Regiane Moreira Sobral-UFMS
INTRODUÇÃO
Este artigo questiona a emergência da lógica
das competências nas Ciências da Educação, suscitando
discussões acerca da dificuldade de conceituar a noção
de competência tendo como contexto norteador à sociedade
contemporânea que apresenta o duplo desafio: educar para a competência
e a competência para educar. O trabalho aqui apresentado almeja
fomenta debates relativos ao conceito de competências profissionais
docentes, privilegiando aquelas que emergem atualmente. A tentativa é
de construir uma representação coerente do oficio do professor
e sua evolução. Para tanto é condição”sine
qua non” refletir sobre as competências tendo como parâmetro
de análise os teóricos que tratam desta temática.
O que aqui se apresenta como artigo consagra a possibilidade de rediscutir
a formação de competências profissionais requeridas
pelo contexto atual, as intensas e numerosas polêmicas sobre a temática
já referendada, servindo de referencial para esclarecer seus diversos
sentidos, contribuindo assim para a compreensão e questionamento
de seus usos e mecanismos de formação, problematizando assim
a polissemia e arbitrariedade que assombra os porões do enigma
da competência em educação.
Pretende-se apresentar os resultados parciais da revisão de literatura
da pesquisa intitulada “Educar para a competência e a competência
para educar”, que se encontra em andamento sob a orientação
da Profª. Dra. Lucrécia Stringhetta Mello junto ao Programa
de Pós-graduação em Educação do Curso
de Mestrado da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. A abordagem
eleita foi a pesquisa qualitativa, pois este tipo de investigação
valoriza os sujeitos, indivíduos em processo de formação
continua, alem de propiciar uma análise rigorosa, onde as descrições
traduzam a maneira como os participantes expressam seus conhecimentos
teóricos assimilados e as vivências.
Na análise qualitativa, a descrição
não se fundamenta em idealizações, imaginações,
desejos, nem é um trabalho que se realiza na subestrutura dos objetos
descritos. Na pesquisa qualitativa, descreve-se e se determina com precisão
conceitual rigorosa a essência genérica da percepção
ou das espécies subordinadas, como a percepção da
coisalidade.(MELLO, 2004, p.25-26)
Os instrumentos para a coleta de dados selecionados foram: a observação
participante e o questionário. Esta coleta vem ocorrendo em quatro
Escolas Municipais de Ensino Fundamental: Prof. Zoraide de Carvalho de
Oliveira, Prof. Ondina Hofig de Castilho; Mauro Roberto Manoel, Dr. Youssef
Neif Kassab, situadas nas cidades de Andradina e Castilho, ambas no estado
de São Paulo. Partindo do suporte teórico acerca da formação
de competências (DOLZ & OLLAGNIER, 2004) (PERRENOUD, 1999, 2000,
1995,1993; 2002) (RAMOS, 2002) (RIOS, 2001) (Ropé & Tanguy,
1997), dentre outros, almeja-se refletir sobre a apelação
pedagógica que este termo tem desencadeado, provocando assim incertezas
e controvérsias.
O ofício do educador não é imutável. Suas
transformações passam principalmente pela emergência
de novas competências (ligadas, por exemplo, ao trabalho com outros
profissionais ou à evolução das didáticas
ou pela acentuação de competências reconhecidas, por
exemplo, para enfrentar a crescente heterogeneidade dos efetivos escolares
e a evolução dos programas. Todo referencial tende a se
desatualizar pela mudança das práticas e, também,
porque a maneira de concebê-las se transforma). (PERRENOUD, 2000,
p.14)
A preocupação diante da formação
de competências pertinentes ao oficio docente vem nos últimos
anos, configurando-se como um apelo na esfera educacional, política
e social. Conforme Bronchart e Dolz (2004, p.29) há mais de uma
década, a lógica das competências invadiu a educação;
faz parte de uma tentativa de redefinir e de organizar o campo educativo,
considerando as necessidades do mercado de trabalho, que deve passar por
interrogações constantes de seu status político e
social.
