Juliana Rinaldi - Universidade do Planalto Catarinense
- UNIPLAC
Com este artigo, pretende-se mostrar a importância
da poesia no âmbito escolar, pois a poesia nada mais é do
que o retrato da nossa imaginação, da nossa autenticidade,
beleza e emoção. Ela nos dá uma visão geral
de que as crianças devem ser estimuladas desde pequenas para o
seu fazer poético, que elas são capazes de transmitir todas
as sensações sem pensar, e que, desde cedo, podem e devem
ser consideradas poetas de verdade. A linguagem poética é
uma das mais interessantes, porque mexe com nosso sentimento, nossa sensibilidade.
Se as crianças forem estimuladas à leitura desde a infância
e o ambiente onde iniciamos for carregado de magia, será possível
uma relação entre o pensar e o sentir, um jogo de palavras
sedutor que chamamos de poesia, pois esse mundo é fascinante e
imprevisível.
Desde pequenos convivemos com a poesia: as músicas que a mãe
cantava, as brincadeiras de roda, as parlendas... acostumaram os ouvidos
com a graça e o ritmo da poesia. Porém, isso nos parece
ter ficado mais no plano sensorial e intuitivo e pouco no plano lógico
e racional. Como a poesia toca os sentidos e as emoções,
logo pode estimular o aluno a produzir bons textos poéticos.
A poesia tem grande importância no âmbito escolar, pois ela
pode apresentar experiências humanas que podem ser consideradas
no que se refere ao conhecimento. Sendo a escola o local que tem o papel
de formar o homem integral, composto de razão e emoção,
ela também é lugar de poesia. Com isso, não se quer
fazer dos alunos, poetas; mas sim possibilitá-los ao contato com
a beleza, a brincadeira com as palavras, significados e formas.
É na escola que o aluno deve encontrar a liberdade de criação
e expressão, de fantasia e imaginação. No entanto,
muitas vezes a escola é transformada num elemento coercitivo, que
sufoca a criatividade e a imaginação dos alunos, pois o
sistema de ensino atual está mais preocupado em fazer garantir
uma vaga no vestibular e decorar regras do que estimular a capacidade
criadora.
Nesse sentido, JOLIBERT (1994, p. 195) afirma:
Quando a escola não exerce seu papel de mediadora,
o campo da poesia pode permanecer totalmente estranho para muitas crianças,
em particular às que pertencem a um meio familiar onde pouco ou
nada se lê e onde as urgências funcionais mascaram a necessidade
do imaginário (...), onde não se vê nem se ouve poemas
na televisão (...) o imaginário segue outros caminhos que
não a linguagem escrita.
Outro fator de grande importância, para que se trabalhe
com a produção escrita de poemas, é o fato de se
levar aos alunos mais uma alternativa para a escrita espontânea,
a qual poderá romper com “certos mecanismos estereotipados
da escrita e revelar que é possível combinar formas de expressão
e conteúdo”, conforme afirma CITELLI (2001, p. 175).
É possível conceber como linguagem não apenas a capacidade
humana de construir sistemas simbólicos, mas entendê-la como
uma atividade constitutiva do sujeito, pois é através dela
que acontece a interação do “eu com o outro’’.
A língua também não pode ser considerada um sistema
fechado, pois o próprio ato de falar joga o indivíduo dentro
do processo de constituição da língua. Daí
porque a aquisição das palavras do outro é igualmente
a internalização de uma compreensão de mundo, isto
é, a palavra do outro perde sua condição de alheia
e adquire caráter de palavras próprias (internas).
Assim, a palavra deve ser vista como um recurso expressivo que envolve
aspectos antropoculturais abertos, pois ela se organiza como um processo
histórico e, como tal, acha-se em constante modificação.
Deste modo, o sujeito é um ser social, até porque a linguagem
se constrói como um trabalho social e histórico do sujeito
e dos outros e é neste outro e com ele que ela se constitui.
Na percepção da linguagem, enquanto constituidora do indivíduo,
é necessário considerar que as interações
não se dão num contexto sócio-histórico amplo,
ao contrário, elas se tornam possíveis no interior e nos
limites de uma determinada formação social.
Por ser constitutiva, a linguagem não pode ser entendida apenas
como a forma de que o indivíduo dispõe para exteriorizar
o pensamento ou os seus sentimentos, mas deve ser vista como a possibilidade
de realizar ações, de agir e atuar sobre o interlocutor.
Até porque é justamente ancorado nesta face da linguagem
que acontece a interação, conseqüentemente, o dar-se
o sentido das coisas, das gentes e de suas relações.
A palavra e a linguagem assim entendidas, estão intimamente relacionadas
com comunicação e esta com criatividade.
Para a maior parte dos falantes, o uso se dá de modo automático.
Por isso, raramente se percebe que o modo como se organiza a linguagem
está diretamente ligada à função que se deseja
dar a ela, isto é, à intenção do emissor.
A linguagem desempenha determinada função, de acordo com
a ênfase que se queira dar a cada um dos fatores do processo de
comunicação. Desse modo, assim como são seis os componentes
do ato de fala, seis são as funções que a linguagem
pode assumir: emotiva, conativa, referencial, metalingüística,
fática e poética.
No entanto, prioriza-se neste trabalho a função poética
por estar centrada na mensagem, procurando-se com os problemas da estrutura
verbal, (HOLENSTEIN, 1978). Para Jakobson, segundo Holenstein (1978) a
poesia constitui o campo onde descobriu e estudou os mais importantes
princípios da lingüística estrutural, ou seja, a autonomia
da linguagem, o caráter estrutural acentuado da linguagem bem como
a multiplicidade das funções lingüísticas.
É oportuno acrescentar que para Kloepper (1984) o uso poético
da língua existe sempre e especialmente nas situações
de comunicação mais correntes (= linguagem cotidiana), cujo
resultado final é sempre um texto.
Importa aqui delinear, em seus aspectos mais gerais, os tipos de funções
que a linguagem como um todo pode desempenhar nas múltiplas utilizações
que dela se faz – por um lado, para se refletir sobre essas funções,
reconhecendo-as ou não; por outro, para avaliar a importância
que se tenha dado ao lado expressivo, subjetivo, aos papéis emotivos
dessa utilização.
