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APRENDENDO
O FAZER DA ALFABETIZAÇÃO NO CURSO DE APERFEIÇOAMENTO
DO IE “PROF. STÉLIO MACHADO LOUREIRO” DE BIRIGÜI/SP
- 1963
Áurea Esteves SERRA - Faculdade de Filosofia
e Ciências- UNESP-Marília/SP - Faculdade de Ciências
e Tecnologia de Birigüi – FATEB – Birigüi/SP
Introdução
Visando contribuir para a compreensão da história
da formação do professor alfabetizador no Brasil, aborda-se
neste texto, um aspecto do modelo para essa formação implementado,
no IE “Prof. Stélio Machado Loureiro”, de Birigüi/SP,
que funcionou entre 1961 e 1976. Por meio da utilização
de procedimentos de recuperação, reunião, seleção,
organização e análise de fontes documentais e bibliografia
especializada relativas à formação do professor alfabetizador
no período em questão foi possível enfocar neste
texto a cartilha Vamos ao circo produzida pelas alunas do Curso de Aperfeiçoamento
“B”, sob orientação da professora Maria Ignêz
Villaça, no ano de 1963.
Do ponto de vista metodológico optou-se pela análise da
configuração textual que Mortatti (1999) propõe,
isto é, um procedimento metodológico adequado e relevante
para análise do material discursivo relativo à pesquisa
histórica em educação. Esse conceito é definido
pela pesquisadora da seguinte maneira:
O que confere singularidade a um texto é o conjunto de aspectos
constitutivos de sua configuração textual, a saber: as opções
temático-conteudistas (o quê?) e estruturais - formais (como?),
projetadas por um determinado sujeito (quem?), que se apresenta como autor
de um discurso produzido de determinado ponto de vista e lugar social
(de onde?) e momento histórico (quando?), movido por certas necessidades
(por quê?) e propósitos (para quê?), visando a determinado
efeito em determinado tipo de leitor (para quem?) (MORTATTI, 1999, p.
71).
Os resultados obtidos com a análise descritiva
dessa cartilha vêm confirmar a relevância do estudo para a
compreensão de um momento importante da história da formação
de alfabetizadores em nosso país, no qual predomina um modelo diretamente
relacionado com a inovação educacional nos institutos de
educação do estado de São Paulo, entre 1933 e 1976,
predominantemente baseados nos princípios do ideário da
Escola Nova.
1. Cartilha Vamos ao circo
1.1 As condições de produção da cartilha Vamos
ao circo
O IE “Prof. Stélio Machado Loureiro”, localizado na
cidade de Birigüi/SP, noroeste paulista, oferecia aos concluintes
do Curso Normal, o Curso de Aperfeiçoamento, destinado a formar
alfabetizadores. Com exceção de uma matéria, as demais
da grade curricular desse curso não recebiam uma denominação
específica para alfabetização, entretanto seu conteúdo
abordava os métodos de alfabetização e como se aprendia
a ler e escrever. Eram elas: Metodologia das Matérias do Ensino
Primário, Metodologia de Aritmética, Metodologia da Leitura
e Escrita, Prática de Ensino, Psicologia da Aprendizagem e Administração
Escolar.
Para se conhecer um pouco do fazer da alfabetização nesse
instituto, no Curso de Aperfeiçoamento, descrevo e analiso neste
texto uma cartilha confeccionada no ano de 1963, porque uma ex-aluna do
Curso de Formação de Professores Primários, Iraci
Fabri Sanches Bigélli dá continuidade aos seus estudos,
no ano de 1963, freqüentando o Curso de Aperfeiçoamento. E
nesse momento Iraci também exercia a função de professora
alfabetizadora, em uma escola localizada no bairro de Juritis, na zona
rural do município de Glicério/SP.