Até o presente momento é possível afirmar que a lógica
das competências insere-se em um movimento permanente de adaptação,
logo propõe uma apreensão das capacidades e aprendizagens
menos ligadas a mera qualificação profissional, pois a tarefa
fundamental do educador é de semear desejos, estimular projetos,
consolidar uma arquitetura de valores onde o educando saiba articular
seus projetos pessoais com os da coletividade se inserindo, sabendo pedir
junto com os outros, sendo, portanto competentes. Não existem interesses
de elaborar um receituário cuja pretensão seja de formação
de profissionais competentes, nem elaboração de métodos
perfeccionistas, pois, não existe um ou o método competente
propriamente dito e descrito restritivamente.
EDUCAR PARA A COMPETÊNCIA E A COMPETÊNCIA
PARA EDUCAR: A INSERÇÃO DO TERMO COMPETÊNCIA NO MUNDO
DO TRABALHO E NA EDUCAÇÃO
Diversos são os desafios configurados nos últimos
anos no quadro do mundo trabalho e este por sua vez passa por diversas
reformulações. Discussões acerca de matrizes teóricas,
avanços, inovações na realidade política,
inusitadas formas de organização do trabalho, implicando
em mudanças no perfil do profissional perante as exigências
de qualificação trazidas pelo impacto profundo das transformações
econômicas, sociais, culturais e tecnológicas.
Diante desse cenário, algumas profissões excluem-se devido
aos processos de desvalorização e precarização,
outras emergiram com o intuito de suprirem novas necessidades, e outras
ainda, se reenquadram visando atender a demandas sociais dessa forma,
garantindo sua sobrevivência por meio da busca de novas possibilidades.
Sendo assim, a capacidade de readaptação, reprofissionalização,
torna-se fundamental. Esse processo de reordenamento das profissões
é bastante complexo, envolvendo mudanças de valores, inserção
de novos conceitos, salários, status, perfil; lançando assim
grandes desafios aos sistemas formativos.
Com relação ao mundo do trabalho, sabe-se que um dos fatores
de produção decisivo passa a ser o conhecimento e o controle
do meio técnico-científico-informacional, reorganizando
o poder advindo da posse do capital, da terra ou da mão-de-obra.
O fato de o conhecimento ter passado a ser um dos recursos fundamentais
tende a criar novas dinâmicas sociais e econômicas, e também
novas políticas, o que pressupõe que a formação
deva ser complementada ao longo da vida, o que exige formação
continuada. (Brasil. Parecer Nº: 009/2001 CNE/CP)
A profissão docente precisa reenquadrar-se para
atender as inusitadas demandas sociais e garantir sua sobrevivência;
é historicamente marcada por determinações políticas,
sociais e ideológicas e assim como outras, traz a marca de uma
história que não é linear e implica em movimentos
que revelam os contextos históricos da sociedade, que concebe conforme
seus interesses, determinado tipo de educação e de profissional.
A educação é um fenômeno social inerente à
constituição do homem e da sociedade, integrante, portanto
do contexto social, político, e cultural, onde as crianças,
os jovens e adultos, necessitam de novos conhecimentos, habilidades, hábitos,
e competências. Ao analisar o termo competência é preciso
uma atenção especial a prática do termo, “a
competência não se limita ao conhecer, mas vai além
porque envolve o agir numa situação determinada” (Brasil.
CNE /CEB. Parecer n. º 16/99, p. 32).
Na sociedade atual há uma ampliação muito significativa
do conceito de educação, onde a diversidade de práticas
educativas e de ações pedagógicas perpassam mais
variadas instâncias não restritas a escola, como por exemplo:
movimentos sociais, meios de comunicação, empresas, saúde
publica, educação ambiental, educação popular,
educação sindical etc. Demandando-se assim, novas exigências
de formação educativa. Fala-se em sociedade pedagógica,
em função da posição central que o processo
educativo se faz presente nas mais variadas esferas.
No meio empresarial o pedagógico adquiriu uma conotação
fortíssima. Carvalho (1988), comenta que a necessidade de ajudar
os indivíduos se adaptarem a velocidade dos acontecimentos, descobertas,
especializações e ao clima de intensa competitividade, fez
com que a pedagogia extrapolasse o muro da escola e penetrasse no ambiente
empresarial, sendo assim, é falso o conceito da pedagogia se limitar
apenas a utilização de clássicas formas de ensino.