Inúmeros pesquisadores deixaram suas contribuições
sobre as funções da linguagem, porém, foi com base
em BÜHLER que esses estudos se realizaram.
Segundo BÜHLER, todo enunciado é composto de três relações:
- com as coisas sobre as quais se diz algo (aspecto representativo da
linguagem) – ELE;
- com o próprio falante (aspecto expressivo) – EU;
- com aquele a quem se dirige o enunciado (aspecto de apelo ) –
TU.
Situa o emissor e o receptor no circuito da fala e opta por três
funções: expressiva, apelativa e representativa.
As funções da linguagem de BÜHLER – que se apresenta
em correspondência imediata às de JAKOBSON (TOLEDO, 1978)
estão assim caracterizadas:
Função Representativa – corresponde à referencial,
“denotativa”, “cognitiva” para JAKOBSON (centrada
no contexto).
É uma função exclusivamente humana, com objetivo
de transmitir informações, de permitir a troca social. Através
desta função se torna possível a descrição
da língua dentro dos parâmetros da teoria da comunicação.
JAKOBSON não toma o referente como eixo dessa função,
mas o contexto, uma vez que não há referência sem
contexto. Porém, apesar de o contexto ser relevante para a função
referencial, não quer dizer que é o seu alicerce. Tal função
serve para diferenciar a linguagem animal da humana pelo fato esta ser
duplamente articulada, apresentando caracteres de permanência quanto
ao significado e à divisibilidade.
Função Expressiva – JAKOBSON chamou-a de emotiva (centrada
no remetente).
A Função Emotiva vai descobrir o estado emocional, o estado
de espírito do falante do objeto de sua comunicação.
O valor que aparece aqui se contraporia ao intelectivo – referencial.
A função emocional é vista como acrescida à
referencial quando o locutor quer adicionar elementos que dizem respeito
ao seu íntimo.
Função Apelativa – e Conativa em JAKOBSON (centrada
no destinatário). É a função dos enunciados
de ordem volitiva ou coercitiva, cuja finalidade é influenciar
o comportamento do destinatário da mensagem. São elementos
lingüísticos desta função os vocativos e os
imperativos.
A função apelativa e expressiva não são exclusivas
do homem, são notadas em outras espécies animais.
Expressivos da função conativa são os discursos de
propaganda, com o objetivo de persuadir e impor certo comportamento no
destinatário. Esta função vem revestida sob forma
de admoestações: ‘’não faça isso!”ou
injunções: ‘’Beba BHRAMA!’’ou sob
a forma de interpelações disfarçadas ou atenuadas
(até o aliciamento): “Agora, nós vamos dormir...’’
‘’O mundo trata melhor quem se veste bem!’’ atingindo
até a modalidade da função encantatória ou
mágica. .
Função Fática (centrada no contexto) – Muitos
pesquisadores consideram as funções referencial, conativa
e emotiva as mais básicas, pois correspondem aos eixos fundamentais
da cognição, conação e expressão (ELE
– TU - EU), enquanto as funções fática, metalingüística
e poética constituem derivações históricas
das mesmas. É de se admitir que a função fática
é a mais antiga utilizada pelos seres humanos, uma vez que surge
desde a etapa do balbucio infantil, como também nas manifestações
da linguagem animal. As formas de vocativo e imperativo (função
conativa) também fazem parte das primeiras aquisições
lingüísticas da criança.
Apesar de a função fática conter traços de
apelo é a menos coercitiva das condutas verbais conativas: apenas
requer de seus destinatários uma participação equivalente
à do destinador. Daí o seu sentido principal: o de criar
solidariedade, o de estar em sintonia com os grupos sociais.
Função Metalingüística (centrada no código)
– Pressupõe a existência de uma linguagem-objeto (um
discurso que se refere a entidades extralingüísticas) que
se pretende deduzir. A metalinguagem vai ser usada para falar de linguagem-objeto
– é um discurso concernente a entidades de natureza lingüística.
Segundo Jakobson, os falantes utilizam a função metalingüística
inconscientemente no momento em que fazem averiguação sobre
o significado das palavras. É um instrumento científico
utilizado pelos lógicos e lingüistas, desempenhando, igualmente,
importante função em nossa linguagem cotidiana. No processo
de aquisição da linguagem materna esta função
é muito empregada pelas crianças no momento em que pedem
informações sobre o léxico.
A afasia é considerada como uma perda da capacidade de realizar
operações metalingüísticas.
Função Poética (centrada na mensagem) – Jakobson
definiu a função poética como sendo aquela em que
a mensagem se volta sobre si mesma, passando a evidenciar os próprios
signos, logo destacando o seu todo: significante e significado. Jakobson
não centra a oposição da função poética
na intencionalidade em produzir uma obra de arte, mas na inclinação
do emissor para a mensagem em si mesma. Para o autor, a poética
preocupa-se com os problemas da estrutura verbal. Pelo fato de a lingüística
ser a ciência global da estrutura verbal, a poética é
vista como parte integrante da lingüística.
Diz Holenstein (1978, p. 168):
Para Jakobson, a poesia constitui o campo onde descobriu e estudou os
mais importantes princípios da lingüística estrutural:
a autonomia da linguagem [...], o papel da apercepção ou
da orientação, a interdependência de som e sentido
e das estruturas prosódica (métrica) e gramatical, os dois
eixos da linguagem, a multiplicidade das funções lingüísticas,
etc.
Assim, não se pode reduzir a função
poética à poesia ou a poesia à função
poética – seria uma simplificação excessiva
e enganadora.
A função poética utiliza a seleção
(paradigmática) e a combinação (sintagmática),
sendo que o princípio de equivalência do eixo de seleção
é projetado sobre o de combinação. A seleção
é baseada na equivalência, semelhança, dessemelhança
sinonímia e antonímia; a combinação se baseia
na contigüidade.
É oportuno acrescentar que para Kloepper (1984) o uso poético
da língua – e isso ele diz atentando para a linguagem cotidiana,
apresentando o discurso comum como cheio de linguagens e figuras –
“existe sempre e especialmente nas situações de comunicação
mais correntes” (Kloepper, 1984:17).