Como trabalho do Curso de Aperfeiçoamento “B”, de 1963,
do IE “Prof. Stélio Machado Loureiro”, as alunas produziram
uma cartilha fazendo uso de diversos tipos de material, como: papel, tinta,
lápis de cor, máquina de escrever, caneta preta, perfurador,
fita e carimbos. Esse trabalho foi desenvolvido nas disciplinas Prática
de Ensino e Metodologia da Leitura e Escrita, ministradas pela professora
Maria Ignêz Villaça, após um trabalho de pesquisa
sobre métodos de alfabetização e informações
e conteúdos ensinados pela professora nas aulas expositivas, com
objetivo de as alunas terem em mãos a cartilha para seu posterior
trabalho como alfabetizadoras, já que havia muitos questionamentos
sobre como alfabetizar e quais métodos utilizar.
Os métodos de alfabetização trabalhados pela professora
e de conhecimento das alunas, segundo as ex-alunas entrevistadas, eram:
os métodos de marcha analítica e os métodos de marcha
sintética.
Como se sabe, o método sintético consiste em uma “[...]
maneira de ensinar introdução à leitura começando
por partes ou elementos das palavras, tais como letras, sons ou sílabas,
para depois combiná-los em palavras” (HARRIS; HODGES, 1999,
p.185). O método analítico, consiste em uma: “[...]
maneira de ensinar introdução à leitura que começa
com unidades completas de linguagem e mais adiante as divide em partes,
dividindo, por exemplo, as sentenças em palavras ou as palavras
em sons; método global; método olhar-e-dizer” (HARRIS;
HODGES, 1999, p.182).
Quanto ao método misto (método analítico-sintético
ou vice-versa), conhecido também como “método eclético”,
este foi defendido por educadores brasileiros do século XX, baseados
em argumentos tais como os de Rafael Grisi citados a seguir:
1º ecletismo da solução intermediária,
que ele [método misto] representa, susceptível de reunir
as vantagens e excluir os defeitos dos dois, o que o torna recomendável
ao emprego urgente, ao menos a título provisório, enquanto
se aguarda a solução final do conflito das orientações
extremas;
2º a concepção de que análise e síntese
não são, na atividade mental, operações independentes
e opostas, mas ao contrário, intimamente ligadas entre si e complementares,
como dois aspectos de uma só realidade.
[...]
Numa época em que a Educação, deixando de ser obra
de empirismo e de instinto, entrou para o domínio científico,
a verdadeira “autonomia didática” é a ação
esclarecida pelo conhecimento. Fora disso, há ‘licença’,
“arbitrariedade”, não “autonomia” (GRISI,
1946 apud MORTATTI, 2000b, p. 194-195).
Segundo depoimento da professora Maria Ignês Villaça, o método
de contos de Margarida Mac Closkey segue os critérios de qualquer
outro método de contos: ao aluno é apresentada uma história
lida pelo professor, que, depois, destaca uma frase, uma palavra, até
chegar às sílabas ou às letras para formar novas
palavras.
Ainda segundo o depoimento da professora Maria Ignêz Villaça,
o método de contos de Margarida Mac Closkey é de origem
inglesa e foi apresentado na disciplina de Didática do Curso de
Psicopedagogia da PUC/SP, no ano de 1959, que essa professora freqüentou,
como aluna. Nesse curso, Maria Ignêz utilizou o livro do educador
cubano Alfredo Miguel Aguayo, Didática da Escola Nova, cujo exemplar
ela trouxe para Birigüi e usou-o em suas aulas no Curso Normal.
As ex-alunas-professoras entrevistadas afirmaram que o “método
de contos” era muito veiculado na época, porque a Editora
Abril Cultural havia distribuído muitas cartilhas que utilizavam
esse método. O método de contos, de Margarida Mac Closkey,
era também utilizado em outras cartilhas da época, como:
Lalau, Lili e o Lobo, de Rafael Grisi, e Mimi fugiu, de Alaíde
Lisboa de Oliveira.
