha básica – blusa preta e camiseta branca – ela já enfrentava contratempos...”. – Veja 11/02/2004. b) “Desfilou por bairros pobres com um guarda-roupa tão caro e exibido que era difícil acredita que nada visse de incongruente no fato de uma prefeita vestir-se assim diante de gente sacrificada no curral do salário mínimo” – Veja 23/03/2005. Observa-se nesses exemplos que a ênfase dada à Marta é pela forma como ela se veste, e se comporta citado de maneira irônica, como mostra os grifos. A metáfora “perua” rotula Marta e deixa o seu lado profissional em segundo plano. 2) Quando a mulher é retratada como “autoritária e linha dura”: a) “Boa de briga – Heloisa Helena não tem medo de enfrentar os poderosos. A senadora Heloisa Helena, de 39 anos, do PT de Alagoas, é uma mulher de coragem. No Senado, ficou famosa pelo jeito destemido com que defende suas idéias.” – Época 25/11/2002. b) “Ela tem personalidade forte, um lado macho na forma de imprimir gestão”-fala do ministro da cultura Gilberto Gil sobre Dilma Roussff, nova ministra-chefe da casa civil”. – Época 27/06/05. Através desses exemplos podemos observar que para a mulher conseguir o que quer e ser respeitada, muitas vezes, a mulher tem que adotar uma postura linha-dura, deixando de ser feminina, para tomar uma postura masculinizada, ganhando assim mais respeito. 3) Quando a mulher é retratada como “sombra do homem”: a) “Fiel escudeira do presidente Lula, Dona Marisa da Silva quase teve seu dia de protagonista – mas acabou ofuscada pelo próprio marido. Na cerimônia em que a patroa foi apresentada como presidente da ONG Fome Zero, o presidente falou um tempão – de seca, de fome, de tudo...menos da primeira-dama, estrela do dia” – Época 14/07/2003. b) “Bolinha é quem manda – Eleita pela popularidade do marido, Rosinha retribui com poder em áreas estratégicas. Em crise financeira, política e de segurança, Rosinha entrega a parte mais importante de seu governo ao marido, Anthony Garotinho” – Época 17/03/2003. Nesses exemplos, podemos observar as metáforas “Fiel escudeira e “Bolinha é quem manda” que dão ênfase à importância dos maridos para as mulheres, que são consideradas sombras deles, ou seja, em segundo plano. A vida da mulher está focada no marido, e elas estão sempre atrás deles e não ao lado. 4) Quando a mulher é categorizada como “frágil e temperamental”: a) “E no cenário político religioso....A radical neste ano a senadora Heloisa Helena foi a que mais fez e aconteceu. Chorou muito, esperneou mais, mas acabou ficando de fora: foi expulsa do PT. Justamente ela que tem – ou tinha a cara do partido! Vai entender...” - Época 29/12/2003. b) “Mulher de voz fraca e personalidade forte, ela enfrentou o assassino da moto-serra, o ex-deputado Hildebrando Paschoal” – Época 14/07/2003. Observa-se nos exemplos que a mídia faz referência à mulher frágil e temperamental, quando estas lutam pelo que quererem e conseguem. No último exemplo há uma contraposição entre mulher de voz fraca X personalidade forte. 5) Quando a mulher é categorizada como “musa”: a) “A Bela, a Fera...e o Fantasma” título do artigo sobre os candidatos Rita Camata e José Serra as eleições presidenciais - Época 27/05/2002. b) “Além de ser mulher e bonita - fatores que podem ser decisivos numa etapa em que 23% do eleitorado feminino ainda não têm candidato...” - Época 27/05/2002. Nesses exemplos, observa-se que a ênfase dada é na beleza da candidata, no primeiro exemplo a metáfora “bela” contrapõe com “fera”, que pode ser entendida como o bom profissional, ou o bom político X a candidata bonita. Pode-se observar no segundo exemplo o jogo entre a beleza física de Rita e o seu conhecimento como política. Conclusão Os dados permitem dizer que a mídia jornalística de um modo geral contribui para a perpetuação do preconceito face á mulher brasileira. Nota-se que uma mesma mulher pode pertencer a mais de uma categoria, de acordo com suas representações na mídia, que são dadas através de seus comportamentos, atitudes, formas de se vestir, beleza física e até mesmo através do nome de seus maridos.
ABREU, Antônio
Suárez. Metáfora- uma visão funcionalista. Letras
PUC-Campinas 19:5-108, 2000. |
||||||||
Voltar |