Ainda o mesmo autor (1984:31), defende a posição de que
a poética, servindo-se dos resultados da lingüística,
deveria “contribuir para que a competência comunicativa de
todos nós atinja o seu melhor desenvolvimento possível”;
ela surgiria como “desenvolvimento sistemático progressivo
das possibilidades latentes da linguagem corrente’’, que é
propriedade de todos. Essa ótica vai ao encontro do desenvolvimento
das reflexões. A aprendizagem “poética” ocorre
normalmente na aprendizagem da língua pela criança, e igualmente
em uso adulto normal. Assim sendo, ele recusa encarar a poesia como “aptidão
excepcional” que seria, então, privilégio de alguns.
O que se vê de especial nessa concepção é o
seu fundamento: a própria faculdade humana de linguagem ( essa
aptidão em transformar coisas em signos) ou seja faculdade de semiose
-, e não, especificamente, as possibilidades escritas em código.
Em resumo, são as seguintes posições analisadas por
Kloepper (1984, p. 30 ss.):
1) a linguagem poética é uma sublíngua entre outras;
2) a linguagem poética é uma língua secundária
e derivada (“desvio”) e, relação à língua
comum;
3) a linguagem poética é uma das linguagens possíveis,
distinguidas entre si pela função, pelo contexto social
e outros critérios (posição de JAKOBSON, 1963), para
quem a função poética é de competência
lingüística;
4) a linguagem poética contém a língua “normal”
e as outras sublínguas (aqui, a Poética englobaria a Lingüística);
5) versão modificada desta última: a linguagem poética
é concebida como a manifestação da totalidade do
código lingüístico de que o indivíduo dispõe.
Kloepper (1984) defende, portanto, o retrocesso constante à manifestação
lingüística do dia-a-dia – o falante usa o código
como matéria-prima para a invenção semiótica.
Isso significa, transportando essa posição para a prática
pedagógica, aproveitar e reaproveitar os usos cotidianos da linguagem,
valorizando-os, para em seguida entrar pelos caminhos dos desenvolvimentos
mais complexos, devendo-se admitir, então, uma escala em crescendo.
A literatura é portadora de uma linguagem carregada de significados,
permitindo releituras e oferecendo novas visões para os leitores.
É certo que cada um lê de acordo com seu conhecimento de
mundo. Precisamos resgatar o ouvir poético, a poesia do texto,
o encantamento da palavra visando ao despertar da sensibilidade das crianças,
envolvendo-as numa comunidade de leitura prazerosa.
A escola deve oferecer aos alunos um espaço onde esteja presente
uma linguagem carregada de magia, possibilitando uma relação
entre o pensar e o sentir, uma relação mais sedutora com
a palavra, com a poesia. Roland Barthes fala-nos da escritura em seu aspecto
de imagens que sugerem formas, cores e significados, onde as palavras
não são mais concebidas ilusoriamente, como simples instrumentos,
mas são lançadas como projeções, explosões,
vibrações, maquinarias, sabores: a escritura faz do saber
uma festa.
A qualidade dos textos é fundamental. A poesia para crianças,
assim como a prosa poética, tem que ser de primeiríssima
qualidade, bela, movente, prazerosa, cutucante, surpreendente, bem escrita...
Deve-se selecionar poetas que brincam com as palavras, tornando-as sedutoras.
A beleza da imagem deve misturar-se à cadência, ao ritmo
das palavras.
A familiaridade com textos poéticos de forma divertida e significativa
leva a criança a perceber o encanto da poesia. Não sendo
esta mais do que uma brincadeira com as palavras, onde cada palavra pode
e deve significar mais de uma coisa ao mesmo tempo.
O educador deve instrumentalizar as crianças para que cada uma
construa o seu próprio percurso e vá se transformando leitor.
É fundamental que o professor seja apaixonado pela poesia para
que possa transmitir paixão e desejo para as crianças, seduzi-las
poeticamente. A linguagem poética é essencial, no âmbito
escolar, a serviço do desenvolvimento da criança. O pensar
e o sentir devem ser valorizados e percebidos em toda sua dimensão.
Enfim, a linguagem poética só realiza sua função
de poesia pura quando apresenta uma maneira inesperada de dizer as coisas.
Poesia vem do grego e quer dizer composição, pintura, expressão
artística. Lisboa (1964), diz que: “É a arte verbal
de comunicar experiências inefáveis”. A poesia, que
foi chamada a música das grandes almas por Voltaire, é um
gênero literário aprimorado e distinto, quer pela originalidade
de sua criação, quer pela beleza de sua forma.
Poesia é autenticidade, emoção e beleza. É
forma, ritmo, som, graça, é pura intuição,
emoção que se exterioriza, que se substancializa, que se
transforma em realidade. Quanto mais intenso o sentir do poeta, mais profunda
a sua intuição, mais rítmica a sua linguagem, mais
ricas suas imagens.
Mas afinal, qual a diferença existente entre poema e poesia? Eis
a resposta. Poesia é intuição que atinge um mundo
de perspectivas diferentes, é mais emocional que intelectual. É
uma forma especial da linguagem que está mais dirigida à
imaginação e à sensibilidade do que ao raciocínio.
Quando o poeta se sente compelido por uma grande emoção,
a poesia é autêntica. Ela é o reflexo da psicologia
de povos e de épocas; de filosofias e de credos; da maneira de
pensar e de sentir dos homens através dos tempos.
Segundo Aristóteles (1979):
(...) não é ofício de poeta narrar
o que aconteceu; é sim, o de representar o que poderia acontecer,
quer dizer: o que é possível segundo a verossimilhança
e a necessidade. (...) a poesia é algo de mais filosófico
e mais sério do que a história, pois refere aquela principalmente
o universal, e essa o particular. (...) Daqui claramente se segue que
o poeta deve ser mais fabulador que versificador; porque ele é
poeta pela imitação e porque imita ações.
Um poema não é apenas poesia porque tem
rimas, formas fixas, aparência de verso. Poemas são imagens
da realidade, numa apresentação rica de significados completos
em seus aspectos essenciais. São velhas idéias, valores
universais, modo de sentir em novas perspectivas. O poeta revela-nos as
mais simples experiências sob outros prismas, valorizando-os, penetrando
no âmago das coisas e no recôndito do coração
humano. Encontramo-nos na poesia e, muitas vezes, podemos recriá-la,
porque reflete nosso mundo interior, nossas emoções, nossos
ideais. A verdadeira poesia é a manifestação concreta
e artística da alma humana em todos os seus refolhos.