De acordo com as ex-alunas, o “método de contos” era
o ideal para alfabetização, pois ao aluno era apresentada
uma história lida pelo professor que, depois, destacava uma frase,
uma palavra, até chegar às sílabas ou às letras
para formar novas palavras. Elas ainda disseram que as cartilhas mais
usadas na época eram a Cartilha Sodré , de Benedicta Stahl
Sodré, e Caminho suave , de Branca Alves de Lima. Afirmaram que
“não tinham escolha”, relatando que tinham dificuldades
para alfabetizar com essas cartilhas. Alegaram que deixavam de dar determinadas
lições dessas cartilhas, só retornando às
lições não trabalhadas quando elas achavam que era
possível o aluno assimilar o conteúdo e que as cartilhas
Caminho suave e Sodré, eram apenas um “texto de apoio”,
assim como os livros de literatura infantil, para alfabetizar.
Informaram, ainda, que:
[...] o início da aprendizagem se dava por palavras e sílabas.
Depois e que colocávamos um texto na lousa, em letra de forma,
usando palavras totalmente diferentes da cartilha. Então, líamos
o texto da lousa com as crianças umas três vezes, fila por
fila (alunos sentados em carteiras enfileiradas), em salteado, e elaborávamos
os exercícios: ‘tire do texto palavras começadas com”,
“faça uma nova frase” etc. e os alunos que tinham maiores
dificuldades eram alfabetizados com desenhos e sílabas; era uma
alfabetização diferenciada, trabalhávamos com os
alunos separados do restante da sala, a alfabetização era
quase que exclusivamente visual e auditiva (BIGÉLLI; NASCIMENTO;
SANCHES, 2002).
Observa-se pelo depoimento das professoras que no Curso
de Aperfeiçoamento elas estavam estudando o método de contos
e na sala de aula usavam cartilhas e que o método de alfabetização
trabalhado por elas era o “misto”, ou seja, analítico-sintético.
Vejamos o que afirma a professora Aparecida Bugiga do Nascimento , ex-aluna-professora
do IE “Prof. Stélio Machado Loureiro” no ano de 1963,
em seu depoimento:
Eu só fui fazer o Curso de Aperfeiçoamento,
porque eu dava aulas no sítio e quem fizesse [esse curso] teria
100 pontos para remoção; era a única forma de eu
sair da zona rural e vir para cidade. Mas confesso que eu e minhas colegas
aproveitamos muito o curso e aprendemos como lidar com crianças,
porque na escola normal só era ensinada teoria, fundamentos disso,
fundamentos daquilo, filosofia, sociologia, psicologia etc. (NASCIMENTO,
2002).
Quanto à cartilha, ela comenta:
Nós já éramos todas professoras e
a grande maioria trabalhava com alfabetização. E era muito
difícil ensinar o “b” e o “d” perto, nós
chegávamos a ficar de três a quatro semanas nas lições
e também não tínhamos uma diversificação
de atividades como se tem hoje. As cartilhas usadas eram: a Sodré
e a Caminho suave, mas me lembro que a mais usada era a Caminho suave
e as lições da “barriga” e do “dado”
eram muito próximas. Aí então resolvemos criar a
nossa própria cartilha, separando as mesmas. E mesmo antes de termos
a nossa cartilha nós já não ensinávamos essas
letras perto uma da outra. (NASCIMENTO, 2002).
.
As ex-alunas-professoras do Curso de Aperfeiçoamento ainda relataram
que os professores desse curso eram muito preocupados com a aprendizagem
delas, alunas, e elas, por sua vez, preocupadas com a aprendizagem de
seus alunos na escola primária. Elas, ainda, fizeram um comentário
avaliando a metodologia de ensino desenvolvida nas aulas do curso de aperfeiçoamento
como sendo “tradicional”, e que não tinham muitas alternativas,
pois, segundo elas, não havia os recursos que se têm hoje.
Essas ex-alunas-professoras, ainda, disseram que, normalmente, as aulas
das matérias Metodologia da Aritmética, Metodologia das
Matérias do Ensino Primário, Psicologia da Aprendizagem
e Administração Escolar ocorriam mais por meio de uma exposição
teórica do professor, sendo que o aluno, caso tivesse alguma dúvida,
poderia solicitar os esclarecimentos necessários durante a aula
com o professor; e nas matérias Metodologia de Leitura e Escrita
e Prática de Ensino as teorias eram aplicadas na prática,
durante os estágios na Escola Primária Anexa.