A visão ampla do processo educativo, que não se restringe
somente ao ambiente escolar, inicia no ambiente familiar e está
presente nos mais váriados espaços da sociedade, principalmente
no ambiente de trabalho que está começando a ser visto como
espaço pedagógico.
As reflexões acerca da concepção ampliada de educação
sem dúvida afetam a prática do professor, ampliando responsabilidades
educativas, mesmo tendo este, vários aspectos que levam a insatisfação
profissional: falta de recursos, desvalorização profissional,
baixos salários, entre outras situações limitadoras
dessa prática.
Libâneo & Pimenta (1999) defendem a visão ampla do espaço
educativo, menciona que todo educador sabe, hoje, que as práticas
educativas ocorrem em muitos lugares, em muitas instâncias formais
e não formais. Elas acontecem nas famílias, nos locais de
trabalho, na sociedade e na rua, nos meios de comunicação
e também nas escolas, por conseguinte é impossível
afirmar que o trabalho pedagógico se reduz ao trabalho docente
na escola.
Machado (2000) menciona que o termo competência tem presença
acirrada no campo educacional. Sob este prisma a sua origem e ascensão
estão associadas ao contexto de crise do modelo fordista/taylorista
e a globalização econômica. A globalização,
com a necessidade de contratação, e avanços de políticas
neoliberais, delineiam a contextualização da terminologia,
origem, conceituações e usos do modelo de competências.
Conforme Hirata (1998) a noção de competência é
oriunda do discurso empresarial nos últimos anos na França
e é retomada em seguida por economistas e sociólogos. É
uma noção ainda bastante imprecisa e decorreu da necessidade
de avaliar e classificar novos conhecimentos e habilidades gestadas a
partir das novas experiências concretas de trabalho associado, portanto,
aos modelos de produção e gerenciamento e substitutiva da
noção de qualificação ancorada nos postos
de trabalho e das qualificações profissionais que lhes eram
correspondentes.
Segundo Ropé & Tanguy (1997), os usos da noção
de competência não permitem uma definição conclusiva.
Ela se apresenta como uma noção cruzada, cuja capacidade
semântica favorece seu uso inflacionado em lugares diferentes, por
agentes com interesses diversos.
Competência entendida por Delours (1998) como um coquetel individual,
adquirido pela formação técnica e profissional, e
também pelo comportamento social, assim como a aptidão para
o trabalho em equipe, a capacidade de iniciativa, o gosto pelo risco.
No texto clássico de 2000 do ENEM , há a seguinte definição
de competência:
Manfredi (1998) menciona que no Brasil, a noção de competência,
apesar de já ser conhecida no âmbito das Ciências Humanas
(notadamente no campo das Ciências da Cognição, da
Lingüística), desde os anos 70, passa a ser incorporada nos
discursos dos empresários, dos técnicos dos órgãos
públicos que lidam com o trabalho e por alguns cientistas sociais,
como se fosse decorrência natural e imanente ao processo de transformação
na base material do trabalho.
“Competências são as modalidades estruturais
da inteligência, ou melhor, e operações que utilizamos
para estabelecer relações com e entre objetos, situações
fenômenos, e pessoas que desejamos conhecer. As habilidades decorrem
das competências adquiridas e refere-se ao plano imediato do saber
fazer. Por meio das ações e operações, as
habilidades aperfeiçoam-se e articulam-se, possibilitando a reorganização
das competências”.(Brasil. MEC ENEM – Documento Básico
2000, 1999, p.7)
A introdução do termo competência
acompanha os processos de reconversão produtiva. O discurso da
competência foi introduzido no Brasil, pelos empresários
e também pelos governos. O modelo de competência, além
de incorporado pelo SENAI e outras entidades empresariais, também
é veiculado por documentos governamentais, pelos Ministérios
do Trabalho e da Educação.
A palavra competência adquire uma conotação generalizada,
pois é indistintivamente empregada nos campos educacionais e profissionais
como se fosse portadora de uma conotação universal. No discurso
empresarial há uma tendência a defini-la como estoque de
conhecimentos/ habilidades, mas, principalmente como capacidade de decidir,
agir e intervir em situações previstas ou imprevistas.