Poema é o objeto poético, o texto onde a poesia se realiza.
É uma forma como o soneto, que tem dois quartetos e dois tercetos,
ou quatorze versos juntos, como é conhecido o soneto inglês.
Um poema seria distinto de um texto ou de estrofes. Quando essa nomenclatura
é definitiva, é eliminada, passando um texto a ser apresentado
em forma de linhas corridas, como usualmente se conhece a prosa, podendo
ser chamada de poema-em-prosa, desde que tal texto apresente um algo mais
poético, ou seja, mais expressivo, menos referente à realidade.
Deste modo, o poema destaca-se pelo modo de como se dispõe na página.
Cada verso tem um ritmo específico e ocupa uma linha. O conjunto
de versos forma uma estrofe, e a rima pode surgir no interior dessa estrofe.
A organização do poema em versos pode ser considerada um
traço distintivo mais claro entre o poema e a prosa.
Os poetas têm escrito poemas de vários tipos. Dois deles,
entretanto, são considerados os principais: o poema lírico
e o poema narrativo. Alguns críticos e ensaístas acrescentam,
como um terceiro tipo, o poema dramático.
O poema lírico é geralmente curto. Muitos carregam grande
musicalidade: ritmo e rima, às vezes, os fazem parecer canções.
No poema lírico, o autor expressa sua reação pessoal
ante as coisas que vê, ouve, pensa e sente.
No que se refere ao poema narrativo, ele conta uma história e geralmente
é mais extenso que os outros. O poeta apresenta ambientes, personagens
e os acontecimentos lhes dão uma significação. Um
exemplo de poema narrativo é Os Lusíadas, de Luís
de Camões. As epopéias e as baladas estão entre os
principais tipos de poesia narrativa. Costumamos pensar que as fábulas
são trabalhos em prosa, mas muitas delas foram escritas originariamente
como poemas narrativos.
Quando se trata do poema dramático, é conveniente salientar
que, como o poema narrativo também conta uma história e
é relativamente longo. Porém, essa história é
contada através das falas dos personagens. As peças de teatro,
escritas em verso, constituem forma de poesia dramática. Em sentido
amplo, pode ser considerado um exemplo o “Caso do Vestido”,
de Carlos Drummond de Andrade. Através de uma suposta conversa
entre mãe e filhas, o leitor acompanha uma história de amor
e traição e tem os elementos para reconstruir o caráter
e os sentimentos dos personagens principais.
Ao escrever estes tipos de poemas, na transmissão de idéias
e sensações, o poeta não se apóia unicamente
no significado exato das palavras e em suas relações dentro
da frase. Ele utiliza, sobretudo, os valores sonoros e o poder sugestivo
dessas mesmas palavras combinadas entre si.
O texto poético é um espaço de grande riqueza e amplitude,
capaz de permitir a liberação do imaginário e do
sonho das pessoas. É preciso que o fato poético esteja muito
presente e seja bem trabalhado pela escola, para que o universo escolar
possa romper o tédio e a indiferença com que muitas vezes
se vê recoberto. E isso é possível visto que, através
da poesia, se desenvolve também a criatividade.
Sobre isso, WILLEMART ( 2002,– Revista Super Interessante, p. 53-54
), afirma:
A criatividade exige uma capacidade de questionar todo
o quadro de possíveis significados existentes, sobre uma determinada
matéria, a fim de propor conceitos novos. Isso exige um distanciamento
daquilo que foi aprendido e incorporado. Os criadores levam em conta o
que foi feito antes, mas não assumem uma atitude resignada. Querem
abrir outras portas.
Na verdade, existe um certo preconceito em relação
à poesia, baseado no senso comum, e que permeia a família,
os grupos sociais e a própria escola. Alguns acreditam que mexer
com a poesia é “perda de tempo”. Outros, por não
perceber o poder de encantamento dos poemas e por não disporem
de condições mínimas de análise – que
lhes permitam estudar e entender essa matéria-prima tão
especial e que se configura por um refinadíssimo trabalho com as
palavras – preferem fugir do poema.
A poesia propriamente dita nunca teve a pretensão de inserir-se
num “mercado”, pois o seu papel principal é o de aglutinar
idéias, ações, reunir os poetas e os apaixonados
pelo fazer poético.
O trabalho literário oriundo da poesia vai muito além dos
limites de um “mercado” concebido, muitas vezes, com o intuito
de lucro comercial. A importância da poesia consiste primordialmente
em levar alegria, arte, conhecimento e criatividade nos espaços
possíveis, onde a força da oralidade empregada aos versos
seja recebida com graça e resistência, para que a nossa poesia
possa ecoar além dos limites do tempo.
Isto é estar acima das frágeis concepções
mercadológicas que só atendem aos especuladores da arte
literária, pois são vários os mortos-vivos que perambulam
por aí, só para satisfazer os interesses deste mercado que,
muitas vezes, não passa de engrenagem reguladora do sistema formado
por algumas editoras que a muito negam aos leitores as novas criações
que transformam comportamento, atitudes e linguagem.
Portanto, a poesia deve estar presente na escola como todos os outros
tipos de textos, pois pode apresentar experiências humanas de conhecimento
que devem ser mostradas e consideradas. A poesia nem é só
cópia do real, exercício da linguagem ou fantasia. Ela é
um jogo de aproximação e afastamento do real onde aparecem
as sensações, emoções, sentimentos, idéias
e imaginação misturados à realidade do cotidiano.
É importante colocar o aprendiz em contato com a poesia, para que
ele possa reconhecer as sutilezas deste tipo de texto e aprecie as construções
literárias.
Vivemos num tempo confuso, perturbador e paradoxal em que as certezas
deram lugar às dúvidas e os dogmas, às sempre renovadas
interrogações. Tudo o que parecia ser perene, tornou-se
fugaz e efêmero, a ponto de a moda, segundo Coco Chanel - é
o que passa de moda - ter adquirido, graças à complexidade
massificadora da “mídia”, o estatuto de grande arte.