Ainda de acordo com as entrevistadas, a professora Maria Ignêz Villaça
era ótima, excelente em todos os sentidos. Sabia escolher o material
a ser trabalhado, sabia como explicar e como avaliar. Disseram, ainda,
que, com o Curso Normal e o Curso de Aperfeiçoamento do IE “Prof.
Stélio Machado Loureiro”, tiveram um embasamento, um suporte
muito bom para serem professoras primárias e alfabetizadoras. Depois,
quando freqüentaram o curso de Pedagogia, acompanharam-no tranqüilamente,
pois dominavam todos os conteúdos, uma vez que tinham freqüentado
o Curso Normal e o Curso de Aperfeiçoamento.
Para a professora Maria Ignêz Villaça, isso aconteceu porque
os alunos do Curso Normal e do Curso de Aperfeiçoamento do IE “Prof.
Stélio Machado Loureiro” eram alunos muito dedicados, atenciosos
e obedientes. E tinham consciência da necessidade de se tornarem
cidadãos respeitáveis, por meio de suas aulas, por isso
o grande empenho em serem excelentes alfabetizadoras.
1.2 Apresentação: Cartilha Vamos ao circo
A cartilha Vamos ao circo, produzida pelas alunas do IE
“Prof. Stélio Machado Loureiro” (1963), destinada ao
ensino da leitura e da escrita a crianças nas escolas da região
da cidade de Birigüi, é uma cartilha datilografada e manuscrita
e nunca chegou a ser impressa. Essa cartilha foi elaborada com a intenção
de ajudar as alunas do Curso de Aperfeiçoamento do IE “Prof.
Stélio Machado Loureiro” que tinham dificuldades com o ensino
da leitura e da escrita. Foram confeccionados 27 exemplares apenas para
as alunas-professoras da sala do Curso de Aperfeiçoamento “B”
e um para ser entregue à professora Maria Ignêz Villaça,
que me foi doada e que utilizo nesta análise.
Medindo 16 cm por 23 cm, a cartilha contém 23 lições
(não numeradas) que vão da página 1 à página
50. O conteúdo está dividido em lições e exercícios
de recordação.
Na capa do exemplar da cartilha manuscrita Vamos ao circo, há,
sobre um fundo laranja, ilustrações referentes ao título
da cartilha Vamos ao circo. O título é escrito em letras
manuscritas, sendo que a primeira letra sugere a forma do rosto de um
palhaço, com um chapéu azul de bolas vermelhas e colarinho
também na cor azul. A ilustração encontra-se do lado
esquerdo, logo acima da tromba de um elefante, desenhado logo abaixo,
em cima de uma base e tendo como fundo um gramado na cor verde clara.
“Vamos” encontra-se diagonalmente, “ao” está
sobre a ilustração de um circo pintado na cor verde, sendo
que, ao final de sua escrita, encontra-se a ilustração de
um trapézio, sob o qual está a figura de um macaco, que
tem uma das patas dianteiras segurando o trapézio e a outra apoiada
num fio preso à lona do circo.Uma de suas patas traseiras também
se apóia na lona do circo. A palavra “circo” encontra-se
escrita na frente da lona do circo e a letra “r” forma a porta
de entrada. Paralelamente ao gramado, também em diagonal, encontra-se
um caminho que leva ao circo, há algumas letras aleatórias
(“b”, “a”, “ca”, “ta”,
“ho”), escritas em letra de forma minúscula e manuscrita.
A capa, composta de animais e objetos que compõem um circo, é
um convite à imaginação.
Figura 1
Capa da cartilha Vamos ao circo

1. 3 Primeiras
páginas
Na folha
de rosto, há relacionado o nome das 26 autoras da cartilha, em
ordem alfabética, em letra manuscrita, na cor preta.
Na segunda folha de rosto, está escrito o título da cartilha
em letras manuscritas, na cor preta, e, no verso da página, há
uma dedicatória à professora Maria Ignêz Villaça.