Para ROPÉ &TANGUY (1997) a noção de competência
tende a substituir outras noções que prevaleciam anteriormente,
como a dos saberes e conhecimentos na esfera educativa, ou a de qualificação
na esfera do trabalho. Essas noções nem por isso desapareceram,
apenas perderam o posicionamento central e, associadas a competências,
sugerem outras condições.
Existe um número considerável de teóricos que se
dedicam às pesquisas sobre as dimensões, usos e interesses
do termo competência; que ao serem historicamente elaborados, trazem
as representações sociais legitimadoras das transformações
produtivas e organizacionais, que decorrem no plano material.
A institucionalização do termo é de grande seriedade,
como menciona Machado (2000), tem um caráter de generalidade, aparentemente
consensual e tem servido para padronizar uma forma de pensar o perfil
desejado do trabalhador.
Esse referencial vem se configurando em pensamento único sobre
a interpretação das demandas do mercado em relação
às transformações nas relações de trabalho
e a busca de maior eficácia econômica. Esse modelo tem imposto
a e todos devem se adaptar, naturalizando os aspectos qualitativos de
trabalho e os processos de produção e de gestão dos
conhecimentos, saberes dos trabalhadores, tornando-os externos as relações,
ações e intenções dos sujeitos envolvidos.
A contribuição da noção de competência
é um fator que merece destaque, pois pode implantar como referência,
o modelo individualizante. Segundo Hirata (1997) o enfoque pela competência
possibilita concentrar a atenção sobre a pessoa mais do
que sobre o posto de trabalho e permite associar as qualidades requeridas
do individuo e as formas de cooperação intersubjetivas características
de novos modelos produtivos.
Nessa vertente associa a noção de competência a empregabilidade,
considerando-as sinônimas, uma vez que ambas têm como referencial
o individuo e permitem um balanço ou uma avaliação
de caráter individual e pode-se ver uma certa simetria com relação
feita entre desemprego e dispositivos de formação.
As pesquisas acerca das competências evoluem paulatinamente. Machado
(2000) destaca a importância de tais avanços, em especial
de um aprofundamento de reflexões sobre as implicações
e contradições do uso institucionalizado da noção
de competência, pois tais questões têm afetado negociações
sociais sobre o uso da força de trabalho, as relações,
os trabalhadores, especialmente os que tem sido objeto de questionamento
sobre a identidade profissional e sobre o valor de sua força de
trabalho, e também no setor educacional, que vem sendo conclamado
a passar por reformas.
PERRENOUD (1999), menciona que a importação do termo competência
para o campo pedagógico foi através do meio empresarial.
Nesta ótica a explicação mais evidente consiste em
invocar uma espécie de contágio. Como o mundo do trabalho
apropriou-se da noção de competência, a escola estaria
seguindo seus passos, sob o pretexto de modernizar-se e de inserir-se
na corrente de valores da economia de mercado, como gestão de recursos
humanos, busca da qualidade total, valorização da excelência
de uma maior mobilidade dos trabalhadores e da organização
do trabalho. Todavia, ele afirma que essa moda simultânea da mesma
palavra, em campos variados, esconde interesses parcialmente diferentes.
A pedagogia da competência passa a exigir, tanto
no ensino geral, quanto no ensino profissionalizante, que as noções
associadas (saber, saber-fazer, objetivos) sejam acompanhadas de uma explicitação
das atividades (ou tarefas em que elas podem se materializar e se fazer
compreender). Essa explicitação revela impossibilidade de
dar uma definição a tais noções separadamente
das tarefas nas quais elas se materializam. (RAMOS, 2002, p.221)
Segundo ROPÉ & TANGUY (1997) desde o fim dos
anos 70, devido as preocupações de emprego se encontrarem
localizadas no centro do sistema educativo, a escola progressivamente
aproximou-se do mundo das empresas por meio de cooperações
de todos os tipos.
