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... As
mulheres que ousaram escrever e publicar suas obras
em vários casos usavam pseudônimos, ou seja,
precisavam se ocultar devido ao preconceito... |
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A
MULHER LETRADA E O SEU PAPEL SOCIAL NO SÉCULO
XIX.
-
Fabiana Macedo
Gonçalves
(*)
Análise da personagem Pombinha: única mulher
letrada na obra
O
Cortiço,
de Aluísio Azevedo.
Introdução
Segundo o senso comum as mulheres ingressaram no
mercado de trabalho somente após quase vinte anos do
fim da Segunda Guerra Mundial, na década de 1960,
devido à necessidade de mão-de-obra nas fábricas em
expansão no período de industrialização ou à
necessidade de ajudar a compor a renda familiar.
Antes desse período, acredita-se, todas as mulheres
eram apenas donas-de-casa, mães e esposas.
O senso comum reforça “idéias” que não são
verdadeiras ou são apenas meias-verdades.
De acordo com a pesquisa realizada, verificamos que
as mulheres no Brasil sempre trabalharam,
especialmente as mais pobres. A grande maioria
realizava trabalhos que não exigiam estudo; eram
lavadeiras, cozinheiras, empregadas, babás e até
prostitutas. Essas mulheres eram analfabetas, não
tinham acesso à escola devido à condição de pobreza
em que viviam. Poucas eram alfabetizadas. Segundo o
crítico literário Antonio Candido, no Brasil, em
1890, cerca de 84% da população era analfabeta.
(Literatura e Sociedade: Estudos de Teoria e
História Literária: 2002, 50).
Não só as mulheres pobres trabalhavam, muitas
mulheres oriundas de famílias abastadas, e por isso
com acesso ao estudo, trabalhavam, eram ativas
politicamente, bem informadas, cultas, poliglotas,
reivindicavam direitos iguais aos dos homens,
colaboravam com artigos para jornais, e várias eram
escritoras (prosa, poesia, cartas, diários,
crônicas, contos, dramas, comédias, ensaios e
crítica literária). O mundo das Letras sempre foi
masculino. As mulheres que ousaram escrever e
publicar suas obras em vários casos usavam
pseudônimos, ou seja, precisavam se ocultar devido
ao preconceito.
Autoras ignoradas
Segundo Mary del Priori, organizadora do livro
A História da Mulheres no
Brasil, “A conquista do território da
escrita, da carreira das letras, foi longa e difícil
para mulheres no Brasil. (PRIORI: 2002, 409).
Zélia Gattai, em Anarquistas
Graças a Deus (1982), pensando no que diria
sua mãe ao ler o livro: ‘Que menina atrevida! O que
não vão dizer “. (PRIORI: 2002, 410).
Essa conquista, essa luta (referindo-se a textos
escritos por mulheres), tem mais de século e foi
travada, desde Nísia Floresta, por algumas mulheres
que não colocaram em primeiro lugar ‘o que os outros
vão dizer’ e que tentaram se livrar da tirania do
alfabeto, tendo primeiro de aprendê-lo para depois
deslindar os mecanismos de dominação nele contidos.
(PRIORI: 2002, 409).
É praticamente desconhecida, para a maioria das
pessoas, o nome da autora e a obra considerada o
primeiro romance escrito por uma mulher no Brasil.
O romance, por mais inocente que fosse, era ainda um
gênero literário malvisto, pernicioso para moças,
quando em 1859, os Jornais de São Luís anunciavam
Úrsula, de autoria de uma maranhense, ao custo de
dois mil réis pela Typografia do Progresso. Logo se
soube que o livro, hoje considerado o primeiro
romance de uma autora brasileira, era de Maria
Firmina dos Reis. (PRIORI, 2002: 410)
Essas mulheres e suas obras são praticamente
desconhecidas nos dias de hoje porque simplesmente
foram ignoradas por estudiosos e historiadores.
Felizmente professores e pesquisadores trabalham
para resgatá-las. Um exemplo desse descaso pode ser
conferido na obra História
Concisa da Literatura Brasileira, do crítico
literário Alfredo Bosi, um dos livros mais usados
nas escolas de ensino médio, o autor cita o nome de
quatro poetisas do século XIX: Francisca Júlia,
Gilka Machado, Auta de Souza e Narcisa Amália.
Apenas Narcisa Amália mereceu biografia e destaque.
Romance: Gênero maldito
Se escrever romances era mal visto, ler esse gênero
também não era considerado adequado para mulheres
sérias, casadas ou as chamadas “meninas de família”.
A personagem Ema Bovary, do romance realista Madame
Bovary, de Gustave Flaubert, pode ser citada como
exemplo de mulher que destrói a própria vida e a da
família ao tentar viver da mesma maneira que as
personagens dos romances que lê. Os homens escreviam
a respeito das mulheres e para elas. O papel que
cabia às mulheres era o de leitoras.