Na terceira folha de rosto, há explicação do método
usado na cartilha: “método de contos criado por Margarida
Mac Closkey”, que consiste em quatro passos, que se encontram detalhados
nessa mesma página.
1.4 As ilustrações
A cartilha
é extensamente ilustrada, com 167 figuras de carimbos e desenhos,
pintados pelas autoras, alunas do Curso de Aperfeiçoamento “B”,
com lápis de cor e giz-de-cera.
Das 167 ilustrações, 52 são de animais (elefante,
macaco, foca, leão, camelo etc); 44, de objetos de uso doméstico
(xícara, jarro, faca, ralo etc); 25, de figuras humanas (menino,
menina, bailarina, trapezista, vovó, moça etc);13, de brinquedos
(dado, bola, balanço, xadrez etc); 5, de partes do corpo humano
(boca, cabeça, mão, dedo etc);4, de flores e legumes (rosa,
lírio, chuchu etc); 9, de vestimentas (chapéu, bota, vestido,
paletó etc);8, de lugares (circo e jardim); 8, de alimentos (sopa,
banana, gema etc).
Essas ilustrações relacionam-se com as palavras-chave, destacadas
nas lições, e as demais palavras utilizadas nas lições.
As ações representadas nas ilustrações são
relacionadas com o mundo do circo, a começar pela capa, que já
descrevi.
1. 5 O conteúdo
da cartilha Vamos ao circo
As 23 lições
seguem a ordem de palavras-chave apresentada nas lições:
“circo”, “bonita”, “Dudu”, “palhaço”,
“cavalo”, “elefante”, “leão”,
“cachorro”, “banana”, “girafa”, “urso”,
“tambor”, “zebra”, “foca”, “dançava”,
“Juca”, “aranha”, “xiloca”, “rainha”,
“garoto”, “laço”, “passeata”.
Apresenta-se uma ilustração correspondente a cada história,
onde, de uma palavra-chave, destacam-se mais duas palavras da família
silábica apresentada. Os textos encontram-se grafados em letra
de forma minúscula e datilografados. E, ao final de cada lição,
prioriza-se a letra manuscrita de uma das frases da história. De
quatro em quatro lições, há uma recordação
das palavras utilizadas nas histórias em que as palavras-chaves
aparecem em exercícios de decomposição, ou seja,
separação em sílabas de cada palavra utilizada. Há
também destaque de todas as famílias silábicas, apresentando-se
listas de novas palavras e exercícios de identificação
a partir de figuras. Após a seqüência dos exercícios
citados, apresentam-se outras duas da mesma forma, mudando apenas nos
exercícios de identificação. Nos anteriores apenas
aparecia a palavra e agora começam a aparecer a figura e a palavra.
Figura 2
Página n. 1 da cartilha Vamos ao circo
Figura 3
Página n. 5 da cartilha Vamos ao circo

Fonte: Acervo
particular da profª. Maria Ignêz Villaça.
A primeira,
a segunda e a terceira seqüência de lições e
exercícios de recordação obedecem à estruturação
já descrita. A quarta seqüência é composta de
seis lições apresentadas da mesma maneira; o que muda é
o acréscimo de mais duas lições antes dos exercícios
de recordação. Estes também vêm com algumas
diferenciações: há uma história de extensão
maior, dando uma significação mais abrangente ao tema trabalhado
na lição, e uma outra menor, seguida de gravuras e palavras.
São destacadas oito palavras das duas histórias, que são
desmembradas em sílabas e destas sílabas surgem outras palavras,
três ou quatro de cada sílaba. Os exercícios de identificação,
agora, são compostos por palavras.
A última seqüência volta a apresentar quatro lições,
da mesma forma em que foram apresentadas as demais. Os exercícios
de recordação seguem o mesmo padrão apresentado:
história, decomposição de palavras com desenhos,
palavras destacadas separadas com composição de novas palavras,
acompanhadas de ilustrações, e os exercícios de identificação
voltam a ter gravuras e palavras.
As lições apresentadas são formadas por textos em
prosa baseadas no método de contos criados por Margarida Mac Closkey,
como já informei.