Este é também um tempo em que, como afirma Landi - diretor
de publicidade da Benetton - as crianças deixaram de ser consideradas
como os adultos de amanhã, para se transformarem em instrumentos
dos adultos de hoje. As crianças tornaram-se mercadorias, como
praticamente tudo o resto, numa sociedade regida pelas implacáveis
leis do mercado, verdadeiramente romanas na sua voracidade circense. E
é essa voracidade e essa sede de lucro que se explicam o motivo
de que as crianças sejam vendidas pelos adultos às televisões,
às poderosas máquinas do “marketing” industrial
e às agências de publicidade, transformadas em mercadorias.
Ninguém se atreve a falar, neste caso, em exploração
do trabalho infantil, prática reconhecidamente ilegal, que pode
penalizar gravemente pais e empresários noutras circunstâncias.
Aquilo que os adultos mais e melhor têm feito pelas crianças,
nestas duas últimas décadas de vida da feroz sociedade de
consumo, tem sido transformá-las em consumidores e, acima de tudo,
em consumidores especiais. Por quê? Porque são aqueles a
quem, em nome do afeto, não se consegue dizer não e praticamente
nada se recusa, sob pena de podermos ficar privados do seu amor e da sua
atenção.
Poder-se-á perguntar o que é que tudo isto tem a ver com
a poesia e com a relação que se supõe que mantêm
com o imaginário da infância. Existe uma forte relação
entre uma coisa e a outra, sobretudo porque a criança não
renuncia - nem pode renunciar - à prática criativa e transgressora,
que costuma ter com a linguagem, desde a mais tenra idade, e porque a
poesia, neste caso os poetas e os divulgadores e estudiosos da poesia,
não podem abrir mão daquele que é o grande tesouro
do dizer poético: a infância, com os seus sons e os seus
sentidos, com os seus enigmas e mistérios, com os seus medos e
inquietações, que são de hoje e de todos os tempos.
Vivemos em sociedades em que a programação televisiva já
é calculada em função do público infantil,
dos seus desejos e sonhos, apostando naquilo que é de consumo fácil
e imediato, não obrigando a pensar, a imaginar e a problematizar.
As crianças chegam à escola com cerca de quatro mil horas
de televisão já assimiladas, sabendo-se que a parte mais
substancial dessa programação se caracteriza pela violência
das imagens e das bandas sonoras, principalmente no caso dos produtos
procedentes de países como o Japão, que continua a deter
uma das mais elevadas taxas de suicídio infantil e juvenil na escala
mundial.
São cada vez mais as perguntas a que só a poesia é
capaz de dar resposta, pois aquilo a que Morin chama o “estado poético”,
por contraposição ao “estado prosaico”, é
a única via verdadeiramente eficaz para reconciliar a criança
com o que é simbólico, mítico, primordial e profundo
na sua maneira de estar e de ser. Do outro lado, estão a linguagem
e o pensamento práticos de todos os dias, caracterizados pela sua
previsibilidade e normalização, pela falta de imaginação
e pela penúria vocabular.
A poesia continua a ser, tanto para as crianças como para os adultos,
a linguagem natural dos “ses” e dos “porquês”,
a linguagem da interrogação desafiadora e da dúvida
inquiridora, que não se rende à hegemonia da máquina,
ao império da técnica e à lógica devastadora
do lucro que conduz ao sistemático e hoje verdadeiramente obsceno
esmagamento do “ser” pelo “ter”.
Permitam-me que aqui me socorra das palavras sábias de Jean (1996)
quando escreve: “Penso que qualquer atividade poética dedicada
às crianças e aos adolescentes é dupla: a poesia
escuta-se, lê-se, diz-se e escreve-se. A relação entre
as práticas de leitura e as práticas de escrita é
indivisível, dialética. Qualquer leitor de poesia reescreve
mentalmente o poema que lê ou que escuta e deseja quase sempre escrever,
também ele, para si próprio e para os outros”. E noutra
passagem do seu livro “Na Escola da Poesia” afirma:
A arte em geral, a música, as artes plásticas
e a dança para certas pessoas e, segundo creio, a poesia para todos,
não existe unicamente para a contemplação, a escuta
ou a leitura: todas são apelos à criação e,
em primeiro lugar, à criação da própria pessoa.
(...) A escola da poesia é justamente uma escola deste tipo, em
que o espetáculo da natureza, dos seres, invade os domínios
do imaginário. Escapa (ou deveria escapar) a todas as restrições
institucionais. Em contrapartida, é lá que se aprende no
corpo, na sensibilidade, na inteligência, bem como na imaginação,
que a liberdade da linguagem se conquista, que a memória se cultiva
e que a criança e o adolescente, ao defrontrarem-se com a poesia,
aprendem a concentrar-se na sua intimidade e a abrir-se aos outros na
e através de uma linguagem que tanto oculta o que eles dizem como
o revela. Convido os leitores para esta escola onde ainda hoje me encontro
e onde aprendi tanto sobre as crianças e os jovens desta época
difícil a apaixonante. (JEAN, 1996)
Nesta batalha, conquista-se um espaço para a poesia,
concretamente deixados às crianças na escola, em casa e
na sociedade, para que possam perceber a sua relação com
o mundo, com a linguagem, com a memória e com o que é verdadeiramente
estruturante e definitivo na sua identidade.
Os poetas que escrevem para todas as idades, principalmente para a infância
e juventude, devem celebrar um pacto de cumplicidade, de respeito mútuo
e de recíproca aprendizagem com os seus leitores mais novos, nunca
deixando nenhuma porta fechada, nem qualquer caminho vedado às
revelações que, a qualquer momento, podem surgir de qualquer
dos lados. Essas revelações, quase sempre verbalizadas ou
verbalizáveis, não costumam fazer avisos prévios
ou enviar mensageiros para anunciar a sua chegada. Chegam e pronto, passando
a pertencer a quem tem clarividência e sensibilidade bastantes para
compreendê-las em toda a sua profundidade e extensão.
Acredito que a criança, enquanto não é privada do
sentimento mágico da vida, possui um potencial poético significativo,
o qual pode ser detectado, por exemplo, na forma como constrói
e entende a metáfora e a sua função na poesia. Por
isso, as palavras do poeta inglês Ted Hughes confirmam, em “O
Fazer da Poesia”, que:
em relação à auto-expressão,
há em todas as crianças um talento latente e incomensurável.