A personagem Pombinha, do romance
O Cortiço, de Aluísio
Azevedo, escrito em 1890, portanto uma obra do
século XIX, é um exemplo disso. Pombinha é a única
mulher alfabetizada moradora do Cortiço sabia ler,
escrever, e fazer contas. Por isso, era solicitada
para escrever cartas para os vizinhos (também
moradores do Cortiço), ler jornais em voz alta e
fazer as contas para as lavadeiras.
Única letrada do cortiço, ela desenvolveu a missão
de escrever cartas que lhe eram ditadas pelos
moradores. Além disso, fazia o rol das lavadeiras,
calculava quanto deveriam receber, lia o jornal para
os que quisessem ouvir. De tanto escrever cartas,
tornou-se conhecedoras dos segredos mais velados dos
que a procuravam para esse fim. Tal intimidade
permitia-lhe fazer pequenas interferências no
discurso dos que lhe ditavam as cartas. (HELLER:
2002, 25).
Driblando o preconceito
Usar
pseudônimos para driblar o preconceito foi um
recurso usado não somente por escritoras
brasileiras, a inglesa Jane Austen, autora do
famosíssimo romance Orgulho e
Preconceito (Pride and Prejudice, 1811-1812)
escrito durante o período romântico, assinou seus
primeiros livros usando o pseudônimo “By a Lady“
(Por uma Dama).
Segundo Cecília Prada, Nísia Floresta, era na
verdade o pseudônimo usado por Dionísia Gonçalves
Pinto, uma das mais importantes escritoras do século
XIX. Nascida no Rio Grande do Norte, em 1810, Nísia
fundou em 1838 um educandário, foi uma das primeiras
mulheres a publicar contos, poesias, novelas e
ensaios, foi também a precursora de uma visão mais
“moderna” dos problemas indígenas e a responsável
pelo surgimento do feminismo no Brasil, e até mesmo
na América Latina.
No Brasil, as mulheres sempre trabalharam de uma
maneira ou de outra. A novidade é que recentemente,
desde a década de 1960, elas passaram a ter mais
acesso à educação e se profissionalizaram,
conquistaram salários iguais aos dos homens - pelo
menos nas áreas urbanas – e alcançaram os cargos de
chefia, tais como: gerência e diretoria de grandes
empresas, mas ainda hoje causa estranheza a muitas
pessoas o fato de mulheres escreverem e publicarem
suas obras.
Conclusões
As mulheres se destacaram em muitas áreas, mas
continuam tendo pouco espaço na Literatura
Brasileira. Ao verificarmos no Caderno Ilustrada, do
Jornal Folha de S. Paulo, edição de 27 de Agosto de
2005, a lista com nomes dos livros “Mais Vendidos”
da semana percebemos que poucos nomes femininos
figuram nessa lista. Uma delas é Lya Luft, premiada
escritora, autora do sucesso de vendas,
Perdas & Ganhos,
classificado como não-ficção.
Lygia Fagundes Telles, outra autora premiada,
consagrada pela “crítica” e membro da Academia
Brasileira de Letras desabafou em uma entrevista
para a Revista Marie Claire:
Ainda hoje, o quadro dos membros da Academia
Brasileira de Letras [do qual Lygia faz parte desde
1987] tem apenas 4 mulheres e 36 homens. Não podemos
esquecer que até pouco tempo as mulheres que sabiam
escrever só registravam aqueles devaneios em seus
diários e, ainda assim, às escondidas...A tal
revolução é do século 20. Minha mãe era uma pianista
de muito talento. E daí? Vieram os filhos, quatro.
Ela não conseguiu assumir sua vocação.
Ao avaliarmos a situação das escritoras, no
Brasil, percebemos que mudaram as abordagens, mas o
tema ainda é o mesmo.
BIBLIOGRAFIA
AZEVEDO,
Aluísio. O Cortiço.
36 ed., São Paulo: Ática, 2004.
BOSI,
ALFREDO. História Concisa da Literatura
Brasileira.
2ª ed, São Paulo: Cultrix, 1984. pp. 162 - 259
CANDIDO,
Antonio.
Literatura e Sociedade: Estudos de Teoria e
História Literária.
10 ed, São Paulo: T.A Queiroz, 2002 .
PRADA,
Cecília.
Vozes Silenciadas: A sofrida participação feminina
no mundo das letras. Revista Problemas
Brasileiros.
Março/Abril. 2004. 32 –37 pg.
PRIORI,
Mary del. História das Mulheres do Brasil.
4º ed., São Paulo: Contexto, Unesp, 2002. pp. 322 –
553.
Jornal: FOLHA DE SÃO PAULO. Edição de 27 de Agosto
de 2005.
Mais Vendidos. Caderno Ilustrada. E 4.
Webgrafia: TAVANO,
Silvana. A dama das letras: escritora Ligia
Fagundes Telles, 2005
Disponível em: <
http://www.marieclaire.com.br > Acesso em:
10/03/2005.
* Fabiana Macedo Gonçalves.
Instituição: Uninove - Centro Universitário. Nove
deJulho/ São Paulo.
fabianauni31@pop.com.br
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