1. 6 Instruções
para uso da cartilha Vamos ao circo
Na cartilha
em análise apresentam-se os quatro passos do método de contos
criado por Margarida Mac Closkey; esses passos servem de instruções
a serem seguidas para o uso da cartilha. São eles:
1º Passo
– O professor contará uma história referente à
gravura da cartilha, da qual procurará tirar as frases contidas
na lição.
Um ou dois alunos devem repetir a história.
Logo em seguida o professor colocará as frases na lousa as quais
vão ser lidas pelas crianças.
2º Passo - O professor juntamente com os alunos fará a recapitulação
da história.
Entregará as cartilhas em seguida, sendo feita a leitura na ordem
certa. Depois o professor mandará as crianças numerarem
as frases e será feita então a leitura salteada das mesmas.
O professor poderá dar ao final desta aula um jogo para verificar
se houve aprendizagem.
3º Passo – Neste passo, os alunos vão ler as frases
em ordem certa, logo depois serão salteadas.
A seguir serão lidas as palavras separadamente e, em seguida, salteadas.
O professor deverá dar aqui também um jogo para verificação
da aprendizagem.
4º Passo – Os alunos vão ler as frases em ordem certa,
salteadas, as palavras separadamente e salteadas.
O professor fará depois a decomposição de várias
palavras para formar outras palavras novas contidas na lição.
O professor deverá usar a lousa e feltrógrafo. (ALUNAS,
Curso de Aperfeiçoamento “B”, 1963).
É
possível observar, pela seqüência dos passos apresentados,
a orientação didática dada ao professor para o uso
da cartilha.
Em nenhum momento é apresentado o alfabeto, e as palavras apresentadas
nas lições não seguem a ordem alfabética,
uma vez que as palavras-chave e que são priorizadas nas histórias
apresentadas.
1.7 Cartilha
Vamos ao circo – um projeto de alfabetização
Segundo as
ex-alunas-professoras e a ex-professora entrevistadas, elas tinham conhecimentos
de todos os métodos, como já informei. Entretanto, observei
nos relatos das ex-alunas-professoras que o método de contos só
veio a ficar em evidência devido à proposta da ex-professora
Maria Ignês Villaça para que confeccionassem a cartilha.
O método de contos, que pode ser considerado método analítico,
de acordo com Aguayo, define-se como um método em que:
[...] as
lições de leitura começam com uma história
que agrada às crianças, com as repetições
rítmicas. Uma vez narrado o conto e mediante vários processos
de dramatizações, jogos, rodas e canto mantém-se
o interesse até que as crianças decorem a rima escolhida.
Chegando a esse ponto, a professora faz a leitura da história,
e assim as crianças recebem a primeira lição de leitura.
Escreve-se no quadro negro a primeira frase do conto e convidam-se as
crianças a lê-la. Quando o fizerem facilmente, ensina-se-lhes
a reconhecer as palavras de que a frase se compõe. Terminando o
primeiro conto e sabidas as palavras que o compõem, ensinam-se
mais duas historietas, por processos análogos. As crianças
possuirão então um bom vocabulário e poderão
passar, sem transição, para o primeiro livro de leitura,
impresso em letra de forma. Quando as crianças já reconhecerem
umas cincoenta palavras, começa a análise fônica (divisão
em sílabas e letras); e, com elementos aprendidos, a reconstrução
de novas palavras e orações breves. (AGUAYO, 1951, p.288).
Para Aguayo,
o método de contos era baseado nos mais sólidos princípios
psicológicos. E sua criadora, Margarida Mac Closkey, “[...]
observou que a criança quando chega à idade escolar, tem
insaciável desejo de narrações animadas e imaginação
exuberante vivendo num ambiente que ela mesma constrói” (AGUAYO,
1951, p.288) .
Relacionando as características dos métodos de alfabetização
conhecidos pelas ex-alunas e o depoimento da ex-aluna-professora Iraci
Fabri Sanches Bigélli, fica evidente que ficaram contagiadas e
muito motivadas pelo método de contos apresentado pela professora
Maria Ignêz Villaça.