(...) Pode ser que isto não seja verdade e, mesmo que o fosse,
não seria possível aos professores enfrentar as crises psicológicas
e as longas mortificações que estão na origem da
genialidade que, só por si, se distingue da mente comum. Mas ao
mostrar à imaginação de um aluno que as possibilidades
de avançar são muito maiores do que os obstáculos,
incutindo-lhe confiança e fazendo-lhe ver que a escrita uma coisa
natural, é possível que alguma coisa da nossa genialidade
comum - talvez não muito, mas alguma coisa - possa aparecer.
A vocação poética da criança
não deve ser subestimada, mas também não pode nem
deve ser supervalorizada, sob pena de se estar a banalizar o conceito
de talento poético e de se ter uma visão redutora da importância
que tem a leitura e o trabalho com a linguagem, para que o instinto poético
seja confirmado pela obra que um dia ganhará corpo.
O jeito para escrever poesia tende a transformar-se, muitas vezes por
falta de exigência crítica da parte de quem avalia, num ornamento
ligeiro e superficial da vida familiar ou da escolar, contribuindo para
estrangular no ovo aquilo que, com labor, poderia vir a transformar-se
numa voz própria e estimável.
O sentido poético da criança deve ser desenvolvido através
daquilo que designa por “detonadores” e que são os
estímulos de afeto e compreensão do seu trabalho e da sua
vocação, que devem surgir no contexto parental, escolar
e social. Assim, devidamente enquadrada e contextualizada, a poesia pode
converter-se num poderoso motor para fazer do imaginário das crianças
de hoje uma fonte inesgotável. E para que serve essa fonte? Serve,
sobretudo, para que a criança nos dê a certeza e a tranqüilidade
dela resultante, de que, ao crescer, não permitirá que a
tecnologia ou a normatização, hoje impostas pelas várias
formas de globalização, façam dela um adulto incapaz
de sonhar, de se recrear com a linguagem, de transgredir e de desafiar,
através do uso de um léxico que escape aos cânones
redutores da normalidade social.
Quando crianças e jovens iniciam a escrita criativa, o processo
alquímico se desencadeia, de forma luminosa e imparável,
à medida que os mesmos conseguem verbalizar de forma poética
sentimentos, sensações, medos e anseios que povoam o seu
quotidiano. Ao fazerem essa descoberta, tornam-se verdadeiros iniciados
nessa arte mágica de dar às palavras sentidos e significados
que o nosso falar comum segrega e marginaliza.
Acredito que tem deve haver saída para este tempo de crise e de
vazio de valores referenciais e que a cultura seja um meio poderoso para
a superação dessa crise e desse vazio. O trabalho poético
das crianças, com as crianças e para as crianças,
tem um papel crucial, não só na dignificação
da função da linguagem no seu ato de comunicar, mas também
na reinvenção dessa linguagem dentro de parâmetros
fixados pela imaginação, pela criatividade e pela liberdade.
Quando se remete à liberdade, a escrita criativa é cada
vez mais um ato de libertação, de indignação
e de reinvenção do real.
É preciso ser pessimista na razão, para se poder ser otimista
na ação, e a nossa ação passa e continuará
a passar pela poesia, a mais livre de todas as liberdades que, ao longo
dos milênios, nunca se rendeu ante o obscurantismo, o terror e o
silêncio impostos. Sempre que ela vence uma batalha, é toda
a humanidade, a curto e a longo prazo, que fica em condições
de colher os frutos.
Antes dos anos sessenta, conforme pesquisa de alguns estudiosos, o que
era mostrado nas escolas eram os textos correntes de poesia, que não
se voltavam para uma estética verbal mais própria aos alunos.
E o trabalho escolar sobre os referidos textos era quase todo voltado
à obtenção e aplicação de regras moralistas
e didáticas a partir dos poemas.
Muitos poetas como: Vinícius de Moraes, Cecília Meireles,
Mário Quintana, Fernando Pessoa e José Carlos Paes escreveram
poesias para os alunos. De modo geral, apesar disso, a poesia continua
não sendo bem tratada nas escolas em razão de preconceitos
e distorções já citados. Além disso, o professor
nem sempre está preparado para realizar um trabalho com poemas,
a partir de características e critérios próprios
desses textos.
Assim, é freqüente verificar-se que, na escola, ao invés
de boa parte dos professores se deter nas formas artísticas, no
que a poesia tem de lúdico, nas imagens, eles se apegam aos poemas
para deles tirar exemplos de situações gramaticais, as mais
diversas, que constam em seus programas e devem ser trabalhadas. Ensinar
a gramática é fundamental, mas sem que para isso seja necessário
triturar um texto poético.
Situações dessa natureza, além de violarem a especificidade
da poesia, conseguem ainda impedir não só um real contato
do aluno com o poema, mas também o refinamento do mundo da poesia.
Embora a poesia não deva ser usada para ensinar alguma coisa, desperta
no aluno o desejo de obter informações sobre o tema tratado
e o professor pode e deve aproveitar a motivação do aluno.
Trabalhar a poesia com alunos adolescentes é tarefa das mais gratificantes,
pois traz ao professor inúmeras surpresas agradáveis. O
adolescente tem muita imaginação e criatividade e se o trabalho
for realizado com seriedade, entusiasmo e vontade, o aluno responde de
forma criativa, escrevendo poemas que nem sempre são verdadeiras
obras de arte, mas que trazem bom retorno tanto para o aluno que descobre
a possibilidade de criar novas linguagens, como para o professor que se
sente realizado ao perceber que transformou sua sala de aula no campo
da descoberta, da invenção e da fantasia.
A poesia que atinge o adolescente é aquela que tem como cenário
o mundo jovem, que fala de sentimentos, realidade do mundo em que vive,
mostrada de modo diferente e até divertido; poemas que não
sejam apenas com o objetivo de trabalhar a gramática, que poderá
estar contextualizada, mas comoventes e que vão de encontro ao
mundo de sonhos e angústias dos alunos dessa faixa etária.
