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... Vamos
assim, abolindo, deixando de falar, omitindo e não
divulgando o que é nosso, do Pará, quando se trata
de literatura, pois nas outras vertentes da arte até
que não há tanto esse preconceito..... |
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ESTREBUSHISMO NA LITERATURA DO PARÁ
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Salomão Laredo
(*)
Estrebucham os que
têm vergonha de ser paraense, de falar no Pará, de
valorizar o que é nosso e continuam valorizando só o
que vem de fora achando que o que temos e produzimos
aqui não presta, não serve, não é bom e nesse
sentido, certamente, estão redondamente enganados os
adeptos do bushismo, embora tenham todo o direito de
estrebuchar e estrebushar.
Daqui desta Amazônia, da região norte, do Pará,
continuarei defendendo o que é nosso. Refiro-me a
literatura local. Continuo também defendendo a Feira
do Livro do Pará que começou nos tempos em que a
bibliotecária Valdéa Cunha era diretora de
biblioteca da FCPTN e que se efetivava no espaço
Ismael Néri, do Centur, faz tempo ( e depois virou,
com outra numeração, Pan-Amazônica) há memória
disso, é só consultar.
Analisando tanto quanto pude, escrevi (em minha
dissertação de mestrado em estudos literários a
respeito do esquecimento que se dá ao escritor
Raymundo Moraes, como metáfora do nosso proceder com
tantos escritores de valor que temos), que a UFPA,
de há muito, aboliu a disciplina Literatura Paraense
– recordo que o professor José Arthur Bogéa
esperneou e telefonou aos escritores para que
reagissem a essa tirania -, por entendê-la
restritiva e já inclusa dentro do que se chama
Literatura Brasileira e aí nomeou de expressão
amazônica, sem dúvida, bonita, porém, nada nomeia se
não identificar o estado, a localidade. E o mais
grave, ficou sem ser estudada na graduação e na pós,
pasmem!
Vamos assim, abolindo, deixando de falar, omitindo e
não divulgando o que é nosso, do Pará, quando se
trata de literatura, pois nas outras vertentes da
arte até que não há tanto esse preconceito. E o Pará
perde divulgação também através do açaí, da
castanha, cupuaçu,do tacacá e outros produtos. Não
defendemos, perdemos.
Minha
identificação: sou paraense que nasceu na Vila do
Carmo, município de Cametá e ardoroso defensor da
cultura da minha região e de meu estado, o Pará.
Então sou adepto do paraensismo, sem nenhum tipo de
xenofobismo. Amo o Pará e procuro defender o que é
nosso e então nesse sentido, sou contra o
separatismo, embora adepto do pluralismo cultural,
do compartilhar, da interlocução, da diversidade.
Logo, sou consciente das defesas que faço a respeito
do Pará. Para mim, existe e vai continuar existindo
a Literatura Paraense. Adoto o termo porque é uma
forma de chamar a atenção do público aos escritores
de nosso terra, pois estamos distantes do eixo
sul/sudeste que destaca, através de um cânone
preconceituoso, de um lóbi de editoras, apenas quem
quer. Existe sim, preconceito lá que começa aqui por
quem tem vergonha de falar do que é seu e até de
dizer que é do Pará. Somos e muito discriminados e
há tanto preconceito porque somos caboclos parauaras
do Norte. É uma luta constante que travamos contra
tudo e contra todos que querem nos ver pelas costas,
sem nos dar chance de mostrar o que produzimos, o
que somos.
Percebo que a situação é a mesma no Rio Grande do
Sul. Leio matéria publicada na revista
“Entrelivros”, deste mês de novembro, que tem por
título – Literatura Brasileira – a ficção do sul
profundo, em que Marcelo Backes, no lead, comenta:
“conheça 11 escritores gaúchos, pouco conhecidos
além dos limites regionais, que merecem atravessar a
divisa do Mampituba”.
Marcelo informa que “nas universidades, há
disciplinas de literatura do Rio Grande do Sul [...]
E sempre fomos gaúchos acima de tudo [...]. Estamos
começando a nos mostrar solidários. Se a lenda dizia
que um cesto de caranguejos baianos tinha de ser
trancado rigorosamente porque uns ajudam os outros a
subir, deixando-o vazio em poucos segundos, enquanto
o cesto artístico de caranguejos gaúchos podia ser
deixado aberto, porque assim que um subia o outro se
encarregava de puxá-lo pra baixo, agora não é mais
assim. Estamos começando a nos unir!”.
E aí então o autor do texto começa a apresentar os
11 escritores e comenta que “alguns dos melhores
autores continuam nas beiradas, ou às margens
editoriais, midiáticas e geográficas”. E encerra
comentando que “muitas vezes é na franja que um
tecido se apresenta mais encorpado e complexo, e
nós, o leitor, certamente não queimaremos a boca se
comermos pelas beiradas o mingau da façanhuda
literatura gaúcha”.
Devíamos seguir o exemplo, nos unir e quem sabe,
começar cavando ao menos uma matéria similar a essa
que aqui citei. A lenda do cesto de caranguejo é
muito conhecida no meio artístico paraense. Aqui,
fez sucesso, o outro se morde, acha ruim e procura
destroçar o outro, puxa mesmo para o fundo da lata
ou do cofo. Nem solidariedade intelectual temos, com
exceções, claro, é só lembrar de José Veríssimo,
José Eustachio de Azevedo e do que reclamava
Dalcídio Jurandir.
É a união que faz a força. Os gaúchos nomeiam sua
feira de livro de: Feira do Livro de Porto Alegre,
como fizeram recentemente Manaus e São Luis e já
fazem Frankfurt, Nairóbi, Paris, Bogotá, Curitiba,
Parati, Bahia, Pernambuco e outros, todos, se
ufanando do que é seu . Então, nomeemos assim a
nossa: Feira do Livro do Pará.
Por que será que para os adeptos do bushismo, é
proibido, indevido, revela insensatez, mesquinhez,
provincianismo, falar da Literatura do Pará ou
Literatura Paraense? Livro, leitura e literatura são
direitos também dos pobres e não apenas da elite,
dos ricos, dos mandarins, dos donos do cânone
literário, dos que se acham no direito de dizer o
que serve, o que presta. Devemos deixar ao povo essa
escolha democrática. A discriminação não é um
caminho de transformação social. O escritor do Pará,
o artista paraense, tem talento, produção e merece
nosso estudo, nosso respeito, nossa estima e nossa
divulgação.
Viva a Literatura do Pará!
* Salomão Laredo é escritor e
jornalista. Site:
http://www.salomao.laredo.nom.br/
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