“ durante decênios, sancionados pelo diploma,
o saber ofereceu garantias de competências. Isso não é
mais verdadeiro atualmente . As competências não se deduzem
automaticamente dos saberes. A profissionalização, quer
dizer, a construção de competências ou de competência,
exige mais que os saberes. Em conseqüência, a construção
de competências coloca em causa os conteúdos da formação,
os métodos de transmissão e a certificação
pelo diploma. Entre a qualificação, no seu sentido conceitual,
e as competências, existiria uma distancia importante.”(RAMOS,
p.62-63, 2002)
Para Machado (2000) competência não é
simplesmente uma soma de itens que integram uma lista de conhecimentos
e habilidades; faz parte da historicidade do sujeito, do seu papel como
protagonista da pratica social. Sua construção é
um processo continuamente recomeçado. Impulsiona uma dinâmica
de aprendizagem, porém não se trata de aprendizagens como
um simples processo funcionalista de adaptação ao meio,
de ajustamento dos indivíduos a um posto de trabalho, cujo conteúdo
já está prescrito e definido. Existe um espaço de
recomposição e transformação de saberes, trata-se
da aprendizagem como estruturação da identidade, processo
que conjuga a construção do sujeito e da situação
social.
Repensando essas informações não é de se estranhar
a inserção do termo na educação com tanto
impacto, mesmo a noção de competência nesse campo
ainda sendo tão arbitraria; com seu advento e disseminação
sem estruturam reformas nos sistemas de ensino, de forma adaptativa ao
que aparenta, atualmente representam o que existe de mais moderno na sociedade.
A penetração da noção de competências
no meio educacional tem ocorrido através das Secretarias de Educação.
Está presente em documentos oficiais que definem objetivos e estratégias
educacionais, no estabelecimento de Parâmetros Curriculares (Ensino
Fundamental, Médio e Superior) e em Planos de Graduação.
A preocupação diante da formação de competências
pertinentes ao ofício docente vem nos últimos anos, configurando-se
como um apelo na esfera educacional, política e social. No âmago
dos debates contemporâneos existem questionamentos e reflexões
sobre o compromisso e competências do educador. Há uma emergência
dessa palavra nos documentos oficiais, pois o termo competência
acaba se corporificando com uma apelação pedagógica.
Conforme Dolz e Ollagnier (2004, p.9-11) foi um termo imposto, mas que
sem dúvida merece uma análise mais profunda e detalhada,
tanto por sua origem, quanto pelo motivo de seu sucesso.
A noção de competência nas Ciências da Educação
freqüentemente provoca incertezas e controvérsias, pois urge
uma grande dificuldade de identificação dos fenômenos
que almeja alcançar, acaba fazendo parte daquelas noções
cujas definições só podem ser apreendidas por intermédio
da evolução das tendências educativas e de pesquisa
que a usam, onde servem de referencial para esclarecer os inúmeros
sentidos a ela atribuídos.
O uso das competências nos documentos oficiais é concreto
e provoca mudanças dignas de análise, tendo como parâmetro
os programas e a prática escolar efetivada em sala de aula. “Ser
competente é saber fazer bem o dever. Ao dever também se
articulam, além do saber, o querer e o poder” (RIOS, 1993,
p.9-10).De nada adianta a produção de construtos teóricos
acerca da formação de competências se não houver
a erradicação da dicotomia entre teorias e práticas,
logo os professores precisam estar dispostos a efetivar práticas
competentes, assim como os sistemas de ensino devem criar condições
reais que sustentem tais práticas.
A maioria dos pesquisadores é fundamentam-se nos referenciais teóricos
sustentados por Ropé e Tanguy, por adotarem um procedimento de
análise dos discursos públicos relativos às competências,
rumo ao significado do uso social da noção.
A noção de competência é uma necessidade ou
mais uma moda educativa? Depende da maneira que é efetivada. Basta
questionar a maneira que o professor avalia as competências e assim
obter sua definição de competência. É como
bem explicita Blain: “Diga-me como avalia as competências
e lhe direi como você efetivamente as define”. (BLAIN, 2004,
p.132)
A emergência de novas noções e inusitados conceitos
num determinado contexto histórico social expressa diversas mudanças
culturais e organiza as principais idéias e valores compartilhados
por uma sociedade. No contexto político e econômico do neoliberalismo
e globalização, inspirados na pos-modernidade, o projeto
social configura-se como produto desagregado de uma suposta convergência
dos projetos individuais e empresariais promovidas pela competência.