É importante também que o poema possua algumas características
externas, como a sonoridade, versos curtos, distribuídos em estrofes
que facilitem a rima. A linguagem deve ser clara, simples, com imagens
de fácil compreensão, aproximada da linguagem coloquial.
Tudo isso vai contribuir para sensibilizar o aluno, ampliando o domínio
da linguagem e, conseqüentemente, sua capacidade de construção
e conhecimento do mundo.
A imaginação está ligada diretamente aos órgãos
sensoriais, pois é constituída de imagens, sensações
e percepções. Além disso, forma-se com a história
de cada um, ao longo da vida. O imaginário está sempre em
ação, é volúvel e permanece mais no plano
abstrato.
A imaginação implica em um pensamento mais elaborado, alimentado
pelo instável imaginário. Portanto, “todos nós
temos um imaginário, mas nem todos temos imaginação”
(Jean-Luc Aubert, 1991).
Ter imaginação é ver de modo diferente o que acontece
na realidade. Escrever uma poesia exige uma prática de cultivar
o imaginário, enriquecendo a capacidade de conhecimento, vendo
o mundo melhor e entendendo-o dentro de uma visão de duplos sentidos.
A poesia contribui para explorar o real e o imaginário, permitindo
transformações no real, modificando-o. Na construção
do poema o aluno explora esses dois ícones do fazer poético,
desde que sejam criadas condições favoráveis para
que as formas poéticas possam se concretizar.
Portanto, é preciso que um meio estimulante derrube tabus, ao mesmo
tempo que forneça os meios lingüísticos necessários.
De acordo com SALOMON ( 1986 ):
A imaginação não é uma evasão,
uma fuga, um refúgio fora do real, mas sim, um olhar diferente
sobre o real (...) A imaginação é uma energia transformadora,
uma fábrica que transforma a realidade, decanta-a, enriquece-a,
assim como se transforma uma matéria-prima num produto acabado...
Contudo, o real e o imaginário vão compor
o despertar da curiosidade, a aquisição de novas idéias,
o enriquecimento do vocabulário, o pensar reflexivo e a expansão
e expressão de sentimentos através do fazer poético.
Constatar que as crianças, de um modo geral, são poetas,
significa levar em conta a experiência lingüística,
lúdica e poética que possuem, antes mesmo de entrarem para
a escola, como experiência reveladora pela oralidade, pela sonoridade
e pelos jogos de palavras que criam, passando a constituir seu repertório
presente nas cantigas, nas quadrinhas rimadas, ritmadas e em outras criações
verbais tão próprias dessa fase de suas vidas.
Neste sentido, e na perspectiva do letramento, é importante reconhecer
a força da oralidade no desenvolvimento lingüístico
da criança. Associando o jogo à iniciação
literária, Magalhães (1987) considera que a poesia infantil,
lida ou ouvida, parece oferecer um meio de remediar a brusquidão
provocada pela ruptura entre o ludismo infantil e a iniciação
no código verbal, com a entrada para a escola.
De fato, quando ingressamos na escola, dificilmente somos estimulados
a ouvir e ler poemas. O texto serve de trampolim, na maioria das vezes,
para o estudo de vocabulário, regras gramaticais e de estilo.
A afetividade que existe na relação da professora com as
crianças menores, na escola, é decisiva para introduzí-las
no mundo fantasioso e emocionante das histórias, dos poemas, dos
jogos, das cantigas, dos brinquedos folclóricos e de músicas
acessíveis à sensibilidade infantil. Educador e criança
farão parte de uma mesma realidade que integra os sentidos, as
idéias, as fantasias e as emoções.
Assim os professores, desde a Educação Infantil, devem ser
sensíveis durante a experiência escolar, à manutenção
da espontaneidade poética e à abertura para o jogo sonoro
e semântico que tanto as crianças apreciam. E para evitar
que ocorra aquela ruptura entre Educação Infantil, Alfabetização
e o Ensino Fundamental, essa sintonia com a apreciação poética
deve permear todo o trabalho com a linguagem na escola. Para tanto, há
que se construir o ser poético também em adultos e educadores
que não tiveram contato mais estreito com a poesia.
Vários autores têm escrito poesia para crianças sobre
os mais variados temas: família, infância, brincadeiras,
animais, meio ambiente, etc. Inovando quanto ao destinatário de
seus poemas, Lalau e Laurabeatriz, em Brasileirinhos: poesia para os bichos
mais especiais da nossa fauna, criaram e ilustraram belos poemas, nos
quais mostram sua preocupação com a extinção
de certos animais. Por isso, dedicam-lhes breves poemas, num gesto de
sensibilização do leitor infantil para com esses animaizinhos,
a quem chamam de Brasileirinhos. O que fazem é um verdadeiro elogio
às espécies ameaçadas de nosso país. A exemplo
temos a Arara-azul.
Além de despertar a consciência acerca de um assunto tão
pouco explorado, a necessidade de sensibilização para questões
ecológicas, que deve estar presente desde a infância, o leitor
tem a oportunidade de observar e comparar dois gêneros de texto,
colocados na mesma página, tratando de maneira diferente o mesmo
tema. Isto enriquece a leitura e a compreensão dos textos escritos,
sua estruturação, seu estilo.
Em geral, a poesia se dá a conhecer na escola, permitindo a crianças
e professores sintonizar-se com a linguagem literária. Além
disso, desafia-se a criança para o exercício de alguns procedimentos
de um leitor que se vem letrando gradativamente, aquele que levanta hipóteses,
interroga o texto e se interroga, mobilizando estratégias para
melhor compreender, sentir e dizer o texto poético. Mais ainda,
as práticas orais que resgatam as parlendas, os trava-línguas,
as quadrinhas e cantigas de roda, bem como a leitura, para e pelas crianças,
de poesias de autores como Henriqueta Lisboa, Cecília Meireles,
Vinícius de Moraes, Maria Dinorah, Sidônio Muralha, Sérgio
Capparelli, Mario Quintana, Elias José, Roseana Murray, Lalau,
José Paulo Paes, Bartolomeu Campos Queirós, dentre outros,
devem estar presentes no cotidiano escolar. A própria literatura
de Drummond e de outros poetas, voltada para adultos, também pode
ser lida por crianças e adolescentes com prazer e encantamento.