Quando a ex-aluna-professora Iraci Fabri Sanches Bigélli relata
suas aulas, ministradas na escola em Juritis, no município de Glicério/SP,
é possível constatar que, apesar de a cartilha adotada ser
a Caminho suave, o método de contos estava presente quando ela
descrevia a maneira como começava o processo de alfabetização.
Segundo ela, o conteúdo era tirado da vida da criança; “de
sua vida”, de sua casa”, de suas brincadeiras e da cartilha
de apoio Mimi fugiu, entre outros .
E também é possível observar pelo entusiasmo das
ex-alunas-professoras entrevistadas que, no ano de 1963, as alunas do
Curso de Aperfeiçoamento estavam muito interessadas em sua própria
aprendizagem e na de seus alunos, buscando todos os recursos necessários
para alcançar esse objetivo. Penso que a confecção
da cartilha Vamos ao circo, baseada no método de contos de Margarida
Mac Closkey contribuiu significativamente para essa motivação.
Considerações
Finais
Conforme
o que foi exposto até aqui, essa cartilha sobre o ensino de leitura
e escrita fundamentava-se na necessidade das alfabetizadoras e no método
de contos proposto por Margarida Mac Closky.
Pode-se dizer que a cartilha confeccionada pela alunas-professoras do
Curso de Aperfeiçoamento do IE “Prof. Stélio Machado
Loureiro” levou-as a trabalhar também com o método
de contos, que a técnica favorecia a aprendizagem da leitura e
escrita. E, como se pode observar, os conhecimentos proporcionados nesse
Curso de Aperfeiçoamento estão relacionados com o ideário
da Escola Nova, como uma forma de didatização desse ideário:
A preparação
das crianças se fará por meio de atividades experienciais:
jogos livres, espontâneos ou organizados, materiais vivos, canto,
desenho, música, dança, exploração do meio,
reinvenção, interação com a comunidade SEMPRE
a partir do interesse e aspirações reais de cada criança.
(MELLO, 1984, p. 25).
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AGUAYO, A.
M. Pedagogía científica: psicología e direção
da aprendizagem. São Paulo: Ed. Nacional, 1951.
______. Didática da Escola Nova.Tradução J. B. Damasco
Penna e Antônio D’Ávila. 11. ed..São Paulo:
Ed. Nacional, 1959.
BIGELLI, Iraci Fabri Sanches. Entrevista [23/06/2003]. Entrevistadora:
Áurea Esteves Serra. Birigüi, 2003. 1 fita cassete (60 min).
Não-publicada.
CARTILHA: Vamos ao circo. Birigüi: I.E. “Prof. Stélio
Machado Loureiro”, Curso de Aperfeiçoamento “B”,
1963.
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MACIEL, Francisca Izabel Pereira. Lúcia Casasanta e o método
global de contos: uma contribuição à história
da alfabetização em Minas Gerais. 2001. Tese (Doutorado)
– Faculdade de Educação, Universidade Federal de Minas
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MELLO, Guiomar Namo de. (Org.). Escola nova, tecnicismo e educação
compens atória. São Paulo: Loyola, 1984.
MORTATTI, Maria do Rosário Longo. Método analítico,
cartilhas e escritores didáticos: ensino da leitura em São
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v. 3, n. 5, p. 123-40, abr. 1999.
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1999.
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o ideal e o usual: a didática mínima, de Rafael Grisi. Revista
Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 82, n. 200/202,
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NASCIMENTO, Aparecida Bugiga do. Entrevista [jun. 2002]. Entrevistadora:
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Esteves. A formação do professor alfabetizador no IE “Prof.
Stelio Machado Loureiro”, de Birigui/SP – (1961-1976). (Dissertação
Mestrado-2004) – Faculdade de Filosofia em Ciências, Universidade
Estadual Paulista - UNESP, Marília, 2004.
VILLAÇA, Maria Ignêz. Entrevista [jul. 2003]. Entrevistadora:
Áurea Esteves Serra. Birigüi, 2003. 1 fita cassete (30 min).
Não-publicada.
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