Inúmeras vezes existem questionamentos acerca da formação
de professores para atuar na sociedade contemporânea, bem como são
suscitadas reflexões relativas à formação
de competências, envoltas em uma tessitura de opções
ideológicas, ou seja, conforme o modelo de sociedade e de ser humano
defendido, atribui-se à escola as mesmas finalidades sociais.
Ao iniciar o debate sobre o status de uma noção emergente
e controvertida e ao comparar os diversos trabalhos sobre a questão,
a série razões educativas interpela os pesquisadores na
área das ciências em educação. Tal noção
questiona a pertinência e a legitimidade dos saberes conceituais
elaborados, as concordâncias/ discordâncias dos fenômenos
que esses saberes identificam e explicam, assim como o próprio,
método pelo qual os saberes são construídos. Em suma
ela questiona a própria influência que o contexto socioeconômico
e as limitações dos sistemas institucionais de formação
exercem sobre a elaboração desses saberes (DOLZ e OLLAGNIER,
2004, p. 9-10)
As orientações sobre a formação
dos professores dependem da qualidade de sua concepção e
para fazer as práticas evoluírem é importante descrever
as reais condições e limitações do trabalho
dos profissionais que atuam na docência. A missão não
seria pensar a formação dos professores, mas sim oferecer
uma imagem realista dos problemas que precisam ser resolvidos cotidianamente,
pois existem dilemas, decisões e gestos profissionais, para tanto
é necessário listar os não-ditos da profissão
de professor entre eles como menciona Perrenoud (1995) o medo, o poder,
o conflito, a improvisação, a solidão, o tédio,
a rotina.
A mera formação teórica permite apenas a aprovação
em exames e obtenção de diplomas, já a formação
pratica possibilita a construção de alicerces para a sobrevivência
na profissão, contudo formação e uma só teórica
e pratica. As competências não podem ser construídas
sem parâmetros avaliativos, a validação das competências
deve ser formativa passando por analises do trabalho de estudantes e dos
professores.
Desde os anos 90, segundo Thurler (2002) fala-se em profissionalização
dos professores e dos quadros a partir disso a inovação
emerge como palavra central ordenadora das relações educativas,
cujo desenvolvimento é duradouro tanto profissional quanto organizacional,
cabe a cada profissional a disponibilidade para a construção
de saberes de inovação.
Não será possível atender às
demandas de transformação da educação básica
se não mudarmos a tradicional visão do professor como alguém
que se qualifica unicamente por seus dotes pessoais de sensibilidade,
paciência e gosto no trato com crianças e adolescentes. É
preciso enfrentar o desafio de fazer da formação de professores
uma formação profissional de alto nível. Por formação
profissional, entende-se de que não seja uma formação
genérica e nem apenas acadêmica, mas voltada para o atendimento
das demandas de um exercício profissional específico. É
fundamental que saiba mobilizar esses conhecimentos, transformando-os
em ação. Essa formação deve ser de alto nível
no cuidado e na exigência, tanto em relação ao que
é oferecido pelo curso quanto ao que são requeridos dos
futuros professores.(Brasil. MEC , 2000, p.8)
Competência implica em saber apreciar/ou julgar, portanto ser competente
é ousar julgar em momentos de incerteza, dificuldades, dúvidas,
contradições, algo que segundo Macedo (2001) depende de
tolerância e generosidade. Além do mais a competência
depende de saber mobilizar recursos afetivos e cognitivos concomitantemente;
tal mobilização depende de recursos circunstanciais, propositais
e até mesmo de desejo.
A aquisição do conhecimento não significa ser competente,
pois é possível conhecer técnicas e não saber
aplicá-las no momento oportuno. Perrenoud (2000) menciona que a
competência designa um mistério, mas segundo ele é
melhor um mistério bem fundamentado que uma aparente evidencia.
A competência se impõe como uma necessidade, uma inovação
indispensável uma forma de superar as insuficiências de um
regime obsoleto: o da qualificação. Constantemente, associa-se
a noção de competência a uma mutação
do sistema educativo em resposta a pressões econômicas. A
mobilização mais intensa dos recursos humanos, valorizando
autonomia e responsabilidade, é apresentada como conseqüência
positiva, quando comparada às formulas tayloristas e fordistas.