Na poesia dos autores mencionados, a unidade rítmica e melódica
dos poemas, as figuras fônicas (aliteração, ritmo,
etc.), os recursos imagéticos responsáveis pelo deslocamento
de sentido das palavras em direção ao inabitual, desafiam
o leitor para o exercício criativo da imaginação
(MELLO, 1987) e o gradativo domínio da linguagem.
A literatura compreende textos de um modo geral mais polissêmicos
e polifônicos do que os textos de outras áreas de conhecimento.
Polissêmicos porque são passíveis de muitas leituras,
dependendo da história de vida do leitor, de seus interesses, apreensões
e assim por diante. Polifônicos porque, na voz do autor, estão
vozes de outras pessoas, de outros autores, da sociedade, da história.
A literatura demanda modos de leitura que levam o leitor a aprofundar
suas competências. Ao buscar ler nas entrelinhas, atribuir novos
sentidos para os textos, conhecer formas mais livres de ação
na realidade, conhecer novos sistemas de referência do mundo, o
leitor pode perceber-se como sujeito capaz de transformar a realidade,
participando dela de forma mais íntegra, mais crítica.
Para que se faça uma boa leitura de um poema, é preciso,
primeiramente, que a criança seja estimulada a ter o gosto pela
leitura, pela apreciação, despertando-lhe a sensibilidade.
Cabe ao professor a tarefa de fazer com que tudo isso aconteça,
partindo de si próprio. Em sua apreciação com a criança,
o professor poderá deter-se em alguns aspectos, como: no extrato
sonoro, na estruturação lingüística, nos recursos
estilísticos e, sobretudo, na imagem e na metáfora.
O professor precisa conhecer a poesia, os elementos que a tornam bela,
verdadeira, uma obra de arte. Além desse conhecimento, desse convívio
com a literatura, há que se referir à apresentação
de um poema às crianças. Há de lê-los muitas
vezes, em voz alta para si mesmo, compreendê-lo, amá-lo.
Somente aprendendo a mensagem poética em seus múltiplos
sentidos, apreciando-a na sua estrutura, na sua significação
e no seu valor, poderá transmiti-la. Cada poema é recriado
pelo professor que revive a emoção, a experiência
do poeta. É preciso saber dizê-lo. É pela voz, pela
expressão que vai mostrar tudo que o poeta quis dizer, interpretando
as atitudes e com ele se identificando.
As crianças conhecem o poema primeiro pelo ouvido, depois pelos
olhos. Ouvindo-os, aprenderão a amá-los e guardá-los
no coração. Partilhar um poema com as crianças é
apreciá-lo naquilo que ele tem de mais profundo, mais significativo.
É despertar a classe para as múltiplas formas de beleza,
para as experiências variadas, abrindo perspectivas para o inefável
prazer estético. É estimular-lhe a imaginação,
fazendo-lhe ver as coisas conforme o poeta viu, por meio de suas palavras
que se transformam num toque de magia. Assim, o que se deseja é
conduzir o aluno ao fascinante mundo da leitura como tal e da leitura
literária, que é a modalidade mais atraente de formar o
futuro leitor.
São critérios para classificação: seqüência
temporal, não-simultaneamente das ações; relações
de causa e efeito; predomínio da ação sobre a caracterização;
tradução da ação por recursos morfológicos
(verbos, substantivos abstratos) capazes de exprimir movimento; possibilidade
de representação gráfica através de quadrinhos.
Desde que se inicia o processo da aquisição da linguagem,
brinca-se com a sonoridade das palavras e criam-se imagens que são,
muitas vezes, verdadeiras criações poéticas, sendo
que assim se tem uma relação afetiva e prazerosa com a linguagem.
Porém é através de diferentes formas de linguagem
– fala, gestos, desenhos – que se possibilita ao aluno a ordenação
de suas vivências. Sabe-se que a linguagem escrita é muito
menos expressiva que as linguagens que se adquire antes da alfabetização.
A linguagem literária é a única linguagem que se
caracteriza pela expressividade.
O significativo valor pedagógico da poesia foi descoberto aqui,
na tentativa de levar os alunos a lerem e escreverem mais e com maior
interesse, fugindo de modelos que provocam uma relação sem
afetividade e valorizando a linguagem emocional do ser humano, muitas
vezes esquecida. É maravilhoso poder estar em contato com a linguagem
poética, saber que nossas emoções estão escondidas
e que basta um simples toque para que ela aflore e mostre sua verdadeira
intenção. As crianças são capazes de fazer
tudo isso sem nenhum esforço, e dentro delas mora um coração
cheio de carisma, afetividade, amor, sinceridade, espontaneidade e muito
mais. Elas são verdadeiros poetas.
Para se fazer uma leitura poética são necessárias
algumas ferramentas e precisamos estar inteiramente motivados para fazer
uma leitura integrada ao poema, verificando seus passos e seus resultados.
Para o homem, a palavra se constitui no mais poderoso recurso de ação
e interação, pois expressar envolve a forma de organizar,
de interpretar, de vivenciar, de julgar e de ler o mundo. Uma vez que
o mundo de hoje é caracterizado por diferentes tipos de tensões:
a econômica, a cultural, a tensão tecnológica e a
tensão do coração. O coração, dentro
da cultura, é símbolo da sensibilidade e da luta, da fragilidade
e da força. O coração ama e sente-se amado, acolhe
e sente-se acolhido. Em meio a esse jogo recíproco de relações,
encontra-se a pessoa.
Esta pessoa, por sua vez, é um ser em constante relação,
que é estabelecida consigo mesma e com os outros na tentativa de
satisfazer as próprias necessidades, amadurecer e realizar-se.
Enfim, esta pesquisa respondeu aos meus anseios em relação
ao trabalho com a poesia nas escolas. Mostrou-me que é possível
desempenhar um bom trabalho com as crianças estimulando-as, envolvendo-as,
através de uma preparação de um ambiente atrativo
e mágico. Assim, elas um dia poderão ser grandes poetas,
uma vez que todos nós temos esse ser poético escondido.
Basta apenas que despertemos e envolvamo-nos.
Portanto, é necessário que as relações entre
professor e aluno sejam permeadas pelo afeto, na certeza de que construir
um novo modo de relacionar-se é uma arte, e que este fazer poético
está inserido dentro de cada ser.
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