O indivíduo competente se expressa em relação às
tarefas ou ao trabalho humano diante de pessoas e objetos, pois as profissões
dependem de concentração, disciplina, respeito, cooperação,
autonomia, cumprimento de metas e prazos, dentre outras exigências.
Existem grandes maus entendidos, como o de acreditar que as disciplinas
e competências são adversárias e disputam o mesmo
lugar nos espaços escolares, ambos os conceitos devem ser analisados
pela ótica da complementaridade, com o intuito de revitalizar currículos
escolares considerando-os como mapas do conhecimento, responsáveis
pelo desenvolvimento de um amplo espectro de competências.
As pessoas vivem, convivem, agem interagem, avaliam ou são avaliadas
seguindo espectros de competências, diante disso as competências
de expressão e argumentação são de suma importância
e são desenvolvidas por meio de disciplinas, sendo que estas constituem
meios e instrumentos para o desenvolvimento de tais capacidades, a serem
utilizadas também além dos muros das escolas.
Cada profissional da educação é convidado a desenvolver
suas próprias competências direcionando seus alunos para
que aprendam a ser e pensar. O educador tem responsabilidades para com
o desenvolvimento de cidadãos, da cultura e da sociedade, diante
disso é crescente a necessidade de repensar estratégias
que permitam a profissionalização do professor assim como
a elevação seu do nível de formação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao mencionar o desenvolvimento de competências por
parte dos alunos emerge a necessidade de dialogar sobre as competências
do próprio professor. É possível comprovar tal raciocínio
ancorando-a na seguinte afirmação engendrada por Alessandrini
(2002, p.168) “Para o professor desenvolver competências no
aluno, ele precisa compreender e redescobrir as suas próprias competências”
Perante esta afirmação o professor precisa desenvolver a
capacidade de enxergar o outro, vê-lo, senti-lo avaliá-lo
e observá-lo, para que a partir desse processo, possa promover
uma linha de ação que favoreça o crescimento de seu
aluno e promova sua aprendizagem.
Os registros de conhecimentos foram historicamente formalizados por meio
de títulos e diplomas, esses últimos, mesmo que mantenham
certa importância na inserção profissional inicial,
não determinam a permanência no mercado de trabalho, pois
esta só será garantida pelas competências adquiridas,
validadas, e atualizadas, garantindo assim a empregabilidade do profissional.
Atualmente existe um verdadeiro mercado de certificação
no setor da formação, como bem explicita Foulon (1999, p.77
apud Ropé, 2004, p.228) “o sacrossanto diploma desça
de seu pedestal”. Esta afirmação evidencia o quanto
a formação meramente diplomática está distante
da realidade, pois a adptação e empregabilidade dos profissionais
dependem de um amplo espectro de competências construídas
ao longo dos processos formativos.
A competência emerge como uma noção cujo objetivo
central é de responder às necessidades empíricas
e teóricas que descortinam novas realidades no mundo do trabalho
e nas práticas sociais. É uma noção que surge
não para substituir a qualificação, mas sim colocá-la
em um plano secundário, como forma de consolidá-la enquanto
categoria ordenadora da relação trabalho-educação
no capitalismo.
A definição do termo competência é arbitrária
e parece ainda ser um fenômeno sem consenso, a definição
está sendo construída na medida em que vai sendo utilizada
por cada instituição ou por cada profissional de acordo
com suas convicções teóricas e práticas.
A tarefa mais fundamental do professor, portanto, é semear desejos,
estimular projetos, consolidar uma arquitetura de valores que os sustentem
e, sobretudo, faça com que os alunos saibam articular seus projetos
pessoais com os da coletividade na qual se inserem, sabendo pedir junto
com os outros, sendo, portanto, competentes. À medida que essa
noção extrapolar o campo teórico para adquirir materialidade
na organização dos currículos e programas escolares,
configura-se-à o que vem sido intitulado como pedagogia das competências.
Essa revisão bibliográfica foi necessária para dar
suporte a este trabalho, uma vez que o enfoque é a formação
de competências do professor no contexto contemporâneo. Através
da pesquisa de campo, até o presente momento, é possível
constatar que o conceito de competência é um enigma, um fenômeno
a ser desvelado, a gênese de maiores e mais precisos apontamentos
ocorrerá após o término da pesquisa .
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